A genética colocou João Victor Oliva muito cedo no noticiário. Ele ainda estava no ventre quando o país começou a discutir se ele iria ou não para sua primeira Olimpíada, em Atlanta-1996, no colo da mãe, logo depois de nascer. Vinte e seis anos depois, João já não é só o "filho da Hortência". É uma referência do hipismo nacional. Há uma semana, tornou-se o primeiro brasileiro a avançar para a segunda etapa do Mundial de adestramento, terminando a competição na 21ª colocação. Para se entender a grandiosidade do resultado para o adestramento brasileiro, a colocação de João Victor precisa ser colocada em perspectiva. Nos três Mundiais antes da estreia dele, a campanha de maior destaque era a do 55º de Luiza Almeida, 10 posições acima da última colocação. Em 2014, João foi 85º entre 100 atletas, aos 18 anos, e 59º entre 76 competidores em 2018. Se até aqui o objetivo era distanciar-se dos últimos, neste Mundial disputado na Dinamarca, João mostrou que cada vez mais se aproxima dos primeiros. Eu imaginava que ia chegar neste estágio, mas não tão rápido. Encontrei um cavalo bom, temos um bom conjunto, treinador, equipe boa. Quando eu fiz o primeiro Mundial eu era muito jovem e fui o melhor do Brasil. Isso no fim mostrou que era um pouco fácil ser o melhor do Brasil, e não era o que eu buscava. Por isso continuei vivendo na Europa, investindo muito em mim, para um dia chegar onde eu cheguei, que ainda não é o que eu quero para mim." Em Herning, João teve a melhor nota de um brasileiro em Mundial na fase de classificação (aproveitamento de 72,112%), passando em 26º para a final que reúne os 30 melhores conjuntos. Na segunda etapa, melhorou para 73,313%, terminando em 21º e a menos de um ponto da 15ª e última vaga no Grand Prix — o adestramento distribui medalhas duas vezes, em duas finais. É difícil para leigos entenderem as notas do adestramento, mas os números ajudam a explicar. João pontuou na casa de 68% na Rio-2016, de 65% no Mundial de 2018, 70% em Tóquio-2020 (quando foi 26º), e agora alcançou 73%. Aos poucos, a percepção dos juízes a respeito dele vai mudando. Às vezes o juiz não te conhece e fica com medo de dar nota e ser diferente dos outros. É um esporte que é subjetivo e a gente tem sempre que estar trabalhando. Vai ficando mais reconhecido e vai melhorando a parte política. Acho que seria mais fácil se fosse como no salto, que bateu (no obstáculo), caiu e pronto. Não é um papel fácil o de julgar." Mas esse reconhecimento dos juízes só vem porque João vem evoluindo, e não sozinho. Desde 2020 o brasileiro monta um cavalo de elite, Escorial Horsecampline, comprado pelo grupo de investimento JRME-Horse Campline, do também brasileiro Thiago Mantovani. Aí entra de novo a questão genética. A tropa de elite do adestramento é formada pelos cavalos Warmblood, os "sangue quente", desenvolvidos principalmente na Alemanha e que têm "livro aberto", o que permite que continuem sendo realizados os cruzamentos entre raças visando o melhoramento genético. Afinal, ao longo de muitos anos, especialistas têm realizado esses cruzamentos buscando deixar os animais mais bem preparados para as competições. Mas o Brasil tem desenvolvido a tradição de competir com cavalos Lusitanos, que só podem ser cruzados entre si — têm "livro fechado", ou seja, não há mais possibilidade de melhoramento genético por cruzamento de raças. E nenhum outro garanhão Lusitano é tão badalado quanto Escorial, que tem carreira dupla, produzindo sêmen e tendo os melhores resultados esportivos da raça. Por esses motivos, o conjunto acaba tendo grande responsabilidade com os investidores. "Tem que estar em destaque. Por isso vou estar apresentando ele até o fim do contrato [com a JRME], que vai até Paris, ou quando a gente decidir ter outro objetivo com ele", diz João Junto com o pai, José Victor Oliva, o cavaleiro também é criador de Lusitano e proprietário de Feel Good VO, cavalo que foi montado pelo outro brasileiro que disputou o Mundial de adestramento. Nuno Chaves de Almeida competia por Portugal, mas, como nasceu em Niterói, foi influenciado por João a mudar de nacionalidade esportiva. Ele foi 85º no Mundial. João Victor sabe que sua influência vai muito além do caso específico de Nuno. "Eu quero servir de exemplo para pessoas mais novas. Quando a criançada tem um ídolo, ela quer fazer igual. Meu papel é fazer papel bonito para a base querer ser igual a mim. Quando aumenta a base, aumenta a qualidade do esporte do país. A gente quer aumentar o número de pessoas do adestramento." PUBLICIDADE | | |