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Palestras, livros e desenho animado: a vida de Cielo longe das piscinas

Guilherme Costa

Do UOL, em Santa Bárbara D'Oeste

13/10/2016 06h00

Para quem vivenciou por mais de 20 anos uma rotina de nadador, passar alguns meses sem sequer cair na água pode parecer um hiato enorme. Para quem carregou por pelo menos oito anos a pressão de ser o maior nome de um país na história das piscinas olímpicas, o período sabático pode estar mais para necessidade. Após ter fracassado na tentativa de se classificar para os Jogos Olímpicos Rio-2016, Cesar Cielo, 29, resolveu parar. O paulista ficou quatro meses sem treinar e deixou de competir sem estipular data para um retorno. Em pouco tempo, a obsessão por décimos de segundos deu lugar a palestras, livros e desenho animado.

“Eu não consigo ficar parado. Desde o Maria Lenk eu li uns 13 livros. A gente vai achando coisa”, contou Cielo em entrevista concedida em Santa Bárbara D’Oeste, interior de São Paulo, cidade em que o nadador nasceu e inaugurou no dia 12 de outubro uma unidade do projeto social “Novos Cielos”.

A literatura e a iniciativa para formar novos nadadores foram apenas duas formas que o nadador encontrou para preencher o tempo durante o período sem competições: “Sou acelerado e não paro de pensar. A gente está formatando bastantes produtos. Palestras eu já comecei a dar algumas, e na semana que vem vou para mais uma”.

Cielo também formatou uma clínica – já fechou contrato com duas cidades – e negocia uma aula patenteada para natação em academias. Também tem feito ações para seus patrocinadores – a despeito de ter sido alijado da Rio-2016, não perdeu nenhum contrato comercial. O vínculo com o Minas Tênis Clube, mesmo com o período sabático, vai até o fim desta temporada.

O novo lado empresário é uma segunda etapa no processo de Cielo após ter ficado sem vaga na Rio-2016. O primeiro degrau foi o luto, e a reação do nadador foi se fechar por alguns meses. No período em que ficou longe das piscinas, o atleta também reduziu o contato com o público. Não aceitou convites para participar do revezamento da tocha ou da cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos, por exemplo. Rechaçou a possibilidade de participar da preparação da equipe brasileira de natação.

“Na verdade, a opção de dar uma afastada foi por questão de tirar isso da minha vida. Era aquela coisa de você decidir uma coisa, mas ficar vivendo o tempo inteiro. Senti que para dar uma pausa eu precisava ficar longe desse meio. Precisava ter tranquilidade de acordar e não pensar que tinha de aparecer, dar entrevista ou ir a um evento por causa da natação. Na minha cabeça, estava precisando, mesmo se fosse de um tempo em casa, para carregar autoestima e vida comum. Nunca dei valor a isso. O que eu mais queria era não ter agenda fixa ou horário para dormir. Tive isso durante 22 anos”, contou Cielo.

Depois de ter processado melhor a frustração, Cielo teve de dividir a atenção em duas frentes: durante o afastamento das piscinas, além de ter pensado em novos projetos profissionais, deu atenção especial ao filho, Thomas, que completou um ano em setembro.

“Não fiquei assistindo a TV em casa, não, até porque TV em casa está complicado. Já decorei todas as músicas do Disney Channel e não aguento mais o Mickey Mouse Club House, PG Masks e esses desenhos. Tem hora em que eu estou andando na rua e cantando essas musiquinhas. O menininho está dominando a casa, e a sala parece uma festa de colorido, com brinquedo para todo lado”, disse o nadador.

A Rio-2016, Cielo viu pela TV. Sofreu especialmente com o revezamento 4x100 m livre masculino e com Thiago Pereira, 30, sétimo colocado nos 200 m medley – o brasileiro estava em segundo até os últimos 50 metros. E acompanhar o desempenho de ex-companheiros serviu como catalisador para o campeão olímpico de 2008 diminuir o divórcio das piscinas.

“Não vou dizer que sinto saudade de pular na piscina fria às 5h30, mas estou começando a sentir vontade de novo. Acho que o objetivo era esse, mesmo. Se eu não sentisse falta, seria a hora de parar, mesmo. Fiquei me questionando muito isso durante o último ano e entendi que estava desmotivado porque estava fazendo uma coisa forçada. Aprendi que o ser humano detesta ser forçado”, finalizou Cielo.