Rebeca Andrade celebra 'pretos no topo' e fala em inspiração em Viola Davis
Rebeca Andrade não está saindo das Olimpíadas de Paris "somente" com quatro medalhas e como a brasileira mais condecorada da história dos Jogos. Receber o reconhecimento de grandes ícones mundiais pretos está mostrando a ela o tamanho das conquistas de alguém que desafiou - e, no solo, bateu - aquela que é considerada uma das maiores atletas dentre todas as modalidades nestes Jogos, Simone Biles. Quando ela diz que sai "grandona" de Paris, ela não está para brincadeira.
Perguntada pelo UOL sobre as mensagens que recebeu desde o fim das competições, Rebeca revelou que um comentário em especial lhe encheu de orgulho.
"Sempre que eu vejo alguma postagem eu fico emocionada, porque a gente sabe como é difícil chegar nesse patamar e tudo que a gente precisou fazer para chegar até aqui, para que hoje essas pessoas também pudessem me reconhecer, não só o meu país, mas o mundo todo. Quando eu vi a postagem da Viola eu fiquei maluca, eu falei, 'meu Deus do céu, a mulher, gente, ela sabe quem eu sou, olha isso!'. Eu fiquei louca, juro, eu fiquei muito feliz, porque eu senti que ela sentia orgulho de mim e eu também me orgulho muito dela por ser quem ela é", contou Rebeca.
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A atriz tem como missão mudar a maneira como as mulheres pretas são vistas, e isso também é muito importante para a ginasta brasileira.
"Me inspira bastante também a forma como ela se posiciona, as coisas como ela fala, como ela age, é algo que pra mim é muito incrível e não tem o que falar, assim, eles são maravilhosos e hoje eu estou entrando, assim, nesse mundo que é o deles também, com referências fortíssimas, com pessoas de potência máxima, então realmente é um orgulho."
Mas não é só o apoio de celebridades internacionais que ajuda a motivar a brasileira, que diz perceber que as pessoas em geral sentem orgulho dela ocupar esse espaço de destaque independentemente do resultado. "Eu acho que os pretos sempre mostraram a sua capacidade, mas essa Olimpíada tá sendo uma Olimpíada que tá tendo muito mais visibilidade. A gente conseguiu mostrar, sim, que a gente pode avançar, que a gente pode chegar. E ser uma mulher preta no Brasil é algo que me orgulha muito, e que as pessoas também sempre mostram orgulho, independente do meu resultado. Isso pra mim foi algo que mudou minha forma de viver, minha forma até mesmo de competir", disse Rebeca.
A ginasta destacou ainda como a maneira como sua mãe, Rosa, que a acompanhou em Paris pela primeira vez em uma competição internacional, foi importante para ela pensar dessa forma.
"Eu nunca vi a minha cor como algo que fosse me impedir de realizar as minhas coisas, mas isso foi algo que me foi ensinado dentro de casa. Minha mãe é uma mulher branca que criou oito filhos pretos, então ela sempre se posicionou da melhor maneira possível e ensinou a gente a nunca abaixar a nossa cabeça quando alguém fala alguma coisa ou faz alguma coisa com a gente, por causa da nossa cor. Então eu sempre fui muito forte, e eu acho que pelo fato de eu não ter pensado tanto nisso, foi o que me fez continuar acreditando que da minha maneira também iria acontecer."
Racismo tem que acabar, diz Rebeca
A maior medalhista da história do Brasil em Olimpíadas falou ainda da dor de viver episódios de racismo com seus irmãos. "Eu nunca passei por momentos ruins dentro do esporte relacionado à minha cor, mas os meus irmãos já passaram, e às vezes eu acho que me dói até mais do que se tivesse sido comigo, porque é muito mais difícil quando você vê alguém que você ama passando por uma situação complicada como racismo. Isso tem que acabar, a gente não pode aceitar, e as pessoas também vão ter que ver que a gente vai estar no topo sim, é preto no topo e pronto."
Embora Rebeca explique que não viveu episódios de racismo dentro do esporte, isso não quer dizer que ela não tenha convivido com comentários negativos duvidando de sua capacidade. A ginasta passou por três cirurgias no joelho, a última delas antes dos Jogos de Tóquio.
"Talvez se eu tivesse escutado comentários de internet das vezes que eu tive as minhas lesões e estivesse desistindo, eu estaria chorando agora, muito de cara, sem saber quem eu seria, porque eu realmente teria desistido não por mim, mas por comentários de pessoas. Ter uma rede de apoio é muito importante, porque por mais que você esteja em um momento ruim, quando você tem uma luz no fim do túnel, você continua acreditando, e aquela luz vai ficando cada vez mais clara. Para mim é uma honra ser mulher, ser mulher preta, e hoje estar no topo do mundo."