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Campeã do mundo, Daiane dos Santos chega hoje ao Brasil

30/08/2003 00h00

Por Cristiano Cipriano Pombo e Léo Gerchmann
Agência Folha
Em São Paulo
Em Porto Alegre

"Ainda não sabemos quando será a festa aqui em casa. Teremos que ver como a Daiane estará, pois sabemos que agora ela é mais do mundo do que nossa, tem muitos compromissos e é quase como uma visita em casa."

A preocupação de Magda Garcia dos Santos, 42, no dia em que a filha Daiane, 20, chega ao país após ser alçada ao estrelato com a conquista do primeiro ouro da ginástica brasileira em Mundiais, mostra que a família da ginasta já começa a assimilar a súbita fama.

Diferentemente de 99, quando conquistou duas medalhas no Pan de Winnipeg, desfilou em caminhão dos bombeiros e foi recebida pelo governador, mas festejou em casa, Daiane poderá neste sábado nem desfrutar do pedido feito à sua mãe para comemorar: um tradicional churrasco gaúcho.

Segundo Magda, que é cozinheira e técnica de alimentação e deu o nome da princesa inglesa Diana à filha, Daiane terá uma maratona a cumprir e verá Porto Alegre como nunca antes.

"A Daiane não sabe o que a espera e também não tem noção da amplitude de sua conquista no Brasil", diz o pai da atleta, Moacir dos Santos, 40, que trabalha como monitor da Fundação da Proteção Especial, ex-Febem.

A maratona começará no aeroporto Salgado Filho, na capital gaúcha, por volta das 14h. Ela e Mosiah Rodrigues, único atleta da seleção masculina com vaga em Atenas-04, serão recebidos por cerca de 500 pessoas -serão 70 crianças do Grêmio Náutico União (clube dos atletas) vestidas com camisetas que estampam o rosto de Daiane e a inscrição "campeã mundial de solo".

Depois, a gaúcha ainda desfilará em carro dos bombeiros, participará de festa em uma das sedes do clube e visitará o governador Germano Rigotto, que a premiará em Esteio (a 17 km de Porto Alegre).

Até o reencontro com a família será diferenciado. Apesar de rever do mesmo jeito o seu quarto, recheado de sapos (de pelúcia, de porcelana e em calçados), Daiane não verá Deise, 21, a irmã mais velha, que se mudou para São Paulo com o marido. Poderá encontrar só pela segunda vez o sobrinho Cauã, que nasceu há apenas três meses, filho da irmã mais nova Cíntia, 18. Além deles, verá ainda a irmã caçula Djéssica, 10.

A passagem pela casa, porém, será breve. Daiane viaja domingo para participar de programas de televisão no Rio e em São Paulo.

A correria também deve impedir que ela volte ao ginásio onde deu seus primeiros passos na ginástica, no Centro Estadual de Treinamento Esportivo (Cete) do bairro Menino Deus. O espaço está abandonado, e até o brinquedo no qual a atleta foi descoberta pela professora Cleusa de Paula, enquanto brincava no parquinho, sofre com a falta de manutenção.

"É um descaso. Poderíamos descobrir outras ginastas, mas, só de ver o Cete, penso em me aposentar", diz Cleusa. Ela reclama que as promessas do governo de revitalizar o local e reformar o ginásio não são cumpridas.

Apesar de ter a chance de rever o Náutico (que remodelou o ginásio e adquiriu novos aparelhos de ginástica, o último por US$ 8.000) e reencontrar um de seus técnicos, Eliseu Burtet, 27, o Kiko, que a treina desde 96, Daiane não poderá amanhã nem receber a homenagem de seu primeiro patrocinador: uma pizzaria local que repassava à ginasta uma ajuda de custo de R$ 250. Hoje ela tem contrato com a Brasil Telecom e recebe, segundo a Confederação Brasileira de Ginástica, R$ 10 mil.

"Amanhã (sábado) será impossível homenageá-la. Durante a semana, entraremos em contato com ela e estudaremos como parabenizá-la", diz Ana Elise, gerente operacional da Companhia das Pizzas, que diz ter elevado o faturamento em 15% desde 99.

Tamanho assédio é tratado com "corujice" pelo pai, que ressalta ter recorrido até a empréstimos para bancar as viagens de Daiane e diz saber que apenas o clima pode abreviar as homenagens e levá-la para casa mais cedo -mas nem assim haveria churrasco. "O mundo apenas descobriu o que eu e a mãe dela já sabíamos."