Quando Hebert Conceição entrou no ringue para a luta mais importante da sua vida, as caixas de som do ginásio Ryogoku Kokugikan ressoavam com os batuques do Olodum e uma voz que seguiu sua caminhada com os seguintes versos:
Nobre guerreiro negro de alma leve / nobre guerreiro negro lutador / que os bons ventos calmos assim te levem aonde você for."
Seu treinador fez respingar água por todo seu corpo antes dele cruzar as cordas do ringue, enquanto seus parceiros de treino gritavam seu nome das arquibancadas. Mas quando soou o gongo, Hebert começou a ser atropelado. O ucraniano Oleksandr Khyzhniak o amassou com jabs, diretos e cruzados e o pressionou em direção às cordas. Foram seis minutos de sofrimento, seis minutos nos quais o baiano não encontrava uma saída e via o ouro olímpico arrancado de si com violência.
Ele parou, tentou respirar, mas entre uma respiração e outra, os braços do ucraniano o acertavam em partes diferentes do corpo. Os ventos não estavam calmos, mas Hebert tentava navegar mesmo assim contra eles. Ele buscava acertar um soco. Talvez um soco fosse tudo o que precisasse. Quando o ucraniano avançou para mais uma rajada de fúria, os treinadores e amigos pressentiram o pior, mas Hebert jogou o braço esquerdo no sentido contrário, por instinto. "Um soco", ele deve ter pensado e pedido e mentalizado o movimento perfeito.
O punho saiu e parou exatamente onde devia, na ponta do queixo, sacudindo a têmpora do ucraniano. Um soco. O ar do ginásio ficou carregado de expectativa enquanto Khyzhniak desmoronava diante do brasileiro. Nocautes são raros no boxe olímpico, mas o peso da mão de Hebert Conceição também é raro. Quando o ucraniano voltou a si, o árbitro já estava cruzando os braços no ar, decretando o fim da luta e a medalha de ouro do brasileiro.
Hebert primeiro se jogou ao solo e pareceu chorar, talvez lembrando da sua família que se reunia no bairro de Pau da Lima, em Salvador, para ver o filho tentar a sorte do outro lado do mundo. A mãe, Ieda, o tinha proibido de telefonar enquanto estivesse em Tóquio porque Hebert sempre chorava quando falava com a mãe e ela não queria vê-lo chorando.
Ao se dar conta do que tinha acontecido, Hebert gritou pra câmera, bateu no peito e já não chorava mais. Depois, dançou. Um negro guerreiro de alma leve, campeão olímpico aos 23 anos.