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Abel Braga anuncia aposentadoria como treinador: 'Não suportava mais'

Fluminense batizou campo 2 do CT com o nome de Abel Braga - Marcelo Gonçalves / Fluminense
Fluminense batizou campo 2 do CT com o nome de Abel Braga Imagem: Marcelo Gonçalves / Fluminense

28/06/2022 10h00

Depois de deixar o Fluminense em abril, Abel Braga decretou que não será mais chamado de treinador. Passados anos no cargo, comandando diversos times e acumulando títulos, o agora ex-técnico afirmou, em entrevista ao Lance!, que não suportaria mais a rotina na beira do gramado, garantindo, porém, que não vai se distanciar completamente do futebol.

"Logo depois do Estadual era muito jogo, já comecei a amadurecer isso. Chegou um momento que eu não suportava mais. Não estaria mais feliz na beira do campo. Então para mim deu. Agora já parei colocando na cabeça que vou trabalhar fora do campo. Vou fazer uma coordenação técnica, não quero ser executivo, diretor técnico, quero coordenador. Que é um negócio completamente diferente. Vamos ver o que dá", disse.

Abel Braga deixou o Fluminense em 28 de abril, quando pediu demissão para evitar atritos e ainda mais desgaste pessoal para ele. Na despedida, muitas lágrimas de jogadores e funcionários que mostram o ótimo ambiente construído internamente. O Tricolor chegou a ter 12 vitórias consecutivas, mas a eliminação na Libertadores e a complicada situação na Copa Sul-Americana pesaram contra, mesmo com o título do Campeonato Carioca.

"Eu comuniquei ao presidente em um dia, aquilo ficou fechado entre nós. Eu, por causa dos jogos, eu não queria que aquela coisa se prolongasse. Que não houvesse lamento. Eu saía feliz de um clube que eu tenho carinho, respeito e admiração enormes. Mas não queria que afetasse os jogadores. Sei que afetou um pouquinho. Os jogadores vieram com lágrimas me cumprimentar porque foi uma despedida no auditório. Deixei bem claro que foi decisão minha, o presidente também se emocionou, o Paulo Angioni também falou, foi de uma felicidade muito grande, o Marcão auxiliar, o Marcão Salgado. Naquele dia foi assim, mas depois eu falando com o pessoal da comissão, falei 'cara, puxa esses caras para a alegria no treino'. Por que era isso que eu queria, é isso que eu pretendo que continue. E está aí. O Diniz assumiu, o negócio está indo muito bem".

Pelo Fluminense, Abel Braga foi campeão carioca em 1971, 1973 e 1975. No primeiro e no último ano ele também ganhou a Taça Guanabara. Como treinador, venceu o Brasileirão de 2012, o Estadual em 2005, 2012 e 2022, além da Taça Guanabara em 2012 e 2022. Ele é também o segundo treinador com mais jogos na história do clube, 354 jogos, atrás apenas de Zezé Moreira, com 474. Em junho, recebeu uma homenagem ao ter o campo 2 do CT Carlos Castilho — batizado com seu nome

"Mas isso porque foram muitas e muitas emoções. Primeiro é gratidão. Foi o clube que me formou. Meu caráter, minha dignidade, meu caminho reto. Foi o Fluminense. O Fluminense me mostrou o caminho. Colegas de pelada de 15, 14 anos na Penha foram para outro lado. Morreram, foram presos, drogas, aquela coisa. Depois de virar treinador em 85, demorei 20 anos para ser treinador do Fluminense, acredita? Vinte anos. Quando cheguei falei 'caramba, joguei oito anos aqui e estou voltando depois de 20. Vocês nunca pensaram em mim um pouquinho antes?'. E brincava com o pessoal. Ganhei o Carioca. Depois disso, aquela virada já em 2011 de chegar como terceiro, classificado na fase de grupos da Libertadores. Depois, ganhar o Carioca, a Taça Guanabara, e ser campeão brasileiro. Isso tudo é emoção".

Formado no Fluminense, Abel só foi treinar o time pela primeira vez em 2005. Mesmo após a perda da Copa do Brasil daquele ano, o treinador foi mantido, saindo apenas em 2006 para o Internacional. Ele voltou ao clube em 2011 e fez uma campanha histórica rumo ao título brasileiro em 2012. No ano seguinte, acabou sendo demitido por uma sequência de resultados ruins. A terceira passagem foi em 2017. Em março, ele perdeu o filho caçula, João Pedro, mas mesmo assim permaneceu. O treinador saiu apenas em junho de 2018. Em 2022, retornou para ser campeão carioca.

