Ele virou arqueiro durante pós-doutorado e estreia em Paralimpíadas aos 64
"Desistir não é uma opção." A frase está em um dos vídeos com mensagens motivacionais em uma rede social de Eugênio Franco. Aos 64 anos, o arqueiro está prestes a fazer a estreia nos Jogos Paralímpicos, sonho antigo e que teve justamente Paris como contribuição para a semente ser plantada.
Certa vez, vi pela televisão uma competição de tiro com arco que acontecia em Paris. Naquele dia, e isso faz mais de 10 anos, eu tive vontade de participar dos grandes torneios e das Paralimpíadas. Agora, coincidentemente ou não, em Paris, chegou a oportunidade. Era algo que almejava e consegui, acho que, devido à perseverança que tive Eugênio Franco
Eugênio conheceu o tiro com arco há quase 20 anos, durante o inverno europeu, quando morava em Portugal. Enfermeiro de formação e com especialização em enfermagem obstétrica e patologia tropical, fez pós-doutorado na Escola Superior de Saúde da Universidade de Aveiro. Ele trabalhou com pesquisa voltada ao câncer do colo de útero e tecnologias para a saúde.
"Durante o inverno, era muito frio e não havia muitas opções de atividades. Havia o tiro com arco em um ginásio, indoor. Fui experimentar e me apaixonei pelo esporte", lembra.
Em 2009, ele apresentou sintomas de espondilite anquilosante, que é um "tipo de inflamação que afeta os tecidos conjuntivos, caracterizando-se pela inflamação das articulações da coluna e das grandes articulações, como quadris, ombros e outras regiões", segundo a Fiocruz.
"Surgiu de forma insidiosa. Um dia eu acordei e estava com uma dor muito grande na região lombar. Essa dor se prolongou por alguns dias, não passava com nenhum medicamento. Melhorava com exercício, piorava com repouso. Tinha uma ideia que poderia ser uma doença de fundo reumático ou imunológica. Procurei atendimento especializado, e os exames foram confirmando que se tratava da espondilite anquilosante, mas ainda assim demoraram alguns anos para que o diagnóstico fosse fechado", relata.
A demora para que se chegasse a uma conclusão sobre a doença retardou o início do tratamento e teve consequências para Eugênio. "Causou atraso na utilização de alguns medicamentos que param ou retardam a progressão da doença. Então, tive algumas sequelas importantes. Afetou não só a coluna, mas também outras articulações. Quadril, joelho, mãos, braços... Foi um período difícil porque não sabia onde isso ia terminar."
Mas sempre tive muito ânimo e entendi que todas essas coisas fazem parte da vida. Consegui encarar com naturalidade. Uma pessoa que era saudável, a partir de um determinado momento adquiriu uma doença crônica e, agora, é conviver com ela da melhor forma possível Eugênio
Em 2011, fez a transição do esporte dito tradicional para o paralímpico. A evolução da patologia foi acompanhada por outras doenças, como hipertensão arterial, diabetes tipo II, artrose avançada nos membros inferiores. Em 2016, outro duro diagnóstico: Doença de Parkinson.
"O diagnóstico de Parkinson foi um pouco mais complicado porque já havia diabetes, hipertensão e a espondilite anquilosante e era preciso entender como ia acontecer a progressão da doença. Graças a Deus, a doença tem progredido de forma relativamente lenta por conta dos cuidados e medicações, do cuidado físico e alimentação. Ela afetou o equilíbrio e algumas atividades."
Eugênio teve de fazer algumas adaptações na prática do tiro com arco. "Desde o uso do talher, outras coisas, abotoar um botão de uma camisa, tudo requer uma adaptação. Depois de algum tempo, você faz com muito mais naturalidade. Foi assim para algumas coisas do tiro com arco. Por exemplo, colocar flecha do arco para mim é uma dificuldade, e foi autorizado um auxiliar para que possa fazer."
A família está muito feliz porque sempre me apoiou e sabe que era um desejo meu participar das Paralimpíadas
A vaga olímpica
Eugênio carimbou a vaga para as Paralimpíadas de Paris ao conquistar o ouro nos Jogos Paralímpicos de Santiago, no ano passado. À época, aos 63 anos, ele era o mais velho de toda a delegação brasileira. O topo do pódio no individual W1 foi inédito para o Brasil.
O que trouxe de especial na minha mala para Paris? Na verdade, não é na mala, é no coração. Trouxe muita fé, gratidão a Deus por estar tendo essa oportunidade e também uma esperança muito grande de poder proporcionar uma alegria para todas aquelas pessoas que torcem por mim Eugênio Franco
O arqueiro enaltece a boa relação que sempre teve com os mais jovens. "Fui professor universitário durante bastante tempo e sempre gostei dessa convivência com as pessoas mais jovens. Sempre achei muito importante essa troca de experiências e de momentos de vida."
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