Juiz brasileiro diz que não teve roubo, mas acha que Medina ganhou bateria
No país do futebol, de uma hora para outra, todo mundo passou a entender de surfe e dos pequenos detalhes que transformam um competidor em campeão. E na madrugada desta terça-feira (27) muito se falou do que aconteceu entre as ondas da praia Tsurigaraki, quando Gabriel Medina perdeu na semifinal olímpica para o japonês Kanoa Igarashi.
O brasileiro foi prejudicado pelos juízes? Igarashi mereceu aqueles 9,33 que lhe garantiram a passagem para a grande final?
A polêmica entrou para os assuntos mais discutidos entre os fãs nacionais. E até quem não entende nada de surfe se meteu a especialista: quase como no futebol, quando se discute por meses, anos, se um jogador estava impedido ou não. E com certeza a derrota de Medina entra para a história do esporte brasileiro.
Para os leigos, houve "mutreta". Mas e para os especialistas? Fomos ouvir José Cláudio Gadelha, um dos principais juízes de surfe do país e que era até o fim do ano passado, diretor-técnico da confederação brasileira da modalidade.
"Roubo? Não, não se pode colocar a questão neste patamar. Não se pode falar em roubo, porque todos os juízes que estão lá são supercapacitados. Eles têm o replay para julgar. Mas ficou sim uma dúvida: foi muito alta aquela nota que determinou a vitória do Igarashi."
Por que José Claudio acha isso? "Veja bem: a gente tem que ver que no surfe as manobras são julgadas subjetivamente. Ainda assim, nós temos um grupo de pessoas ligadas ao surfe e analisamos muito o que aconteceu no Japão e pelas imagens, que estudamos e até foram sobrepostas para comparações, aquela onda não era para ter uma nota tão alta. Eram imagens da mesma bateria e achamos que na comparação dessas ondas, a nota não deveria ter uma diferença tão grande entre uma e outra onda."
"Pelas imagens que estudamos, a onda de 9,33 do Igarashi não era para ser tudo aquilo. E explico: os juízes usam sempre referências na disputa das baterias para atribuir a nota. E pela comparação com as ondas anteriores, não era para chegar nem à casa dos 9. Ela foi uma nota muito alta se compararmos às manobras aéreas anteriores do próprio Medina, que não recebeu nem um oito alto."
"Precisa ficar claro que muita gente vai dizer: 'ah, são juízes brasileiros falando. Coisa de patriota, defendendo o Medina!' Mas não é isso não. O que ocorreu não foi um fato corriqueiro. E quando há polêmica no surfe, quando há tanta discussão, tem sempre um fundo de razão".
"Foi por isso que o pessoal do nosso grupo pegou a filmagem da prova e editou onda sobre onda para comparar as manobras. E a conclusão a que eu cheguei é que o Medina ganhou a bateria. Teve gente no grupo que achou que ele não ganhou".
"Pela imagem se pode ver que as duas ondas foram bem parecidas. Então não era para ter muita diferença nas notas, não é? Uma muito melhor do que a outra. Mas são opiniões, não é? A gente não está lá no local para ver assim 'in loco', porque é fácil você estar em casa sentado, sem muita responsabilidade, sem aquela pressão de estar julgando um evento dessa grandiosidade. Mas resumindo: é isso, cara, o julgamento é subjetivo! Se tivesse outro painel de juízes, vai saber se o resultado não seria o contrário. Mas concluindo não dá para classificar: ah, isso foi roubado, e pronto! Isso não existe. São coisas que levam as pessoas a fugir para um lado que não é bom para o esporte. Mas fica aí esse registro aí. São opiniões diferentes, mas a gente respeita os juízes que estão trabalhando lá, até porque a gente tem uma amizade muito grande pelas pessoas e não gostaria de estar colocando num modo que fosse ruim para eles".
Palavra de quem entende e vive o surfe há 30 anos. Três décadas trabalhando com o julgamento em eventos de surfe.
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