Caso VaideBet: Rozallah aponta superpoderes de Marcelo Mariano, responsabilidade de Yun e contradição

Ex-diretor financeiro do Corinthians, Rozallah Santoro foi ouvido pela Polícia Civil na última quinta-feira. A Gazeta Esportiva teve acesso ao depoimento colhido pelo Delegado Tiago Fernando Correia, responsável por casos de lavagem de dinheiro e líder da investigação sobre o caso VaideBet.

Na oitiva, Rozallah apontou superpoderes concedidos por Augusto Melo, presidente do clube, a Marcelo Mariano, ainda diretor administrativo. Além disso, o declarante afirmou que Yun Ki Lee, diretor jurídico do Timão na ocasião, foi o responsável pela checagem do contrato com a empresa do ramo de apostas online.

Os esclarecimentos de Rozallah Santoro, registrados em texto indireto, renderam quatro laudas.

INGERÊNCIA

Inicialmente, Rozallah explicou às autoridades o motivo de sua saída da gestão. Segundo ele, "havia muita ingerência no setor" e o primeiro pedido de renúncia ocorreu porque "Augusto disse, em um podcast, que Marcelo Mariano, de fato, comparecia ao setor para 'evitar erros, falhas' e que ele (Augusto) 'autorizava 30, 40 pagamentos por dia'".

Após receber a promessa do presidente do clube de que, enfim, teria autonomia para tocar o departamento financeiro, com "zero ingerência", Rozallah aceitou ficar. Entretanto, uma semana depois, aconteceu a "gota d'água".

Rozallah Santoro explicou que houve um pedido de concessão de acesso ao sistema de gestão dos licenciados a Luiz Ricardo Alves, conhecido como Seedorf. Rozallah foi contra a permissão, mas Marcelo Mariano aprovou e, imediatamente, o diretor financeiro disse ter entregado o cargo, definitivamente.

Não demorou e Seedorf foi nomeado gerente financeiro do Corinthians, cargo que ocupa até os dias atuais.

Em meio aos conflitos com Marcelo Mariano, Rozallah disse à Polícia que chegou a ouvir do desafeto que o presidente Augusto Melo havia determinado que ele interferisse e que, por isso, agiria assim. Ainda segundo Rozallah, esse problema ficou acentuado no começo de março, quando era necessário pagar a parcela do acordo com Matías Rojas e a multa de Antônio Oliveira no Cuiabá, sem que houvesse dinheiro suficiente em caixa para ambas as contas.

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Sobre a prioridade de pagamentos do setor financeiro, Rozallah explicou que esta foi definida da seguinte maneira: acordos judiciais; impostos parcelados; folha de pagamento dos funcionários (incluía jogadores da base); planos de saúde; vale alimentação; folha de pagamento dos prestadores de serviço; folha do elenco profissional e direito de imagem.

Segundo o depoente, tudo era passado para Augusto Melo por e-mail e o presidente pedia que Marcelo Mariano sempre fosse copiado.

PAGAMENTO AO INTERMEDIÁRIO

Rozallah Santoro confirmou à Polícia a versão de que os pagamentos feitos à Rede Social Media LTDA, nomeada como intermediadora da parceria do clube com a VaideBet, foram feitos por imposição de Marcelo Mariano.

Rozallah disse que ele, mesmo como diretor financeiro, "não tinha acesso a conta do clube, nem senha, muito menos o token, pois acreditava que isso seria uma boa prática". Segundo Rozallah, "quem executava os pagamentos no dia a dia eram Roberto Gavioli (gerente financeiro) e as pessoas que trabalhavam com ele, ligadas ao setor de contabilidade e a tesouraria".

Sobre os pagamentos das notas da empresa de Alex Fernando André, o Alex Cassundé, proprietário da Rede Social, Rozallah disse que estava no Uruguai quando foi chamado por Roberto Gavioli. O gerente, segundo Rozallah, explicou que "Marcelo Mariano desceu quatro vezes, solicitando o pagamento e que ele (Gavioli) não teve outra alternativa. Marcelo teria justificado que o fornecedor havia emitido as notas, tinha de recolher os impostos". E prosseguiu. "Marcelo pediu, exclusivamente, para que fossem pagas as notas emitidas pela Rede Social, nenhuma outra".

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Neste momento do depoimento, Rozallah Santoro reiterou que Marcelo Mariano sempre interferia sob a justificativa de que tinha respaldo do presidente Augusto Melo, e lamentou o fato de que o mandatário "não participava do dia a dia da gestão financeira", o que, segundo Rozallah, "fazia muita falta".

