Ator de "O Grande Dragão Branco" diz que teve medo de machucar Van Damme
Quando o lutador Paulo Tocha viu pela primeira vez o jovem Jean-Claude Van Damme, 85 kg de músculos distribuídos em 1,77 m de altura (Há quem diga que ele tem 1,62 m), ele pensou: “É mais forte do que eu, mas tem cara de bebê. Talvez nem consiga sair sozinho na rua sem ser assaltado.”
Tocha já era um lutador consagrado no Oriente quando foi convidado por produtores americanos a participar de um longa-metragem, cujo papel principal seria de Van Damme, um promissor ator belga.
Nascido em Moçambique, filho de pai português e mãe italiana, sobrevivente da guerra civil que assolou o país no anos 70, forjado nas brigas de gangue dos subúrbios da África do Sul, criado no boxe de rua onde violência frequentemente é mais importante que técnica, expoente do muay thai tailandês cujos lutadores têm canelas que cortam como navalhas, Paulo Tocha, o primeiro estrangeiro a vencer uma luta na China comunista, achou que Van Damme não aguentaria o tranco.
Mas Van Damme aguentou.
Da cena em que os dois sobem no tablado para trocar socos e chutes, Tocha saiu com um nariz fraturado, o abdômen inchado e a impressão de que Van Damme tinha aprendido a dar porrada.
“Naquela época a gente fazia as coisas para valer, para parecer real”, diz Tocha em português lusitano, de sua casa em Los Angeles, onde fixou residência após décadas chutando adversários na Ásia.
“Se você olhar para o meu corpo vai ver as marcas dos chutes dele, a cor da pele mudando, as reações físicas a um golpe violento.”
A cena da luta entre Frank Dux (Van Damme) e Paco (Tocha), um dos grandes momentos de “O Grande Dragão Branco”, você pode ver a seguir.
Antes da gravação começar, Tocha tinha receio de machucar a estrela do longa e prejudicar o resto das filmagens por causa de um acidente. A pedido da direção, a luta foi gravada em dois dias: no primeiro seriam filmados apenas os golpes de Tocha em Van Damme; no segundo, o contrário.
“Quando foi o meu dia de bater, eu peguei leve, com medo de machucá-lo. Mas na vez dele, você pode ver que ele não tirou o pé, bateu para valer, até que quebrou meu nariz. Pediu desculpas, ficou preocupado comigo, mas é normal, acidentes acontecem.”
“O Grande Dragão Branco” foi o primeiro filme sobre artes marciais a se tornar um grande sucesso mundial. Lançado em 1988, ele consumiu pouco mais de US$ 1 milhão para ser produzido e arrecadou quase US$ 12 milhões só nos Estados Unidos. Foi o filme que transformou Van Damme no brutamonte midiático que ele é até hoje.
Reprisado incontáveis vezes na televisão brasileira durante toda a década 1990, se tornou um clássico da Sessão da Tarde e é lembrado com carinho por saudosistas, a despeito de ter uma história pouco crível, diálogos quase toscos e atuações à altura.
O longa conta a história supostamente real de Frank Dux (Van Damme), um americano convidado a lutar em um torneio secreto em Hong Kong chamado Kumitê, no qual os duelos frequentemente terminam em morte.
Durante o Kumitê, Dux enfrenta lutadores de vários estilos, entre eles um especialista em muay thai. É aí que entra Paulo Tocha.
“Foi uma satisfação porque eu fiz parte da criação do Paco. O short que uso é real, traz o nome de meu ginásio em Bangkok, e as pessoas que conheciam o muay thai real vieram me cumprimentar, dizendo que minha caracterização foi bem real”, diz Tocha.
Foi a primeira vez que o Ocidente viu essa modalidade de luta, na qual as pernas não servem apenas para te levar do ponto A ao B, mas são sua arma principal.
Não foi a primeira atuação de Tocha, porém, já que ele já tinha sido o protagonista de um filme com Jet Li. E também não foi a última. Depois de “O Grande Dragão Branco”, o moçambicano se engajou na carreira artística e participou de dezenas de filmes.
Estudou atuação nos Estados Unidos e começou a fazer papéis sem relação com lutas. Já foi mafioso russo, malandro latino e outros tipos durões que habitam o submundo de Hollywood.
Hoje, aos 54 anos, dedica metade do seu tempo a treinar novos campeões de muay thai e a outra metade a filmar documentários. “Acabei de fazer um sobre assaltos a carro na África do Sul. Minha intenção é sempre mostrar a verdade sobre uma realidade, um problema, é isso que mais me encanta no cinema.”
Depois de tanto rodar o mundo, ele aprendeu a falar oito línguas, entre elas o português. É casado com uma tailandesa, tem amigos brasileiros. Diz ser chapa e fã de Anderson Silva (“ele está aprendendo muai thay, mas ainda tem muita estrada pela frente”) e vê em seus compatriotas um potencial natural para esse tipo de luta oriental.
“Vocês brasileiros já nascem sabendo futebol, jogando bola, chutando tudo que veem pela frente... têm tudo para se tornarem bons lutadores de muai thay”, diz Tocha, que na Tailândia ganhou um apelido cuja tradução para o português pode ser tanto flecha, quanto afiado.
“É uma referência à força e velocidade dos meus chutes e ao meu raciocínio rápido”, explica.
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