Abraço coletivo mostra que skate é o esporte mais good vibes de Tóquio
Sky Brown coloca pressão no skate, ganha velocidade e projeta as pernas para o ar enquanto apoia as mãos no chão. Depois de plantar uma bananeira na borda da pista, volta ao traçado. Carrega a velocidade novamente, salta e dá um tranco no skate, que gira no ar. Os pés aterrissam sobre o shape no instante exato que as rodas tocam o asfalto. As pessoas na borda da pista aplaudem em ovação.
Sem público por causa das restrições sanitárias, quem faz barulho são as adversárias da britânica na final da prova de skate park das Olimpíadas de Tóquio-2020.
O skate carrega o espírito olímpico. Todos torcem por todos.
Ao final da volta, a Sky Brown é envolvida num abraço coletivo por japonesas, americanas e brasileiras. A performance limpa poderia deixar as rivais sem medalha, mas elas não se veem como rivais. Nem seus treinadores. A comissão técnica brasileira abraçou os técnicos britânicos quando saiu uma nota que garantia o bronze a Sky Brown. Uma das brasileiras na final, Yndiara Asp explica este comportamento.
"A gente sabe como é difícil acertar uma manobra, como é difícil se superar. E todo mundo ali tava tentando se superar. É por isso que a gente consegue comemorar junto."
Esta sensação de fraternidade do skate transmite uma pureza esportiva que lembra a dos tempos em que os times brasileiros jogavam procurando o gol. Hoje, a obrigação do resultado transformou a diversão em cobrança. A primeira preocupação é recompor a defesa para não perder.
No skate ainda cabe a emoção superar a razão. Isadora Pacheco, 16 anos, estava nervosa antes da primeira Olimpíada da vida, mas ela não perdeu sua essência. Permitiu a si mesma se divertir e deixar o skate fluir. "A última manobra mesmo eu nem tinha treinado. Foi na hora, na emoção mesmo. Mas foi muito massa, eu gostei muito. Foi a sensação melhor da minha vida."
O skate não é carrancudo. Se divertir é da cultura do esporte. Durante a disputa das medalhas, apareceu um ukulele e as atletas cantaram como jovens num final de semana no sítio. O esporte é good vibes porque herda a formação diferente de quase tudo que existe no programa olímpico.
As modalidades tradicionais têm o pódio como alvo. Isadora não fala em medalha, mas em fazer a mesma manobra que as rivais. "A gente viu que o nível tá muito alto e o que a gente mais vai fazer agora é treinar para superar isso. Nosso sonho é estar fazendo essas manobras que elas fazem", declarou na zona mista.
O skate é pelo rolê. Praticantes que não partilham desta visão são excluídos do grupo, afirma Dora Varella, terceira brasileira a participar de Tóquio-2020. "Quando a pessoa não vibra nessa energia, ela não tá vibrando na energia do skate, que é se divertir e querer o bem do próximo."
O skatista é aquele cara que acha mais bonito o drible que o gol.
Good vibes
Depois de cada volta numa competição, os skatistas precisam voltar para a área de largada. Difícil um que não faça o caminho tentando manobras. Rayssa Leal é dessas. Mesmo competindo na categoria street, ela é amiga de Sky Brown, que compete na categoria park. A inglesa é tão apegada às brasileiras (Letícia Buffoni é sua sócia em uma marca de shapes), ao ponto de brotar no prédio do Time Brasil na Vila Olímpica para fazerem as unhas juntas.
"Na vila a gente ia jantar junto, almoçava, andava de bike. Pra lá e pra cá, a Sky sempre tava no prédio do Brasil. É quase uma brasileira já", afirma Dora Pacheco.
Precisaria ser muito falsiane para ter esta proximidade e torcer pela queda da coleguinha na pista.
Outra particularidade que o skate olímpico carrega é a juventude. O pódio desta quarta tinha atletas de 19 anos, de 13 anos e outra de 12 anos. Neste meio em que a maioria não tem idade para dirigir, barreiras são quebradas. Também aparece a visão de mundo de uma nova geração.
"A gente tem visto meninas mais novas nos campeonatos e elas veem com uma cabeça mais evoluída, sem limitações. Sem achar que não consegue, que isso é coisa de menino e de menina. E eu acho que esta é a mensagem dessa galera mais nova. A gente, querendo ou não foi acostumado que tal coisa é só de menino, só os meninos conseguem fazer", avalia Yndiara, 23 anos.
A inclusão do skate nas Olimpíadas é vista como oportunidade de popularizar o esporte. Mas as atletas admitem que existe o risco da essência se perder. Tanto que já trabalham contra este possível efeito colateral.
"A gente espera conseguir passar isso para as próximas gerações. Acho que o medo da galera é que as próximas gerações percam isso. Mas a gente veio para cá juntamente com este papel, passar adiante", explica Yndiara.
O skate quer ser popular sem ser perder as raízes.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.