100 anos no Parque Antártica: O estádio mais moderno dos anos 30
"O aspecto atual do estádio já é impressionante. Na entrada, o espectador notará numerosas bilheterias, 32 ao todo, para um serviço mais rápido e cômodo e, bem assim, quatro grandes portões de acesso."
Poderia até ser uma descrição do Allianz Parque, mas o texto acima é de 1933. O relato do jornal "Folha da Manhã" de 9 de agosto daquele ano mostrava a grandiosidade do estádio que seria inaugurado quatro dias depois, o Stadium Palestra Itália, o primeiro da capital paulista a ter arquibancadas de concreto armado. Proprietário do Parque Antarctica desde 1920, o Palestra Itália já alimentava a vontade de ter um campo moderno desde quando comprou a área da Companhia Antarctica Paulista. Neste segundo episódio da série "100 anos no Parque dos Sonhos", você fica sabendo como o parque virou um caldeirão. Na próxima sexta-feira, 21 de abril, completam-se 100 anos do primeiro jogo do clube no terreno de sua casa amada.
UM CLUBE QUE NÃO PARA DE PENSAR GRANDE
A compra do Parque Antarctica deu início a uma série de planos que o Palestra Itália tinha para o local. O pesquisador alviverde José Ezequiel de Oliveira Filho, que escreveu o livro "Parque dos Sonhos", conta que o clube foi pioneiro em reservar uma área para a imprensa, isso quando estádio ainda era modesto:
"A partir da aquisição do Parque, o Palestra começou a viver uma vida cheia de projetos para o local, que na época tinha só uma arquibancada de madeira. Em 1922, o Palestra foi o primeiro clube a criar um setor para a imprensa. Era um banco-carteira, como de escola, para facilitar as anotações dos jogos. Antes, os jornalistas ficavam no meio do público nos estádios", disse José Ezequiel.
O clube também queria dar mais conforto para a torcida e aumentar o estádio. O desejo virou obsessão e, em 1923, e a diretoria do Palestra organizou um concurso para o desenho do novo estádio que viria. Cinco concorrentes participaram e o arquiteto italiano Ettore Battisti levou a melhor, com projeto que misturava uma fachada de ornamentações evocativas ao universo cultural espanhol e arquibancadas com formato semelhante a do Circo Máximo, arena de jogos dos tempos do Império Romano. Este projeto não saiu do papel, por falta de condições financeiras, mas a semente do novo estádio estava lançada.
As dificuldades nos cofres eram grandes. Foi aí que, assim como no episódio da compra do Parque Antarctica, os palestrinos passaram a vender carnês entre si, com o objetivo de conseguir fundos para a construção do novo estádio. Na força de sua torcida, o Palestra obteve condições para caminhar com o sonho. Em 4 de setembro de 1928, em uma assembleia no clube, levantou-se a possibilidade de o clube construir seu novo estádio no terreno onde hoje fica o Pacaembu ou em um terreno às margens do Rio Tietê. As duas ideias foram prontamente negadas por conselheiros. O Palestra Itália deveria seguir crescendo na terra que lutou para conseguir, e assim foi.
No dia 10 de março de 1929, foi lançada a pedra fundamental do novo estádio. Em 1933, a sede social do Palestra foi transferida do 16º andar do Edifício Martinelli para o Parque Antarctica. E finalmente, em 13 de agosto de 1933, o clube inaugurou o imponente Stadium Palestra Itália, com capacidade para 30 mil pessoas. O primeiro estádio da capital paulista a usar concreto armado tinha arquibancadas deste tipo nos dois lados do campo. Atrás dos gols, foram colocadas arquibancadas de madeira. Em campo, o Verdão goleou o Bangu por 6 a 0, em jogo pelo Torneio Rio-São Paulo. Vale destacar que o Palestra seria campeão deste Rio-São Paulo, que foi a primeira edição da história do torneio.
"O estádio de 1933 é, para a época, aquilo que a nova arena significa hoje para o Palmeiras em termos de vanguarda e transformação", disse José Ezequiel.
