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Pai de Bia Ferreira fala em ouro: 'Onde minha filha bate não nasce cabelo'

Beatriz Ferreira prepara a pedrada para a final do boxe nos Jogos Olímpicos de Tóquio - Miriam Jeske/COB
Beatriz Ferreira prepara a pedrada para a final do boxe nos Jogos Olímpicos de Tóquio Imagem: Miriam Jeske/COB

Roberto Salim

Colaboração para o UOL, em São Paulo

07/08/2021 12h00

Não chamem Raimundo Ferreira de Raimundo Ferreira. Ele não vai atender. Desde que começou a lutar boxe como peso galo no ginásio Balbininho, em Salvador, ele mudou de nome para Sergipe. E é Beatriz Ferreira, filha deste ex-lutador, que vai entrar no ringue armado no Ryogoku Kokugikan para disputar às 2h da madrugada a medalha de ouro contra a irlandesa Kellie Harrington, na categoria 60 quilos do boxe nos Jogos Olímpicos de Tóquio.

"Eu era novato e tinha um estilo muito brigador. E então a torcida falava: 'briguento e com uma cabeçona dessas, esse moleque só pode ser sergipano'. E o apelido pegou. Foi aí que eu, mesmo nascido na capital baiana, virei Sergipe, sparring de Popó, campeão baiano e depois treinador", conta Sergipe.

O treinador já tem a receita para ver a filha campeã dos Jogos Olímpicos de Tóquio. "A adversária é mais alta e é canhota, mas depois de levar a primeira pedrada da Bia, ela vai se recolher, com certeza. Onde minha filha bate não nasce cabelo", garante o pai de Bia, campeã do mundo no boxe, que forjou seus golpes lutando contra meninos na garagem de sua casa onde o pai treinava nos fins de semana em Salvador.

"Eu já passei a ela por telefone a tática para vencer a final olímpica", afirma Sergipe, depois de dar aulas na tarde de sexta-feira, na academia em que trabalha na cidade de Juiz de Fora, em Minas Gerais. "Estudei duas lutas da adversária e sei que ela não vem para a troca de golpes. Ela tem mais envergadura que minha filha, é canhota e gosta de soltar jabs. Mas não vai complicar não a vida da Bia".

Sergipe revela que a mais velha de suas três filhas aprendeu desde pequena a se adaptar ao tipo de combate que deve ser feito. "Neste caso contra a irlandesa, é cercar e jogar na curta distância. A Bia sabe muito bem brigar com quem bate e foge. E então, acertando duas pedradas na adversária, é só pressionar que a vitória vem. E digo mais: se a irlandesa sair para a luta franca, vai ser pior ainda para ela. Perde mais rapidamente".

O técnico está confiante, embora o coração de pai esteja a mil por hora. "Fico pensando que ela vai trazer o ouro. Ela que já conhece 26 países e tem conquistas em 25. Minha filha é uma atleta completa. Tem mão pesada e como eu já disse os golpes dela são verdadeiras pedradas. Golpes que ela aprendeu desde pequena".

Quando começou a treinar, ainda garotinha, Bia não tinha adversária mulher. Então, seu pai a colocava contra os meninos mesmo. Era só escutar o barulho dos exercícios do boxe na garagem da casa que ela descia as escadas e entrava na luta. Não queria brincar de outra coisa.

"Eles até procuravam aliviar quando soltavam golpes, mas quando sentiam o peso das mãos da minha filha, os meninos ficavam bravos e queriam devolver, só que ela esquivava e batia mais ainda".

Bia ficou nos treinos durante muito tempo e só foi lutar mesmo anos depois, quando surpreendeu o mundo do boxe nacional com a potência de seus golpes. Nos Jogos Olímpicos do Rio-2016, ela serviu de sparring para a medalhista Adriana Araújo e depois não saiu mais da seleção nacional.

"Ganhou o ouro no Pan, no Mundial, é a número 1 do ranking e agora vai me trazer a mãe de todas as medalhas. Vai ser meu presente no Dia dos Pais. Tem presente melhor?", pergunta Sergipe.