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Olhar Olímpico

OPINIÃO

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Crise entre Medina e COB levanta dúvida: o que faz a confederação de surfe?

Italo Ferreira e Gabriel Medina - Matt Dunbar/World Surf League via Getty Images
Italo Ferreira e Gabriel Medina Imagem: Matt Dunbar/World Surf League via Getty Images

10/07/2021 14h50

Ganha um pirulito quem souber responder o que faz a Confederação Brasileira de Surfe (CBSurfe), que vai receber R$ 4,4 milhões do Comitê Olímpico do Brasil (COB) só em 2021. Sem qualquer participação no alto rendimento da modalidade, administrado no Brasil pela Abrasp e no exterior pela WSL, a entidade supostamente deveria ser responsável por cuidar da participação brasileira nos Jogos Olímpicos, mas claramente nem isso ela faz.

Vejamos o exemplo do atletismo. A modalidade está em guerra interna por causa da convocação tanto de atletas quanto de treinadores. A Confederação Brasileira de Atletismo (CBAt) usou critérios que são contestados por parte da comunidade atlética e agora arca com as críticas. Se o técnico e pai de Paulo André Camilo, Carlos Camilo, não vai a Tóquio, a responsabilidade é toda e somente da CBAt. O COB apenas faz a inscrição dos indicados pela confederação.

No surfe, em meio a toda a polêmica sobre o veto a Yasmin Brunet na Olimpíada, ninguém nem tocou no nome da CBSurfe. Nem Gabriel Medina. Em vídeo no Instagram, disse que conversou com diversas pessoas do COB, que ligou para o presidente do COB, que recebeu respostas confusas do COB. Mas não deveria ser a CBSurfe a fazer essa indicação, dar essas respostas?

No site da CBSurfe, não há nenhuma linha sobre a participação do Brasil na Olimpíada. É como se os Jogos não existissem. Entre os documentos listados ali, não há, por exemplo, um que convoque Gabriel Medina (ou Ítalo, ou Tati, ou Silvana) para defender o Brasil em Tóquio. E, claro, também não há convocação de técnicos, médicos, fisioterapeutas, nada.

Nesse site se descobre que a confederação tem dois funcionários remunerados. Adalvo Nogueira Argolo, presidente, que recebe R$ 15 mil por mês, e o gerente financeiro Ricardo Vargas Freitas da Silva, que ganha R$ 5,6 mil em carteira. Na área de contato, há um endereço de São Paulo com um telefone fixo do Rio de Janeiro. Durante as eleições, que são contestadas na Justiça, a inscrição das chapas deveria acontecer em um endereço em Salvador (BA), terra de Argolo, onde funcionava um escritório de contabilidade no qual ninguém sabia sobre a CBSurfe.

Entre o fim de maio e o começo de junho, a CBSurfe até enviou uma delegação ao ISA Games, mundial amador, em El Salvador, onde a participação era obrigatória como critério de elegibilidade para os surfistas participarem da Olimpíada. O próprio Argolo foi o "chefe" de equipe, com Paulo Kid convocado como treinador.

Os brasileiros participaram das primeiras rodadas e voltaram para casa porque o evento era irrelevante. Argolo continuou em El Salvador e explicou no Instagram da confederação que ficaria "tirando proveito da excelente estrutura física e de serviços montada para esta missão". Isso foi em 2 de junho, e essa é a última informação postada no perfil da confederação.

Agora, deveria ser a confederação a responsável por indicar uma comissão técnica para ir à Olimpíada, mas é como se Tóquio-2020 não existisse para a CBSurfe. No skate, onde também não existia essa cultura de "seleção", a Confederação Brasileira de Skate (CBSk) contratou técnicos, médicos, fisioterapeutas, psicólogos. É assim no atletismo, natação, judô, vela, canoagem, basquete, vôlei, futebol...

No surfe, sem uma confederação atuante, o Brasil vai a Tóquio com quatro atletas competindo por conta própria, com acompanhantes próprios, e representando o mesmo país. Não há um plano, não há um programa para aproveitar os Jogos Olímpicos para somar conhecimento ao surfe brasileiro. Ganhando ou perdendo, não haverá legado para o país. Os aprendizados serão dos atletas e dos seus estafes. E só.

Não acho que necessariamente seja um problema esse modelo. O surfe tem o direito de não se dobrar ao movimento olímpico e manter a independência e individualidade dos atletas, Porém, se a opção é essa, não tem por que a CBSurfe ser beneficiária da Lei Agnelo/Piva. A confederação só pode receber a bagatela de R$ 4,4 milhões ao ano porque tem campeões mundiais profissionais. E a partir do ano que vem, esse valor deve aumentar bastante se os profissionais ganharem medalhas em Tóquio, uma vez que os resultados são usados como critério.