OS DETALHES DO ESTÁDIO
Segundo relatos da época, o Stadium Palestra Itália era o estádio mais moderno do Brasil nos anos 30. Justifica-se: A arquibancada social de cimento armado, coberta, foi feita em duas partes. A metade do lado esquerdo ficou pronta em 33 e o lado direito foi entregue em 36, substituindo uma arquibancada de madeira (veja como era o estádio em 1936 na ilustração no início da nota). Sob a metade entregue em 33, foram colocadas diversas acomodações, como um grande bar para o público, vestiários de equipes visitantes, de árbitros e dos atletas palestrinos. Tudo isso era novidade na cidade de São Paulo.
PALESTRA ITÁLIA 8 X 0 CORINTHIANS
O primeiro ano do Stadium Palestra Itália vivenciou um dos grandes capítulos do Palmeiras. No dia 5 de novembro de 1933, em duelo pelo Torneio Rio-São Paulo, o Palestra atropelou o Corinthians por 8 a 0, naquela que é a maior goleada do Dérbi e a pior goleada já sofrida pelo Corinthians em toda sua história. Romeu Pellicciari fez quatro gols. Imparato, que era conhecido como o "Trem Blindado", marcou três. Gabardo também balançou a rede.
O primeiro tempo acabou 3 a 0. No segundo, o Palestra deu um baile e fez mais cinco. Esse jogo gerou uma revolta nunca vista antes na torcida do Corinthians. Cerca de 500 sócios foram à sede do clube exigir a demissão de toda diretoria. Vândalos depredaram o local e o presidente Alfredo Schurig se demitiu.
O estádio foi símbolo de uma década gloriosa para o Alviverde. No embalo do novo campo, o clube ganhou o Campeonato Paulista em 1933, 1934 e 1936. Em 1940, o campo acabou perdendo o posto de mais moderno da cidade para o Pacaembu, inaugurado naquele ano. Inclusive, o Verdão passou a jogar muito como mandante no Pacaembu nos anos seguintes. Este período, inclusive, coincidiu com tempos complicados para o Palestra, que por sua ligação com a Itália, sofreu com os reflexos da Segunda Guerra Mundial (1939-1945).
Durante a guerra, em 1942, o governo Getúlio Vargas instituiu decreto que proibia a qualquer entidade o uso de nomes relacionados aos países do Eixo (Alemanha, Itália e Japão). O clube sofreu pressões pressões políticas e, sob pena de perder seu patrimônio, teve que mudar de nome: e assim surgiu o nome Palmeiras. Porém, neste cenário, era impossível investir mais no estádio.
"Antes do Pacaembu, o Palestra Itália era o grande estádio. Ele recebia jogos de diversos times, que pagavam ao Palestra para jogar nele. Hoje, é difícil mensurar como foram os pagamentos, se com dinheiro ou alguma troca. Mas com certeza, de alguma forma o Palmeiras recebia por alugar seu estádio. Depois, com o Pacaembu e a guerra, os investimentos no estádio ficaram de lado. Com as pressões a guerra, a gente perdeu quase todo nosso patrimônio", frisou José Ezequiel.
A HORA DE UMA NOVA TRANSFORMAÇÃO
Apenas mudanças pontuais foram feitas no Parque Antarctica até o fim dos anos 50. A iluminação do campo foi posta em 1937. No ano de 1949 foram colocados alambrados, que vieram de uma doação de um conselheiro. Em 1951, o Palmeiras construiu sua piscina olímpica atrás do gol da Avenida Antarctica e precisou tirar a arquibancada de madeira que ficava ali.
Em 11 de setembro de 1958, o local passou a assumir oficialmente a denominação de Estádio Palestra Itália, deixando o Stadium no passado. O fato aconteceu em cerimônia com o presidente da Itália, Giovanni Gronchi.
Também em 1958, o Palmeiras reacendeu o desejo de reformular sua casa. E ousou mais uma vez. Sob o comando do engenheiro Clovis Felipe Olga, surgiu o projeto de um estádio inovador, com capacidade para cerca de 70 mil pessoas. A construção teria dois andares, um deles acima de boa parte das arquibancadas inferiores.
Este projeto não saiu da maquete por completo, por limitações no orçamento, mas foi a base para as mudanças que viriam. Aí nasceu a arquibancada em forma de ferradura - que existe até hoje. Outro legado deste projeto foi o campo, que seria elevado cerca de três metros em comparação ao nível do solo, formando um fosso ao seu redor, evitando alagamentos, um problema crônico da região após fortes chuvas. A este campo, deu-se o nome de Jardim Suspenso. E a era do Jardim Suspenso reservou grandes emoções à torcida...
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