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OPINIÃO

Ohayo Tóquio é surpresa positiva, e formato merece ficar na grade do SporTV

Marcelo Barreto e Bernardinho apresentam o "Ohayo Tóquio", no SporTV - Globo/João Cotta
Marcelo Barreto e Bernardinho apresentam o 'Ohayo Tóquio', no SporTV Imagem: Globo/João Cotta

Patrick Mesquita

Do UOL, em São Paulo

09/08/2021 04h00

O fim dos Jogos Olímpicos deixará um vazio no coração de quase todo brasileiro que gosta de esportes. Vai ser difícil acordar (ou ficar sem dormir), ligar a televisão e notar que não tem nenhuma disputa em andamento. Além das competições, um programa fará falta na grade esportiva: o Ohayo Tóquio, atração diária do SporTV dedicada a analisar as Olimpíadas.

Acertar a mão em um programa esportivo é um grande desafio para qualquer emissora de TV, ainda mais quando é algo temporário, que vai durar pouco mais do que 15 dias. Não há muito espaço para erro, para recalcular a direção. O desafio foi superado sem muitos traumas pelo canal fechado do Grupo Globo.

Foram muitos acertos ao longo da jornada olímpica. O primeiro ponto positivo foi a escolha no comando da atração, que teve Marcelo Barreto e Bernardinho como responsáveis pela condução.

O apresentador conseguiu conduzir com um misto de leveza, bom humor e informação. Acima de tudo, Barreto não tentou em momento algum brilhar mais do que o estrelado time de ex-atletas e comentaristas convidados -- um equilíbrio cada vez mais difícil de encontrar nos programas esportivos que estamos acostumados a acompanhar, principalmente quando o tema é futebol.

Já a presença de Bernardinho deu brilho ao Ohayo. Foi no mínimo curioso ver um multicampeão comentando outras modalidades olímpicas. Afinal, o que o Bernardinho pensa sobre skate e surfe? Foi divertido e didático ouvir a opinião de uma autoridade esportiva. Claro, o treinador talvez não seja a pessoa mais sorridente do mundo, mas demonstrou bom humor ao longo do ciclo como comentarista -- um lado bem difícil de ser visto quando ele está na beira de uma quadra.

Apesar de uma certa dificuldade em concluir com clareza seus comentários, o técnico mostrou conhecimento profundo, principalmente na hora de falar sobre vôlei, e uma sabedoria digna de um dos maiores nomes do esporte nacional ao analisar outras modalidades.

Talvez, o maior acerto tenha sido a presença de ex-atletas como comentaristas. Foram verdadeiras aulas técnicas ministradas por quem brilhou nas mais variadas modalidades. A escolha foi certeira e deu ao telespectador a chance de aprender mais sobre ginástica, basquete, boxe, vôlei e tudo o que rolou nas Olimpíadas.

Ver Daiane dos Santos explicar os pontos positivos e negativos das apresentações de ginástica ou César Cielo e Joanna Maranhão dando detalhes técnicos sobre natação, como a respiração dos atletas na piscina, foi um presente para um país que passa a maior parte do tempo falando quase que exclusivamente sobre futebol. Hortência e Claudinei Quirino também deram shows de conhecimento.

O programa também teve doses de emoção, principalmente com o ex-boxeador Acelino "Popó" Freitas, que chorou ao lembrar a luta do primeiro título mundial.

Outro ponto positivo foi a mistura entre jornalistas e ex-atletas. As participações de nomes como Marcos Uchôa, Karine Alves e Renata Mendonça ajudaram a guiar o programa para linhas mais informativas, o que facilitou os comentários dos ex-atletas. As projeções de medalhas feitas por Guilherme Costa também contribuíram para ditar o rumo do programa.

Acima de tudo, as presenças dos jornalistas fizeram com que o programa não ficasse distante de temas que precisam ser debatidos na sociedade. E foi neste ponto que o Ohayo tropeçou em algumas oportunidades.

Como a base e essência do programa estava baseada nas análises de ex-atletas, foi notável a dificuldade deles em abordar temas mais fortes. Foi visível o desconforto de Bernardinho para analisar a participação da levantadora de peso transgênero Laurel Hubbard nos Jogos. O técnico não conseguiu ser tão claro em seu raciocínio sobre o tema e voltou a explicar que não foi transfóbico com a jogadora de vôlei Tiffany, transexual, em uma polêmica que aconteceu em 2019. Já a ex-jogadora de vôlei Fabi Alvim foi mais firme em seu posicionamento ao dizer que o debate é profundo e precisa de sensibilidade para não disseminar ódio e preconceito.

O mesmo "desconcerto" se repetiu quando a atração abordou a potencial violação de regra antidopagem de Tandara, do vôlei, que Bernardinho praticamente não opinou. Aqui podemos dizer que foram "descontados pontos" e que podem ser corrigidos caso o canal decida investir novamente no formato.

O Ohayo Tóquio não foi perfeito, mas apresentou uma proposta diferente daquelas que o brasileiro está acostumado a ver na TV. A atração surpreendeu de forma positiva, e o formato merece continuar na programação do SporTV, com a necessidade de algumas adaptações, começando pelo nome. Há mais espaço para análises de todos os esportes olímpicos, e isso ficará ainda mais evidente a partir de hoje, quando a grade esportiva voltará a ser dominada por discussões sobre futebol, uso do VAR e demissões de técnicos.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL