Calor nas Olimpíadas faz Japão ligar reator nuclear desativado em Fukushima
O forte calor do verão e a chegada de visitantes estrangeiros para as Olimpíadas levou o governo japonês a reativar um reator nuclear que não era ligado desde o acidente de Fukushima, que causou 2.200 mortes em 2013. A energia extra foi injetada para que o sistema elétrico possa suportar a demanda incomum por resfriamento das arenas olímpicas.
Nos primeiros dias dos Jogos, atletas, organizadores, jornalistas e os poucos torcedores autorizados a frequentar as competições sentiram na pele a onda de calor do verão japonês. Os dias da estação mais quente do ano atingem temperaturas superiores a 33º C —a sensação térmica é muito maior por causa da umidade do ar, que dificulta a evaporação do suor e, com isso, atrapalha o principal sistema de refrigeração do corpo humano.
Desmaios e abandonos
Acostumada, a população anda nas ruas com sombrinhas. Nas sedes olímpicas, são distribuídos balas de sal, vaporizadores de água e acentos individuais refrescantes. Os estrangeiros podem ter mais dificuldades de adaptação. Durante a rodada de classificação do tiro com arco de ontem (23), a russa Svetlana Gomboeva desmaiou assim que terminou sua prova. "Foi a primeira vez que isso aconteceu. Em Vladivostok, onde estávamos treinando antes de vir para cá, o tempo estava parecido. Mas a umidade fez a diferença aqui", diz o treinador Stanislav Popov.
Hoje, a tenista cazaque Zarina Diyas se retirou da partida contra a tcheca Bárbara Krejcikova. Ela se sentiu mal quando perdia por 2/5. O jogo durou 31 minutos. Para evitar essas situações, os atletas recebem coletes de gelo que ajudam a baixar a temperatura corporal.
"No verão é sempre quente assim, mas aqui costuma ser um pouco mais fresco que em Tóquio", afirma a engenheira Mayu Kobayashi, de 40 anos, que foi ao circuito de Fuji, a 62 km da capital japonesa, para torcer com os dois filhos e o marido para a prova de estrada do ciclismo. A prefeitura da cidade foi uma das poucas que liberou público nas competições.
Qual o problema da umidade?
Para um brasileiro, pode até parecer que o calor da faixa de 30º C não é grande coisa, mas a umidade relativa do ar perto dos 80% eleva a sensação de calor. As temperaturas podem chegar a 40° C na maior parte do Japão. Quanto maior a umidade, maior a sensação de abafamento. Mortes por superaquecimento no verão não são incomuns no Japão.
"Em ambientes muito quentes, ocorre a vasodilatação cutânea. Ou seja, nossos vasos sanguíneos dilatam, fazendo com que chegue mais sangue na pele. A pele fica quente, fazendo com que haja mais condução do calor para o meio ambiente. Outra maneira de regular a temperatura é pela evaporação. Quando a água evapora da superfície corporal, perde calor, diminuindo a temperatura do corpo. Acontece que a taxa de perda de calor através desse mecanismo é dependente da umidade relativa do ar. Quando a umidade supera os 60%, a água não evapora tão facilmente e a evaporação perde sua eficácia. É diferente de um ambiente seco, com umidade quase nula, em que a evaporação acontece com facilidade", explica Julia Luzo Elias Thame, especialista em clínica médica pela Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.
"O suor excessivo pode levar à desidratação e, junto com a vasodilatação, pode levar à hipotensão, mal-estar, síncope (desmaio), dores de cabeça, câimbras. Enquanto os mecanismos de regulação estão sendo suficientes, os danos causados ao organismo são mínimos. Entretanto, quando o corpo finda esses mecanismos, a temperatura corporal começa a subir e leva à disfunção dos órgãos, que é o que chamamos de insolação. Confusão, tontura, perda da consciência são sintomas que indicam comprometimento do sistema nervoso central", conclui.
Brasileiros sofreram
A reportagem do UOL Esporte foi aos jogos das primeiras rodadas do vôlei de praia, no Shiokaze Park, e às provas do ciclismo de estrada, em Fuji. Nos dois locais, a organização exibiu vários alertas sobre o risco de insolação. Em Fuji, voluntários espirravam jatos de água na torcida, e alguns japoneses portavam pequenos ventiladores no pescoço. Ventiladores extras também foram instalados no Estádio Nacional, durante a cerimônia de abertura.
Alisson e Álvaro, dupla do vôlei de praia que venceu os argentinas Azaad e Capogrosso, comentaram sobre o clima. "Nós chegamos aqui há 12 dias, sabíamos do calor. É um calor diferente, muito úmido. Estamos suando bastante, mais que o normal. Como não está ventando, parece que está mais quente ainda", diz Alisson ao UOL Esporte.
"O calor aqui é diferente, parece que cansa mais. Tem que respirar, hidratar muito pra não sofrer dentro da quadra", afirma Duda, que joga ao lado de Agatha e também venceu em sua estreia no vôlei de praia. "É um caldeirão", completa Agatha. "Tiveram momentos do jogo que eu tive que puxar o ar pra poder aguentar e fazer o próximo jogo. Teve uma hora que o árbitro me lembrou que eu tinha que tomar água. Na troca de lado do campo, a gente pode beber água. Em condições extremas, eles liberam", destaca, referindo-se ao jogo contra as argentinas Gallay e Pereyra.
Demanda por ar-condicionado aumenta consumo de energia
A decisão de reativar usinas elétricas há muito desligadas é uma tentativa de suportar a alta demanda de resfriamento e evitar uma crise de energia, em um país que recebe 80 mil visitantes estrangeiros durante os Jogos.
A ação foi necessária principalmente pelo uso contínuo de ar condicionado nas instalações olímpicas. Logo ao desembarcar no aeroporto de Narita, em Chiba, a reportagem do UOL Esporte e parte da imprensa internacional sentiram intensamente o calor do verão japonês, que não pôde ser minimizado pelo sistema de ar condicionado.
O governo já emitiu alertas de riscos de insolação e não há previsão de refresco, mesmo com a expectativa de chuva para os próximos dias.
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