Snoop Dogg, protesto e muito estilo: o dia em que o breaking virou olímpico
De olhos fechados, sob uma garoa fina e vestindo apenas uma das mangas de um casaco cinza, a japonesa Ami Yuasa, 25 anos, estava imersa em um mundo à parte. Quase em câmera lenta, ela ensaiava movimentos a instantes de subir ao palco da Place de la Concorde, no primeiro dia da história do breaking como esporte olímpico.
O ritmo era tão cadenciado que os brincos triangulares pouco se mexiam. Ami estava em uma área reservada aos atletas. As adversárias passavam ao lado. Algumas olhavam com curiosidade, outras sorriam. Quando ela apareceu diante do público, no coração de Paris, a arena explodiu em aplausos.
Cinco horas depois, com o casaco cinza vestido nos dois braços, Ami ganharia a primeira medalha de ouro da história do breaking nos Jogos Olímpicos.
Há quem diga que a novidade, colocada pelo Comitê Olímpico Internacional na programação para atrair um público mais jovem, é uma dança; há quem defenda que é um esporte. Outros dizem que é a mistura perfeita entre os dois.
O debate vai longe. Mas não dá pra negar que o primeiro dia olímpico do breaking teve estilo. Em sua estreia, aliás, teve algo que nem os esportes mais nobres tiveram: o rapper Snoop Dogg abrindo os trabalhos.
Sentado em posição de destaque, ao som de hip hop e com animadores que agitavam o público a cada duelo, o astro norte-americano viu de perto o início da disputa da categoria feminina, em que 17 "B-Girls" entraram em cena.
Início com protesto
Se a ideia do COI era dar um clima mais moderno aos Jogos com um esporte de estilo urbano e um certo tom de rebeldia, deu certo. A arena estava lotada, e quem caminhava pelo grande parque esportivo em que a Place de La Concorde se transformou, se espremia para ver a disputa onde dava.
As arenas do skate street e park, que ficam ao lado e têm telões, foram usadas por quem queria acompanhar a disputa.
Logo na primeira batalha, um momento emocionante: a afegã Talash, competindo pela delegação de Refugiados Olímpicos, mostrou uma bandeira com a frase "Libertem as mulheres do Afeganistão".
Ela fugiu do país em 2022, devido às restrições impostas pelo regime do Talibã às mulheres do país. O local onde ela treinava foi destruído. Desde que saiu do país-natal, Talash vive em Madri, na Espanha.
Batalhas e estilo
Para quem passou os últimos dias acompanhando esportes com pontuações complexas, notas baseadas em critérios quase incompreensíveis, o breaking é mais fácil do que parece: duas competidoras — no caso de sexta-feira — entram no palco juntas. Elas se apresentam separadamente, em duas ou três rodadas (dependendo da fase da competição), diante de nove jurados.
A tarefa dos juízes é simples: votar em quem foi melhor a cada apresentação. Cada voto vale um ponto, e quem tiver mais pontos vence a batalha.
Nas apresentações, as competidoras também interagem com o público, provocam as adversárias e mostram o seu estilo próprio — que atrai fãs em uma comunidade que cresceu muito nos últimos anos.
"O breaking não era muito popular na China. Mas depois que comecei a ganhar títulos em campeonatos internacionais, começou a crescer", comemora Liu Qingyi, mais conhecida como 671, medalhista de bronze em Paris.
A lituana Nicka, medalhista de prata, resumiu a sensação de quem estava na Place de La Concorde: "As Olimpíadas precisam do breaking. É uma brisa de ar fresco. Hoje, o mundo viu o quanto o breaking é grande".
Para a campeã, Ami, tão importante quanto ganhar o ouro, era mostrar o seu estilo. Para elas, o breaking é uma forma de expressão. "Eu foquei no meu estilo, em me expressar. Muitas pessoas sabem fazer movimentos incríveis no breaking. Para mim, o mais importante são os detalhes. Quando as coisas pequenas se conectam, elas se tornam grandes".
Quem viu Ami, sozinha, treinando os movimentos com os olhos fechados, sabe o que ela diz. E quem viu uma multidão de jovens, sob o comando de Snoop Dogg, vibrar com as "B-Girls" na sexta-feira, já entendeu: seja esporte, seja dança ou uma mistura de ambos, o breaking colocou os dois pés nas Olimpíadas.
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