Ouro de Ana Marcela teve inspiração em Cielo, Fratus e bilhetes da namorada
Eles estão no pensamento dela sempre que entra na reta final dos 10km. Ana Marcela Cunha costuma dizer que ali, nos últimos 50m, a maratona aquática vira prova de velocidade mesmo depois de quase 2h e é preciso ativar o modo Cesar Cielo e Bruno Fratus para não deixar uma medalha escapar. Nas Olimpíadas de Tóquio, a divisão perfeita, que foi seguida à risca, não a fez ser ameaçada pelas adversárias, mas ainda assim os dois velocistas tiveram participação na construção do ouro. Cada um à sua maneira.
Foi num telão do aeroporto de Pequim que Ana Marcela viu Cielo se tornar o nadador mais rápido dos 50m livre naquela edição dos Jogos Olímpicos de 2008. Aos 16 anos, a também caloura olímpica decidiu ali que um dia experimentaria aquela sensação.
"Em 2004 eu tinha 12 anos, era muito nova e não acompanhei muito, sabe? Nunca tinha visto uma Olimpíada da forma como vi e vivi quatro anos depois. Então, aquilo que ele fez foi marcante para mim. Foi no dia que entrei na Vila e pude acompanhar a conquista dele lá. Aquilo ficou na minha cabeça", admite.
Mas o caminho não foi nada tranquilo. Se viu fora de Londres-2012 por uma posição. Chegou à Rio-2016 como favorita, mas problemas de alimentação durante o percurso a deixaram longe de um dos degraus. Foi um baque, mas resolveu se dar mais uma chance e encontrou em Bruno Fratus uma inspiração.
Assim como ela, o atleta tinha sofrido reveses duros. Por dois centésimos, viu o bronze escapar por entre os dedos nos 50m livre em Londres-2012. Quatro anos mais tarde, era tido como uma medalha certa, mas amargou o sexto lugar. Depois dali, ela teve de ser submetida a uma cirurgia de retirada do baço por conta de uma doença autoimune. Ele entrou em depressão e também precisou operar o ombro. Enfrentaram outros contratempos, mas ainda assim se recusaram a desistir. A única certeza que tinham era de que não poderiam deixar para fazer isso em Paris-2024. Na próxima edição, Ana terá 32 anos e Bruno 35. A hora era agora.
"Eu me inspirei desta vez em atletas que não conquistaram medalha e tentaram de novo. Fratus tinha batido na trave. Nesse último ciclo nós tivemos muito contato. Ele passou uma época morando no Rio e treinando comigo no Parque Aquático Maria Lenk. E eu vi o que ele estava fazendo, o quanto ele estava trabalhando. A gente estava na mesma pegada. Conversávamos muito, brincávamos e aquilo tornava mais leve o ambiente. Era um incentivo porque mesmo cansados, a gente estava se entregando no treino seguinte, os dois com o mesmo objetivo, com a mesma obstinação."
E com o mesmo final feliz. Ambos voltaram para casa carregando o objeto que mais cobiçavam na vida. Quando ele chorou com o bronze nas mãos, ela esperava sua vez de enfrentar as águas quentes do Odaiba Marine Park, que chegaram aos 29,3ºC na largada.
Nada nem ninguém chegou perto de ameaçar a vitória de Ana Marcela. A prova, definida por ela como perfeita, não exigiu o "sprint final louco, quando você reza para a chegada chegar logo". Tudo estava sob controle. Mas, ela garante que se recebesse o ataque de alguma adversária, tinha fôlego e velocidade de sobra.
Tinha foco. Deixou de dar entrevistas por dois meses, se isolou, sumiu um tempo das redes sociais. Tinha em mente o pensamento que passou a exercitar desde que iniciou acompanhamento psicológico - após a decepção no Mundial de Xangai, em 2011: o ruim não vai se repetir, o bom pode vir de novo.
"Tudo o que acontece tem que ter sempre um lado bom. É isso que eu tento fazer, evito pensar nas coisas ruins. E a hora boa chegou. Eu me blindei muito", conta Ana Marcela.
Para cada um dos 63 dias que passou fora do Brasil, Ana Marcela incluiu na rotina abrir um potinho e pegar um dos 63 bilhetes feitos pela namorada, Maria Clara Fontoura. A escolha era aleatória, mas encaixava perfeitamente aos momentos que estava vivendo.
"Foi muito louco! O do dia depois da medalha foi algo como 'já deu certo'. E o de dia seguinte foi o desenho do pódio comigo em primeiro lugar. Quando eu estava no treinamento em altitude, tirei um escrito 'Estamos com você. Você tem força'. Tudo se encaixava... E deu tudo certo. Estou muito feliz!".
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