"Já teve muita coisa feita aí. Jogadores lançados, principalmente em 2005. Aí 2017 depois fiquei até metade de 2018, pedi ao Abad para sair. Também muitos jogadores lançados e confirmados que estão hoje aí na Europa brilhando. Wendel, Richarlison, o lateral do Flamengo (Ayrton Lucas). Muita gente. Foi mais um processo. Mas não veio título, veio uma Taça Guanabara ou Taça Rio, ganhamos nos pênaltis do Flamengo no Engenhão, olha o Engenhão. Depois esse clube não ganhava, em 2012 estava desde 2005 sem ganhar, consegui ganhar. Depois de dez anos sem ganhar, consegui estar junto com eles na conquista. São emoções", disse.

"Nesse meio termo, 2017/18 eu perco um filho. O Abad, até agora não entendo como ele conseguiu. O Salão Nobre estava alugado, tinha uma festa ou recepção, não sei se era 15 anos ou casamento. Quando isso foi levantado entre eles, ele disse que não teria mais nada, que era para velar o corpo no clube. O futebol me deu essa coisa. Na quarta-feira eu estava dirigindo o clube em Recife. Depois tem aquele minuto de silêncio e isso vai ser também eternizado. Ninguém nunca ouviu aquilo, você não escutava um ronco, uma respiração naquele Maracanã daquele tamanho. Ganhei esse título, tudo isso que eu passei o Fluminense me botou no colo, essa é a verdade. E agora faz essa homenagem".

"Veja bem. É difícil segurar essa onda e eu respeito isso. Já falei várias vezes, a palavra mais bonita que tem no dicionário é gratidão. Tenho esse lado com o Fluminense de começar, seguir, acompanhar tudo aquilo que aprendi, levar para a vida o aprendizado. Tem essas emoções todas e profissionalmente, claro, joguei e fui treinador. No Inter como treinador foi onde eu conquistei o título máximo. Está ligado. Passei quatro vezes no Fluminense, joguei oito anos, parece que somado são 14 anos. No Inter foram sete passagens. É difícil porque lá quando se muda muito, normalmente é com treinador gaúcho, é engraçado. O pessoal sempre pensou que sou gaúcho, mas sou carioca. Para um carioca dirigir sete vezes um clube do Sul é motivo de orgulho. Me sinto orgulhoso por isso também".

O Tricolor, um dos clubes mais marcantes da história dele, será também o último time como treinador no Brasil. O veterano agora quer trabalhar como coordenador e recebeu um convite do Avaí no mesmo dia que saiu do Flu, mas preferiu ficar parado pelo menos até dezembro antes de embarcar no novo cargo. Ele voltaria a comandar uma equipe na beira do gramado apenas fora do país e chegou a receber um convite do Sion, da Suíça, ainda em 2021, antes da proposta para o retorno ao Flu.

"Eles sabiam também que era o meu último clube como treinador. Isso o presidente também já entrou sabendo. A não ser, porque sempre teve perto de acontecer, um convite para a Suíça. Fizemos um trabalho bom, um grupo americano comprou o clube, era um clube médio, o Lugano, mas veio uma sondagem de um grande clube da Suíça. Falei que naquele momento não iria, tinha acabado de sair de um e já ir para o outro. Foi na parada do ano, tudo bem, naquela parada de dezembro. Não aconteceu e acho que não vai acontecer mais. Mas no Brasil já estava definido, e o Mário sabia disso, que o Fluminense seria meu último clube como treinador. Já estava 70% na minha cabeça definido que seria esse ano ou naquele momento. Naquele momento foi importante eu ter consciência que não seria mais feliz na beira do campo. Então agora vou tentar é passar tudo isso que adquiri como experiência sendo intermediário entre comissão, jogadores, comissão, diretoria, jogadores, diretoria. Acho que posso lidar bem com essa parte", afirmou.

"Acho que não vem mais [convite para a Suíça]. Pela data, o campeonato está parado, mas começam os treinamentos agora em julho. Não surgiu até agora e não vai surgir mais. Então estou fora, vou ficar parado, tive convite para voltar aos Emirados [Árabes], mas falei que não queria. O clube que eu iria assumir na Suíça, antes eu morava na Suíça Italiana, esse é Suíça francesa. E eu amo falar francês. Tudo seria muito mais fácil. Eu já misturava o francês na Suíça italiana porque a maioria dos italianos fala francês pela proximidade de Milão, Marselha, Monaco. Falei que seria legal, mas não pintou. Praticamente está tudo definido. Já tive convite para isso que estou falando, ser um coordenador técnico. Foi do Avaí, o Barroca me ligou também, o vice-presidente que assumiu o clube tem quatro, cinco meses. Estão fazendo um trabalho excepcional. Mas falei "não, deixa eu curtir um pouco minha aposentadoria". Aqui no Brasil é o que vai acontecer, mas quero só a partir de dezembro. Estou viajando muito, adorando e leve", completou.

