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Medo de motorista fez torcida do Botafogo cruzar fronteira com Uruguai a pé

Do UOL, no Rio de Janeiro

08/11/2024 05h30

Classificação e Jogos

Imagine viajar de ônibus por dois dias rumo ao Uruguai, passar 44 horas dentro do veículo e, ao chegar na fronteira, o motorista avisa que não irá atravessá-la por medo de violência da torcida do Peñarol? Esse foi apenas um dos muitos perrengues enfrentados pela torcida organizada "Fogoró", que impulsionada pelo sonho de ver o Botafogo classificado pela primeira vez à final da Libertadores, não pensou duas vezes em atravessar para o país vizinho a pé.

Ônibus ficou no Chuí

Momento em que Fogoró chega à rodoviária de Chuy para seguir percurso até Montevidéu Imagem: Arquivo pessoal

O motorista temeu pelo pior em função do clima extremamente tenso criado para o jogo da volta entre Botafogo e Peñarol. Na ida, a praia do Recreio (RJ) virou uma praça de guerra que culminou em 21 uruguaios presos e um ônibus incendiado.

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Ficou estabelecido, em comum acordo, que o desembarque aconteceria na cidade de Chuí (RS), no extremo sul do Brasil, apesar da desconfiança do piloto de que isto não seria bem aceito pelos torcedores quando chegassem ao local.

O responsável da empresa estava muito preocupado com os episódios de violência. E aí, no domingo, ele resolveu avisar que não iria atravessar o ônibus para o Uruguai. Falei, então, que ficaríamos no Chuí. E aí ele achou que a gente não ia manter isso. Só que na segunda-feira (dia da saída) não sabíamos nem se ia ter jogo, nem se ia ter torcida visitante. Mas enfim, mantivemos a nossa palavra. Falei para ele: 'pode ficar tranquilo que a gente só vai até o Chuí'
Rodrigo Mancha, presidente da Fogoró

A notícia de que a torcida visitante havia sido liberada só saiu quando a Fogoró já estava no Rio Grande do Sul. Além da permissão aos alvinegros, o jogo mudou do estádio Campeón del Siglo para o Centenário.

A certeza de que poderiam assistir à partida in loco motivou os botafoguenses. Porém, o que ainda não estava certo era como eles até a fronteira e, de lá, para a cidade do jogo.

Não conseguíamos outra empresa para alugar do Chuí até Montevidéu (URU). Além disso, você não pode atravessar a fronteira de ônibus sem uma autorização. E aí passamos por todos os perrengues do mundo. A distância eram dois quilômetros. Então tivemos que ir até à alfândega, por dois quilômetros, a pé
Rodrigo Mancha, presidente da Fogoró

Sequência foi com ônibus comum e carona da polícia

Torcedor do Peñarol dentro de ônibus comum que Fogoró precisou pegar para seguir viagem Imagem: Arquivo pessoal

Após caminhar por 2km, os alvinegros finalmente chegaram na alfândega e tiveram seus passaportes carimbados. Na sequência, partiram para a rodoviária de Chuy — cidade do lado uruguaio da fronteira — em busca de ônibus comuns.

Como estavam em 68 pessoas, não havia como colocar todas num coletivo só. Entre homens e mulheres, todos foram divididos em quatro linhas diferentes.

No caminho alguns torcedores do Peñarol embarcaram, aumentando a tensão. Os integrantes da Fogoró perceberam que eles tiravam fotos discretamente e mexiam no celular. Porém, apesar da preocupação, nada ocorreu.

Em seguida, foi a vez de correr contra o tempo. Da rodoviária uruguaia até o estádio Centenário eram mais cinco horas de viagem. Naquele momento, o relógio marcava 12h45 e o jogo era às 21h30 no horário local.

Foi então que o inesperado aconteceu. A polícia uruguaia os recebeu na rodoviária de Montevidéu e lhes deu carona até o estádio.

"Por incrível que pareça, o ponto positivo disso tudo foi a polícia. A polícia de lá tratou a gente super bem, o esquema de segurança funcionou, nos recebeu na rodoviária, botou a gente dentro do ônibus da polícia e nos levou até o estádio", detalha Rodrigo Mancha.

O Botafogo perdeu por 3 a 1, mas se classificou e garantiu vaga inédita na final. Porém, como nem tudo são flores, faltava resolver as cinco horas de retorno até o Chuí.

A polícia, inicialmente, sugeriu uma propina de alto valor. No entanto, para surpresa de todos novamente, as autoridades resolveram levá-los de volta "no amor".

Nos cobraram US$ 5 mil (cerca de R$ 28 mil) para nos levar de volta ao Chuí. E aí o chefe da segurança do estádio me procurou e falou assim: 'a polícia vai levar vocês de volta para o Chuí'. Achei maravilhoso, né? Teríamos segurança, economizaríamos dinheiro... Graças a Deus passamos para a final e, no final do jogo, eles cumpriram com o que prometeram, nos levaram por cinco horas de ônibus até o Chuí. Foi desconfortável porque só tinha um ônibus, mas a galera foi revezando até chegar ao Chuí
Rodrigo Mancha, presidente da Fogoró

Ônibus que ficou no Chuí foi apedrejado

Para-brisa de ônibus da Fogoró foi apedrejado por torcedores do Peñarol na fronteira Imagem: Arquivo pessoal

Mas e o motorista que ficou no Chuí com medo? Pois bem, ele bem que tentou fazer com que o ônibus saísse ileso, mas não foi possível. Torcedores do Peñarol descobriram que o veículo havia sido alugado por botafoguenses e conseguiram apedrejar o para-brisas. O vandalismo fez com que os alvinegros levassem mais algumas horas para retornar ao Rio de Janeiro.

Nosso ônibus era super confortável, e aí quando deu aquela sensação de alívio por cruzar a fronteira para o Brasil, vimos que o ônibus estava apedrejado quando ele veio nos buscar na rodoviária. Ele foi apedrejado estacionado no Chuí. Então tivemos que pegar esse ônibus apedrejado e ir numa empresa parceira no Rio Grande do Sul para trocar o para-brisa. Depois, finalmente, conseguimos ir embora para o Rio de Janeiro. Chegamos aqui às 23h de sexta-feira depois de sairmos na segunda-feira por volta de meia-noite. Foram 95 horas, mas valeu a pena. Para Argentina vamos de novo e é mais longe. Pelo Botafogo vale tudo! Pela glória eterna!
Rodrigo Mancha, presidente da Fogoró

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