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Chefe saudita da Copa-34 admite problemas: 'Detectamos antes de todo mundo'

Ibrahim AlKassim, secretário-geral da candidatura da Arábia Saudita para a Copa de 2034 Imagem: Yasser Bakhsh/FIFA via Getty Images

Bruno Doro

Do UOL, em Jeddah (Arábia Saudita)*

11/12/2024 05h30

Sabemos que, como um país, temos problemas. A diferença é que admitimos nossos problemas muito antes do que os outros e começamos a consertar essas coisas antes que qualquer outra pessoa de fora da Arábia Saudita as apontasse novamente. Por quê? Porque estamos mudando para nós mesmos, não para agradar a ninguém.
Ibhahim AlKassin, secretário-geral da candidatura da Arábia Saudita para a Copa do Mundo de 2034

Nesta quarta-feira (11), a Fifa deve anunciar que o Mundial vai voltar para o Oriente Médio. A avaliação da candidatura única da Arábia Saudita para o torneio recebeu a maior nota da história desde que a avaliação foi instaurada. Mesmo assim, espera uma avalanche de críticas.

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Desde que os sauditas surgiram como favoritos para realizar o torneio, foram criticados, entre outros, por:

  • Sistema de trabalho Kafala, de convites para operários que pode gerar situações de trabalho análogo à escravidão;
  • Falta de liberdade de expressão e de imprensa, com repressão governamental a vozes contrárias ao sistema;
  • Discriminação à população LGBTQIA+, que não é aceita em países muçulmanos;
  • Falta de liberdade para as mulheres, que até pouco tempo não podiam dirigir ou trabalhar sem autorização de um parente homem;
  • Possibilidade de despejos forçados durante as obras de estádios e infraestrutura prometidas para o torneio.

Em entrevista ao UOL, o responsável pela candidatura admitiu os problemas. Sem citá-los um a um, explicou que o país vive uma mudança drástica, iniciada em 2016, e que o Mundial seria uma oportunidade grande de mostrar a evolução do país.

"Nos últimos cinco anos, a Arábia Saudita recebeu mais de 100 eventos esportivos internacionais. Até a Copa, serão centenas mais. Queremos educar o mundo sobre a nova Arábia Saudita que está nascendo. Não queremos esperar até 2034 para que as pessoas venham e vejam a realidade por si mesmas", explica AlKassin.

No início de dezembro, o UOL esteve na cidade de Jeddah a convite da Liga Profissional Saudita de futebol. A reportagem viu um país com questões a evoluir, mas um povo muito mais aberto e apaixonado por futebol do que você pode esperar em um local que, até 2019, era fechado para a maioria dos turistas.

Roberto Firmino, uma das estrelas que está jogando na Arábia Saudita Imagem: Yasser Bakhsh/Getty Images

Por que realizar uma Copa do Mundo?

A resposta não é simples e, envolve, sim, demonstração de poder e conceito europeu de "sportswashing", em que eventos esportivos são usados para reverter a má reputação de outras áreas. Isso, porém, é a visão ocidental do assunto. Dentro da Arábia, o Mundial é a confirmação esportiva de que o plano de revolução lançado pelo governo em 2016, a Visão 2030, deu certo.

Os sauditas perceberam que não seria sustentável a longo prazo seguir isolados do mundo e dependentes da economia do petróleo. A solução é usar o dinheiro atual para criar alternativas econômicas de sobrevivência. Por isso, milhões e milhões de dólares jorram das contas governamentais para a criação de polos comerciais e tecnológicos, no intuito de inserir a Arábia Saudita no mercado da nova economia.

Ao mesmo tempo, também há um investimento maciço em turismo. O país conta com sítios arqueológicos que fazem parte do patrimônio cultural mundial da Unesco, um litoral exuberante, montanhas nas quais é possível esquiar (onde estão em construção resorts de inverno), além das paisagens desérticas. O esporte entra nessa área.

"Eu uso como exemplo a Copa do Mundo de 2010, na África do Sul. A visão que todo o mundo tinha era de que era um país perigoso e segregado. Eu achava isso. Hoje, já fui como turista quatro vezes para lá. Porque vi a Copa e me convenci que era um destino interessante. O mesmo vai acontecer com a Arábia Saudita", diz AlKassin.

Vista dos arranha-céus no centro de Riad, capital da Arábia Saudita Imagem: Igor Gielow/Folhapress

O país vai aceitar os ocidentais?

"Nós temos experiência com turismo. Mesmo sabendo que o primeiro visto de turismo (para não-peregrinos) foi dado apenas em 2019, recebemos anualmente milhões de pessoas para a peregrinação Hajj (que atrai mais de 100 milhões de pessoas anualmente para as cidades sagradas de Medina e Meca). Agora, estamos fazendo o mesmo para eventos diferentes e o esporte é um deles. Nos últimos cinco anos, recebemos mais de 3 milhões de pessoas para esse tipo de turismo. E todos que vêm conseguem perceber a diferença", explica AlKassin.

Copa prevê 15 estádios. Não é muito?

"Somos um país de 35 milhões, 65% deles jovens, que ama o futebol. É muito parecido com o Brasil. Então, temos público para encher os 15 estádios. Hoje, é verdade, temos uma diferença entre a demanda de ingressos e a paixão da população. O plano é aproveitar o impulso que novos estádios causam para que as ocupações aumentem. Mas somos um povo apaixonado por futebol e esses estádios seriam construídos de qualquer maneira, com Copa do Mundo ou não. Eles fazem parte da Visão 2030".

Na última temporada do Campeonato Saudita, apenas três dos 18 clubes ocupavam mais do que 50% dos estádios em que jogavam e apenas dois deles, o Al Ittihad e o Al Ahli, colocaram mais de 15 mil torcedores na arquibancada em cada partida. Em comum, os dois jogam no King Abdullah Sports City, estádio moderno da cidade de Jeddah.

Cristiano Ronaldo no Al Nassr. No Campeonato Saudita, jogos e treinos são sempre à noite, por causa do calor Imagem: Divulgação/X/Al Nassr

Copa terá de ser disputada no fim do ano?

"Estamos abertos para realizar a Copa do Mundo em qualquer período do ano. Se for no verão, teremos soluções. Se for no inverno, também temos soluções. Estamos abertos a discutir o que for melhor para o torneio", avisa AlKassin.

No verão, a temperatura média nos horários tradicionais de partidas da Copa (12h, 14h, 18h, 20h e 22h) fica acima dos 30°C em quatro das cinco cidades-sedes propostas. Em Riad, capital do país e onde ficarão oito dos 15 estádios que serão usados no torneio, o calor iguala ou supera os 40°C nos jogos das 12h, 14h e 18h. E diminuiu apenas para 35°C nos jogos das 20h e das 22h.

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