Quase metade de todas as medalhas conquistadas pelo Brasil em Jogos Olímpicos foi de bronze. A sensação de que o resultado foi bom, mas não o suficiente, fez com que, em diversas oportunidades, o terceiro lugar fosse visto como um fardo pela torcida. Mas, hoje, a sensação pelo bronze de Alison dos Santos, o Piu, foi completamente diferente.
Não que ela tenha gosto de ouro ou prata, como diz o clichê quando se quer valorizar demais uma conquista. Não tem. Ela tem é gosto de bronze, porque Piu é o terceiro melhor corredor de 400m com barreiras da atualidade. Não o primeiro, não o segundo. O terceiro, sem sombra de dúvidas.
O que faz essa medalha ser diferente é que essa fotografia da linha de chegada da final olímpica de Tóquio, com o norueguês Warholm em primeiro, o americano Benjamin em segundo e Piu em terceiro, é também o retrato da história dos 400m com barreiras. O melhor de todos os tempos é Warholm. O segundo melhor, Benjamin. O terceiro, Piu.
O bronze do brasileiro foi conquistado hoje na prova mais forte da história dos 400m com barreiras, talvez a mais forte da história do atletismo. Do primeiro ao terceiro colocado, todos teriam sido campeões olímpicos em qualquer edição dos Jogos. O quarto (McMaster, das Ilhas Virgens Britânicas) e o quinto (Samba, do Qatar) teriam ganho qualquer Olimpíada, menos a de Barcelona-1992.
O nível da prova pode ser explicado pela foto que ilustra esse texto. Foi assustador. Até um mês atrás, os 400m com barreiras eram a prova masculina de pista com o mais antigo recorde mundial, intacto desde que o americano Kevin Young correu a final olímpica de 1992 em 46s78.
Por muitos anos, a ideia de correr os 400m com barreiras abaixo de 47 segundos foi uma utopia para os melhores atletas do mundo. Campeões olímpicos e mundiais não passaram nem perto. O feito só foi alcançado de novo em 2018 pelo qatari Abderrahman Samba, com 46s98. Um ano depois, Warholm e Benjamim furaram por pouco essa barreira.
Derrubar o recorde mundial passou, então, a ser uma possibilidade. E o norueguês Warholm fez isso há exatamente um mês, na Diamond League de Oslo, com 46s70. Depois de quase 30 anos, alguém conseguiu ser oito centésimos melhor que Young.
Corta para a pista do Estádio Olímpico de Tóquio. Debaixo do sol do meio-dia no calor de Tóquio, que o tenista Novak Djokovic descreveu como o pior que enfrentou na carreira, Warholm completou a prova em 45s94. Baixou, de uma tacada só, absurdos 76 centésimos seu próprio recorde. Benjamin melhorou 61 centésimos a velha marca de Young, e mesmo assim não venceu.
Piu ficou atrás deles, mas na frente de todos os outros que um dia correram os 400 metros com barreiras. Com 46s72, passou Young e assumiu o posto de terceiro melhor da história. Com esse tempo, ele só não venceria duas provas na história: aquela de Oslo, de um mês atrás, quando foi segundo colocado. E a de hoje.
Em uma tacada só, Alison melhorou em 41 centésimos o recorde sul-americano, que era dele mesmo, feito na semifinal. E isso não é nada comparado ao que ele já fez nos últimos três meses. Até maio, o recorde continental era 47s84, e vinha desde 2005.
Ao colocar a medalha no peito, Piu será apenas o terceiro brasileiro a fazê-lo em provas individuais de pista. Antes dele, só Joaquim Cruz (ouro em 1984 e prata em 1988 nos 800m) e Robson Caetano (bronze nos 200m em 1988).
Mas a mais importante das informações ficou para o fim: Piu tem apenas 21 anos. Se seguir o padrão de Warholm, que chegou ao melhor da carreira aos 25 anos, e Benjamin, aos 24, o brasileiro estará voando em Paris-2024, a edição olímpica para a qual inicialmente estava sendo preparado. Vai ser um deleite para os brasileiros o acompanharem.
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