Sinais trocados

O Brasil das Olimpíadas rechaça o negacionismo em relação à pandemia do Brasil do governo Bolsonaro

Adriano Wilkson e Felipe Pereira Do UOL, em Tóquio Miriam Jeske/COB

Do primeiro ao penúltimo dia das Olimpíadas de Tóquio, que terminaram ontem (8), atletas e o COB (Comitê Olímpico do Brasil) não seguiram o negacionismo que o governo federal vem adotando desde o início da pandemia de covid-19.

No dia 1 dos Jogos, o COB foi a única das principais delegações que evitou aglomeração na cerimônia de abertura, levando apenas quatro pessoas para o desfile. No dia 16, os campeões olímpicos Isaquias Queiroz, da canoagem, e Hebert Conceição, do boxe, dedicaram suas medalhas às vítimas da covid. Mostraram uma solidariedade com o luto das famílias que nunca partiu do presidente da República, Jair Bolsonaro.

A postura da delegação brasileira se materializou em atos. O protocolo sanitário foi ainda mais rigoroso que o adotado pelo Comitê Olímpico Internacional. O COB exigiu de jornalistas e frequentadores da base do Time Brasil o uso de máscaras do tipo PFF2 ou N95, as mais recomendadas para conter o vírus. Quem não tinha, recebia uma na hora.

Por exigência da organização das Olimpíadas, todos os atletas foram testados diariamente. O COB estendeu esta rotina de testes a qualquer funcionário que tivesse o mínimo de interação com o time.

Ao protocolo, somou-se a eficiente força-tarefa para vacinar a maioria dos credenciados a viajar ao Japão. Só não foi imunizado quem não quis — caso do surfista Gabriel Medina, que alegou não ter se vacinado por problemas de agenda.

Homenagens às vítimas da pandemia

É um presente para toda família brasileira, que passou por muitos desafios ao longo desses anos. Covid, vários familiares morrendo por causa dessa doença. Dedico a cada uma dessas famílias que perderam um ente querido."

Isaquias Queiroz, ouro na canoagem

A nossa nação está passando por um momento difícil, e fico muito feliz em premiar ela com uma medalha de ouro. Em um momento tão caótico, qualquer sorriso é válido. Fico feliz de passar um momento de felicidade no meio de tanta tristeza."

Hebert Conceição, ouro no boxe

Matthias Hangst/Getty Images

Protocolo zera casos de covid na delegação brasileira

A estratégia foi bem-sucedida, e o Brasil das Olimpíadas não teve nenhum caso de covid, entre atletas e demais credenciados. Nas Olimpíadas, houve 387 diagnósticos positivos, segundo o balanço mais recente.

A atitude do COB em apostar na prevenção e a anuência dos atletas em seguir as recomendações contrasta com as ações de Jair Bolsonaro. Ele sempre desencorajou o uso de máscaras, apostou em estratégias ineficientes, negou a gravidade da doença e questionou a eficácia da vacina. A diferença foi verbalizada pela velejadora Kahena Kunze, medalha de ouro na vela ao lado de Martine Grael.

"A política brasileira cada vez mais pensa no curto prazo, no próprio umbigo. Está muito mesquinho. Qualquer presidente no mundo, qualquer líder que tivesse feito o mínimo para guiar o povo durante esse momento de pandemia, distribuindo informação em vez de desinformação, teria se saído muito bem. E, não sei, mas parece que o nosso presidente se esforça para ser ruim", afirmou a velejadora em entrevista ao Universa, do UOL.

Reprodução / Internet

Regra antimanifestação foi desafiada

A declaração de Kahena não foi dada durante uma entrevista oficial nos Jogos, mas poderia ter sido, já que o COI relaxou neste ano sua regra contra manifestações políticas de atletas. Eles puderam protestar durante entrevistas e nas competições, e esse direito foi usufruído pelas jogadoras de futebol, que se ajoelharam em campo em sinal de apoio à luta antirracista.

Por razões óbvias, a covid-19 foi um tema central em uma edição olímpica em plena pandemia. Mas outras bandeiras ganharam voz no evento. A americana Raven Saunders, do arremesso de peso, cruzou os braços formando um X quando recebeu a medalha de prata. O gesto representa, segundo ela, "o ponto onde se cruzam os oprimidos".

O COI não permite manifestações no pódio e anunciou que abriu uma investigação para apurar a conduta da atleta. O comitê norte-americano afirmou que não aplicará a ela qualquer punição.

Phil Walter/Getty Images

COB e atletas mostram rara união anticovid em Brasil dividido

Em um país dividido por rixas políticas e ideológicas que atrapalharam o combate à pandemia, a delegação brasileira conseguiu mostrar raro engajamento durante os Jogos. Não houve casos de atletas se manifestando publicamente contra a vacina ou o uso de máscaras, o que aconteceu em outras delegações, como a americana.

Mesmo as naturais discordâncias políticas entre os atletas ficaram em segundo plano. Em Tóquio, o Brasil pareceu, depois de muito tempo, uma nação coesa, que caminha unida para vencer as adversidades e atingir objetivos comuns. Situação bem diferente da vivida internamente pelos brasileiros, que enquanto torciam pelos atletas olímpicos, viram a escalada da crise política e a ameaça de Bolsonaro de promover uma ruptura institucional se intensificar.

