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Hebert Conceição dedicou primeiro título na carreira a amigo assassinado

Roberto Salim

Colaboração para o UOL, em São Paulo

07/08/2021 03h15

Ao lado de uma conquista, o boxe brasileiro quase sempre carrega uma história dramática. Hebert Conceição, que hoje ganhou a medalha de ouro nos Jogos Olímpicos de Tóquio, tem no currículo o primeiro título dedicado a um amigo vítima de um crime na Bahia.

Quem conta é o técnico Marquinhos, o Marco Antônio, que encaminhou a carreira de Hebert quando ele chegou ainda menino a suas mãos levado por outro treinador.

"Eu estava na sede da Federação Baiana, porque eu era o técnico da equipe de cadetes que ia disputar o campeonato brasileiro de 2012, em Sergipe", relembra Marquinhos, que foi campeão baiano dos galos. "Foi quando o presidente Joílson Santana ligou para o (técnico) Davi Bispo e perguntou se ele tinha algum jovem na categoria 81 quilos. Faltava exatamente esta categoria para completar a equipe. E o Davi tinha o Hebert".

Na época, Hebert Conceição era um menino que trabalhava como lavador de carros e também como atendente em uma padaria no bairro Sete de Abril. "Então o presidente Joílson Santana perguntou ao Hebert se ele tinha coragem para ir ao campeonato brasileiro. E ele respondeu que tinha. E fomos para Sergipe".

Na primeira luta, o técnico Marquinhos recorda que na volta para o corner, ao fim do assalto inicial, o menino estava perdendo em sua estreia. "Falei para ele lutar com mais determinação e ele pediu para eu dar um murro nele. Eu me neguei a isso, mas dei um tapa para despertá-lo. Ele voltou ao ringue e venceu por nocaute no segundo round mesmo".

Aí veio a luta pelo título. No dia da disputa pela medalha de ouro do Campeonato Brasileiro de Cadetes, um outro atleta da equipe baiana foi contar ao técnico Marquinhos que Hebert estava chorando muito no quarto do alojamento. "Cheguei lá e perguntei o que estava acontecendo e ele disse que um grande amigo tinha sido assassinado em Salvador. Sabe como é? Bairro pobre, periferia. O Hebert nunca teve problemas, estudava e trabalhava, mas o amigo foi assassinado".

Foi então que Marquinhos sugeriu ao menino: "Suba ao ringue, lute e dedique a vitória a ele". E foi o que Hebert fez. "Ele venceu a luta por nocaute e o no fim se ajoelhou no meio do ringue e disse: 'essa luta é para você irmão!' E daí em diante, o Hebert nunca perdeu uma luta no Brasil".

Logo a fama do menino que treinava na Academia Champion correu os ringues do país. Ele chegou à seleção brasileira e agora conquistou uma medalha olímpica.

"Antes de viajar para Tóquio, ele falou comigo e eu disse a ele que independentemente de resultados ele já era um campeão. Tem coragem e determinação. É um homem de honra. E quando ele vem dos treinos da seleção lá em São Paulo, sempre traz material e luvas para os treinos que eu tenho dado agora para os jovens na academia do ex-pugilista Ricardo da Baga, aqui na Cidade Nova. E vou dizer mais: quando falta dinheiro para transporte dos atletas ou para alguma emergência, ele faz questão de depositar em nossa conta", revela Marquinhos.