Rozallah Santoro também afirmou que era comum serem feitas solicitações de antecipação de valores junto a VaideBet e que, nestes casos, quem se comunicava com a empresa era sempre Marcelo Mariano. Segundo Rozallah, "apenas ele mantinha o contato".

CONTRATO VAIDEBET

Durante os esclarecimentos prestados, Rozallah Santoro afirmou que soube do contrato com a VaideBet apenas na véspera do anúncio oficial e salientou que não foi envolvido em nenhuma conversa, participação ou consulta.

Questionado pelos policiais sobre o procedimento de averiguação do parceiro e do contrato, Rozallah Santoro apontou responsabilidades para Yun Ki Lee e Fernando Perino, diretor e diretor adjunto, respectivamente, do departamento jurídico do Corinthians na ocasião.

Segundo Rozallah, foi dito a ele, dentro do departamento jurídico, de que "os escritórios de Yun e Perino haviam feito a checagem".

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Rozallah também afirmou que "não havia nenhuma empresa formalmente contratada pelo Corinthians para a realização do compliance". O diretor financeiro afirmou que "haviam alguns sistemas de consulta de dados, que funcionários do clube podiam operar, inclusive, o sistema de uma empresa contratada, chamada Neoway".

Apesar da declaração de Rozallah Santoro, a Gazeta Esportiva informou no dia 17 de janeiro deste ano, inclusive com manifestação e reconhecimento oficial do clube, de que o sistema de compliance implantado no Corinthians no segundo semestre de 2021 não foi utilizado para averiguação do contrato com a VaideBet apenas por opção da gestão Augusto Melo, pois a plataforma estava disponível e com contrato vigente.

DÍVIDA COM A PIXBET

A Polícia Civil também perguntou a Rozallah Santoro sobre a quebra do vínculo com a PixBet, uma obrigatoriedade assumida pelo Corinthians para que a VaideBet pudesse entrar no uniforme do clube.

Segundo Rozallah, "havia uma multa de R$ 20 milhões e a devolução de um adiantamento (outros R$ 20 milhões)". O então diretor financeiro completou dizendo que "R$ 10 milhões foram pagos pela VaideBet e outros R$ 30 milhões, após o bloqueio das contas do clube, conseguiram fechar um parcelamento".

A Gazeta Esportiva informou, sob posse do contrato do clube com a PixBet, de que, na verdade, os R$ 20 milhões além da multa rescisória significavam a devolução de "luvas" que foram pagas pela empresa, e, portanto, não se trata de um "adiantamento feito pelo clube".

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A reportagem também teve acesso ao documento do acordo feito pelo Corinthians com a PixBet, e o pagamento, nele registrado, diverge do que disse Rozallah Santoro à Polícia.

Após notificação judicial e bloqueio das contas, o Corinthians aceitou pagar a empresa com uma entrada de R$ 6 milhões em 15 de fevereiro, e 11 parcelas iguais de R$ 3,1 milhões.

A dívida total é de R$ 44,1 milhões porque o clube não chegou a um acordo com a PixBet antes de tomar a decisão pela rescisão unilateral. Desta maneira, com o caso levado à Justiça, houve a determinação do juiz para o clube também pagar R$ 4 milhões ao escritório de advocacia que representou a PixBet a título de honorários.

SITUAÇÃO DE MOMENTO

A Polícia Civil, com apoio do Gaeco, segue convocando pessoas envolvidas no caso para apurar todos os fatos. Yun Ki Lee, por exemplo, foi ouvido nesta quarta-feira. Por ora, nenhuma medida foi tomada pelas autoridades. Mesmo assim, a VaideBet optou por rescindir o contrato com o Corinthians no dia 7 de junho.

O clube corre o risco de ter de arcar com a multa de 10% do valor a ser cumprido do contrato, equivalente a R$ 30,4 milhões. Isso porque há uma cláusula no vínculo assinado em janeiro que determina este pagamento pela "parte que der causa à rescisão".

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O Corinthians, por sua vez, entende que não responde por terceiros e contesta a ruptura, cobrando da VaideBet uma suposta dívida avaliada em R$ 6,3 milhões, referente a um saldo contratual. O Timão também não descarta cobrar da empresa de apostas o mesmo valor da multa rescisória, sob alegação de que a "cláusula anticorrupção", prevista no contrato e citada pela VaideBet, só tem validade após a conclusão de um eventual processo judicial, e não somente devido a investigações.

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