Vaivém Olímpico: criatividade e emoção marcam as aberturas dos Jogos
A expectativa para a cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos de Tóquio é total. Como será a "festa" (com aspas mesmo, porque há dúvida se haverá o conceito de celebração) sem a alegria das delegações desfilando, orgulhosas, jogando chapéus para o alto, atrasando a parada para tirar fotos e explodindo de emoção com o som que vem das arquibancadas? Todos se acostumaram a esperar pela algazarra de italianos e brasileiros, pela opção entre a elegância clássica e os cortes desconstruídos e coloridos, pela emoção do grupo de refugiados e a apoteose da entrada da sempre imensa onda dos anfitriões, que fecham o desfile. Como será no Japão, no país futurista hoje está abatido e temeroso pela pandemia? A tecnologia conseguirá suprir a ausência do calor que se expande do público das arquibancadas para os atletas no gramado?
Com capacidade perto de 60 mil lugares, o Novo Estádio Olímpico de Tóquio terá apenas 10 mil privilegiados, entre eles chefes de Estado, dirigentes esportivos e patrocinadores. Como tudo em meio a esta pandemia, o show será reduzido, reforçando valores como igualdade, inclusão e resiliência por uma retomada mundial de esperança e expectativas meio à pandemia do coronavírus.
O grande objetivo dos produtores das cerimônias de abertura é deixar ao menos trechos de seus supereventos gravados na memória coletiva. Muitos conseguiram. Até os mais jovens já ouviram falar do ursinho Misha, de Moscou 1980, criando vida com desenhos compostos por placas manobradas pelo público nas arquibancadas. Aliás, a tão lembrada lágrima do Misha foi na cerimônia de encerramento, que muito menos gente vê...
Inovações sempre aparecem. Um homem voador, vestido de astronauta, sobrevoou o Coliseu de Los Angeles-1984, mas os norte-americanos erraram a mão quando tentaram de novo em Atlanta-1996, quando enfiaram caminhonetes Ford de faróis acesos no gramado, como se aquilo pudesse ter algum rastro de beleza. Seul-1988 criou uma cerimônia em três partes: terra, água e ar. Um espetáculo no Estádio Olímpico simultâneo a outro criado em barcos/dragões desfilando pelo rio Han, com suas margens de parques lotadas de espectadores, e — mais democrático ainda — um terceiro desenhado nos céus, por paraquedistas.
Virada de chave para a descontração
O grupo de arte e performance de rua La Fura dels Baus virou a chave dos desfiles, com sua apresentação em Barcelona-1992. Inundou com alegorias de seres marinhos o Estádio Olímpico de Montjuic (aberto inicialmente em 1936 para a Olimpíada do Povo, não realizada, que se contraporia a Hitler e a Olimpíada de Berlim naquele ano). O espaço virou uma representação do Mediterrâneo, a que a cidade iria se voltar depois da reforma urbana para a Olimpíada, depois de se sedimentar de costas para o mar.
No desfile, a desmilitarização total: do passo de ganso para a quebra dos ritmos, os desencaixes nas fileiras das delegações, uma correria para desmontar esquemas no gramado e tirar fotos com os ídolos do Dream Team de basquete dos Estados Unidos. Michael Jordan parecia deslumbrado debaixo de seu chapéu. Do Brasil, Hortência já tinha pedido sapatos do uniforme um número maior, porque sabia do cansaço dos atletas para ficar em pé, por todo o longo espetáculo.
Pela tevê, o mundo achou que o arqueiro errou, ao não cravar a flecha na pira olímpica. Mas o estabelecido era que a flecha, em chamas, passasse mesmo por cima, acendendo o gás expelido por um tubo.
Em Sydney-2000, a cerimônia de abertura ocupou o espaço, com participantes se deslocando por arames como se voassem. A tocha, que já havia sido levada (acesa!) por um mergulhador na Grande Barreira dos Corais, teve Cathy Freeman representando os aborígenes, acendendo a pira em meio a um tanque de água. Os australianos também inovaram, acrescentando cheiros aos efeitos visuais e sonoros do espetáculo. Vinham de uma espécie de ritual de purificação, com queima de folhagens.
Pequim-2008 arrasou com efeitos pela cidade, como os passos gigantes chegando ao Estádio Ninho de Pássaro e a "corrida" de atletas amarrados pelas arquibancadas. E Londres-2012 mostrou o ácido bom humor britânico, com a inesquecível "participação especial" da rainha Elizabeth II saltando de paraquedas do helicóptero de James Bond para entrar na tribuna de honra do Estádio Olímpico.
Do Rio-2016, somos suspeitos para falar, mas — resumindo — o mundo aplaudiu a criatividade dos produtores com recursos reciclados, por exemplo, do mundo dos desfiles de escolas de samba.
Em Tóquio, mesmo com a pandemia, os espectadores olímpicos sempre esperam(os) ser surpreendidos!
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