Metaleiro vai do palco para o ringue e raspa até o cabelo pelo muay thai
Os cabelos compridos e a barba cheia já o fizeram ser apelidado de Jesus. Quem se aproxima de Luis Mariutti hoje e o vê de cabeça raspada pode não perceber que aquela figura é o baixista que fez fama nas décadas de 1990 e 2000 com as bandas Angra e Shaman, dois ícones do heavy metal brasileiro. A mudança de visual é relacionada a uma troca radical de carreira: o paulista migrou dos palcos para o esporte, correndo atrás da antiga paixão pelo muay thai. Hoje ganha a vida como técnico e também se arrisca como lutador, aos 42 anos.
Mariutti é um fã de lutas desde a adolescência, quando começou a praticar kung fu aos 12 anos e rendeu-se ao full contact, moda na TV na época, conquistando um título paulista aos 16 anos. Um ano depois, conheceu o muay thai, mas o talento como baixista acabou falando mais alto. Ele foi um dos fundadores do Angra, que desde o primeiro disco, Angels Cry (1993), estourou na cena do heavy metal, fez fama principalmente no Japão e se tornou a banda número 2 do Brasil, atrás apenas do Sepultura. Ele foi eleito um dos dez melhores baixistas do mundo e, a partir dali, o esporte virou hobby.
Mesmo ficando em segundo plano, seu lado lutador nunca sumiu. Tanto que mesmo quando ele se metia dentro de um ônibus e partia em longas turnês na Europa, fazia questão de levar seu material de treinos. Quando desembarcava numa cidade, deixava o hotel a pé à caça de academias e, quando achava uma, pedia para fazer um treino por lá. Em uma das excursões, ao lado da banda finlandesa Stratovarius, o motorista do ônibus do grupo acabou virando seu parceiro, por ser praticante de boxe.
Eram tempos diferentes, em que o fã de Bruce Lee percebia um grande preconceito. “Quando entrei, em 1988, era só louco que treinava, só malucos que queriam sair na mão. Era mais radical. Mas hoje foi se popularizando com o MMA e muita gente entra pelo fitness”, explica ele, que também é fã de futebol e ganhou o apelido de Jesus quando disputava o campeonato de músicos da MTV, o Rockgol.
Depois do Angra, Mariutti teve boa fase com o Shaman – que teve uma música na novela das 19h da Globo “O Beijo do Vampiro” – e em seguida fez parte da banda solo de Andre Matos, vocalista de seus grupos anteriores.O desejo de começar uma família com a também treinadora e lutadora Fernanda fez com que ele fosse perdendo o interesse em viajar para tocar com a banda. Ao mesmo tempo, Mariutti encontrou no muay thai um caminho novo a seguir.
O nascimento do filho Enzo, hoje com cinco anos, e o fato de sua mulher também ser lutadora, direcionaram a nova carreira. Ele também é pai de Lorena, de 1 ano e meio.
“Como as turnês estavam escassas, fui me dedicando mais às lutas. Foi uma coisa que foi acontecendo. Me empolguei, passei a treinar todo dia e vimos que precisávamos formar nosso time. Decidimos nos tornar professores e caminhamos um percurso de uns 5, ou 6 anos, buscando graduações para poder dar aula. Também voltei a fazer algumas lutas, apesar da minha idade, e estou querendo continuar”, conta o baixista, que recentemente conquistou um cinturão em torneio amador e tem como metas fazer mais alguns combates e, principalmente, formar novos talentos.
Cabelos e a relação muay thai/heavy metal
Hoje, Mariutti e Fernanda se dividem dando aulas em três academias. Os filhos acabam indo muitas vezes com eles e se divertem calçando luvas e brincando com os movimentos de lutas. A rotina é desgastante e acabou influenciando na decisão do baixista em raspar o cabelão que exibia no seu auge como baixista.
“Teve um pouco a ver, porque eu estava treinando muito, cinco ou seis horas por dia, e é muito difícil manter o cabelo comprido, lavar toda hora”, explicou ele, antes de adicionar, bem humorado. “E começou a cair também... Então acabei cortando! (risos)”.
O baixista sempre teve um estilo discreto e centrado, apesar de intenso, no palco. E ele leva um pouco do seu mundo de músico para os treinos. Conta que não gosta do estilo durão, que não combina com os treinos intensos, mas alegres, que os tailandeses pregam.
Mariutti ainda explica que hoje consegue usar muito do que aprendeu como músico na carreira de técnico e lutador. Principalmente por conta da disciplina.
“A disciplina de treinos tem de ser igual. Na minha época de maior dedicação aos treinos de baixo, era um trabalho muito grande antes de gravar discos. E aqui também. Só para esse campeonato amador que vencemos, treinamos quatro horas por dia”, afirma o paulista. “Tento usar o que aprendi na música. Para os dois você precisa de muita concentração, foco, prestar atenção nos detalhes. Ali em cima (do ringue), um segundo de distração e você pode cair.”
Mariutti não abandonou completamente o metal. Ele hoje tem a banda Motorguts, que lançou recentemente seu primeiro disco, “Seven”, e planeja seus próximos passos em relação a shows e novas composições.
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