Adeus seria com Fred

Com o adeus iminente do atacante Fred, Abel revelou que seus planos eram de segurar a vontade para se aposentar junto ao centroavante.

"Mas essa agora, esse momento hoje, esse 2022 foi especial. É um Fred diferente de tudo, atencioso, uma percepção de resolver problemas muito grande. Eu não sei se falei para ele o que ia acontecer, o que eu queria, quando vi que o negócio estava assim, jogo demais. Eu queria ter suportado, eu não suportei mais mentalmente e fisicamente. Foi depois daquela viagem, a segunda para Barranquilla, chegar domingo de Páscoa, segunda treinar, Copa do Brasil, jogo de Brasileiro, Sul-Americana, é meio louco", afirmou.

"A minha ideia era parar com o Fred. Ia ser incrível. A despedida do Fred como jogador de futebol e eu como treinador. Ambos no Fluminense. Frederico, não deu. O velho aqui não suportou a pegada, a pancada foi grande. Estava o mental e o físico. Meu ciático já não estava suportando mais. Muito voo, tudo longo, Rio a Barranquilla, depois a Manaus para Cuiabá, Cuiabá para o Rio. Esperei mais um ou dois jogos, não sei. Presidente, não dá mais. Gostaria imensamente. Estou falando nessa homenagem que todo mundo está mandando ser solidário a você, falar um pouco de você, queria que soubesse disso. Seria muito legal parar junto. Mas vou estar nessa despedida com certeza", completou o treinador.

Além do presidente Mário Bittencourt, Abel foi outro a tentar convencer Fred de permanecer no Fluminense até dezembro para encerrar a carreira no final da temporada. O jogador, porém, manteve os planos e tem contrato apenas até o dia 21 de julho. A despedida será contra o Ceará, no dia 9, quando ele faz o último jogo na frente da torcida no Maracanã e também da vida. O duelo será às 19h e promete ser emocional e com presença de grandes atores dessa história.

"Quando ele um dia chegou para mim e falou 'Abel, não dá mais não, vou parar'. Falei calma, cara. No início o negócio estava correndo bem. Não estava nem correndo bem, estava com resultado. Jogando muito bem. Ele começou com um probleminha ou outro. Falei "vai ficar aqui até dezembro, termina seu ano". Aí chegou um momento em abril, por aí, ele falou que não dava mais. Falei 'vai dar um toque naquele moleque ali, caiu de produção para caramba'. Ele fazia esse meio-campo. Chegava para mim e falava 'falei duas vezes com aquele cara, ele não mudou nada, dá uma porrada nele'. Eu ia, chamava e metia o pau. Normalmente no grupo, não chamava separado, não. Eu já tinha o perfil deles todos, sabia o que podia gritar e o que não podia. Tem jogador que tu grita e ele sobe, tem uns que você grita e vai abaixo".

Na reta final da carreira, Fred sofreu com lesões e não conseguiu mais ser o protagonista em campo. Quem assumiu esse papel foi o contratado para ser o sucessor dele, o argentino Germán Cano. Mesmo assim, o camisa 9 se mantém como líder de vestiário e sai em defesa principalmente dos jovens da base, mas internamente ajuda a cobrar, orientar e no crescimento dos garotos.

"Mas eu falava para ele também essas paradas, 'vai resolver para mim aquilo ali, esquece esse negócio de parar, aguenta um pouco. Tu é o maior ídolo desse clube há muitos anos. Tem que levar isso, pensa no torcedor. Que tu não jogue, no banco tu briga com o juiz, com o bandeirinha, com o colega, continua igual, todo mundo sabe que você é assim'. Aí ele continuou. Depois veio o problema na vista. Agora ele já definiu que vai parar mesmo mês que vem", disse.

"Sabe qual o mais importante? É estar preparado. Eu tive uma sorte danada. Eu não parei, pararam comigo. Por que eu ia jogar mais um ano, estava no Botafogo, o vice-presidente me chamou para ser auxiliar do Jorge Vieira. Eu tinha na cabeça que ia parar no final do ano. Falei de parar agora, já começo em uma nova função. Para ele, já está se preparando para isso. Tanto que falou que não ia aumentar. O presidente Mário queria, falou que parou. É uma vida para resolver muita coisa", comentou.

"Ele está feliz. Sente-se perfeitamente quando conversar sobre isso. Meus olhos devem estar meio brilhando, vê que a minha fisionomia mudou. Estava sempre carregado, muito jogo. Ele está feliz. Administrou bem a carreira, a vida, tem uma família sensacional. Esposa, filho, filha. Isso que é o mais legal. Vai continuar até surgir um outro Fred. Ser um ídolo será eterno, mas ainda vai por muitos anos passar essa idolatria torcida, Fred. É difícil", concluiu.

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