Tudo isso enquanto o país atingia a marca 562 mil mortos na pandemia.

As Olimpíadas sempre tentaram minimizar o componente político do esporte, mesmo sabendo que o esporte, como qualquer empreendimento humano, também é político. Talvez seja a hora da política olhar para a experiência brasileira em Tóquio e tirar algumas lições. Um bom começo seria mostrar solidariedade às famílias enlutadas, como os fizeram os campeões olímpicos Isaquias e Hebert.

Todos os medalhistas

  • DA GARAGEM À PRATA

    A história de Kelvin Hoefler e das mulheres decisivas para a primeira medalha do Brasil em Tóquio-2020.

    Imagem: TOBY MELVILLE/REUTERS
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  • O OLHAR DE DANIEL

    Bronze no judô, Cargnin mirou no ídolo, superou covid-19 e viveu saudade e dor para ser medalhista olímpico.

    Imagem: Gaspar Nóbrega/COB
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  • O QUE VOCÊ FAZIA AOS 13?

    Rayssa Leal dança na final olímpica, zoa repórteres e se torna a mais jovem medalhista brasileira da história.

    Imagem: Wander Roberto/COB/Wander Roberto/COB
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  • PELAS BEIRADAS

    Fernando Scheffer ganha bronze na natação após passar três meses sem ter uma piscina para nadar.

    Imagem: Satiro Sodré/SSPress/CBDA
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  • TEMPESTADE PERFEITA

    Italo Ferreira supera prancha quebrada, ganha 1º ouro do Brasil e consolida domínio brasileiro no surfe.

    Imagem: Jonne Roriz/COB
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  • TRÊS VEZES MAYRA

    Após 7 cirurgias e 9 meses sem treinar, Mayra leva bronze em Tóquio-2020 e confirma: é a maior da sua geração.

    Imagem: Chris Graythen/Getty Images
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  • BAILE DA REBECA

    Rebeca Andrade conquista o mundo com carisma e funk para ser prata no individual geral da ginástica.

    Imagem: Ricardo Bufolin/CBG
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  • PERMISSÃO PARA SER FELIZ

    Bruno Fratus viveu a angústia de quase ser medalhista por mais de dez anos. Até que hoje um bronze mudou tudo.

    Imagem: Jonne Roriz/COB
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  • AS ÚLTIMAS SÃO AS PRIMEIRAS

    Luisa Stefani e LauraPigossi entraram na última vaga da dupla feminina para ganhar a medalha do tênis brasileiro.

    Imagem: Reuters
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  • OUTRO PATAMAR

    Rebeca Andrade conquista ouro no salto e se torna a 1ª brasileira a se sagrar campeã olímpica na ginástica.

    Imagem: Laurence Griffiths/Getty Images
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  • XAVECO DO MOMENTO

    A história de Alison Piu dos Santos, bronze no atletismo, e do seu mantra: "o importante é xavecar o momento".

    Imagem: Patrick Smith/Getty Images
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  • BAILARINAS DE OURO

    Martine Grael e Kahena Kunze velejam como quem dança para serem bicampeãs olímpicas.

    Imagem: Jonne Roriz/COB
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  • DIAS DE LUTA

    Abner Teixeira não chegou na final, mas o bronze o aproxima de outro grande objetivo: dar uma casa à mãe.

    Imagem: Gaspar Nóbrega/COB
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  • O NOVO RAIO

    Thiago Braz repete a sua história, chega a uma Olimpíada sem favoritismo e sai de Tóquio-2020 com medalha.

    Imagem: Wagner Carmo/CBAt
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  • A MEDALHA QUE FALTAVA

    Ana Marcela foi a melhor do mundo durante os últimos dez anos. Agora, tem um ouro para comprovar isso.

    Imagem: Daniel Ramalho / COB
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  • PRATA, PAZ E AMOR

    Pedro Barros ganha prata em Tóquio, diz que medalha é souvenir e valoriza fraternidade entre skatistas.

    Imagem: REUTERS/Mike Blake
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  • QUANDO O CÉU SE ABRIU

    Isaquias sabia que não poderia repetir as 3 medalhas de 2016. Mas estava tudo programado para um ouro especial.

    Imagem: Miriam Jeske/COB
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  • ALMA LEVE, PUNHO PESADO

    Hebert Conceição ganha ouro no boxe com nocaute impressionante, exalta Nelson Mandela e luta contra o racismo.

    Imagem: Wander Roberto/COB/Wander Roberto/COB
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  • CANARINHO OLÍMPICO

    Ouro consolida o Brasil como maior potência olímpica do futebol e pode render frutos na Copa do Mundo.

    Imagem: Alexander Hassenstein/Getty Images
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  • CAIR E LEVANTAR

    Medalha de prata é testemunho de como vôlei feminino do Brasil conseguiu se reconstruir após derrota em 2016.

    Imagem: Gaspar Nóbrega/COB
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  • PUNHOS QUE ABREM PORTAS

    Bia Ferreira leva medalha de prata, chega mais longe que qualquer mulher no boxe e incentiva meninas a lutar.

    Imagem: UESLEI MARCELINO/REUTERS
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