Dos shows inclusivos à 'revolução': a abertura das Paralimpíadas de Paris
Alexandre Araújo e Caio Bitencourt
Do UOL, no Rio de Janeiro (RJ) e São Paulo (SP)
28/08/2024 18h42
Os Jogos Paralímpicos de Paris estão, oficialmente, abertos. A cerimônia, que aconteceu na tarde desta quarta-feira (28), seguiu as Olimpíadas e também teve um formato inédito. Pela primeira vez, não foi realizada em um estádio, e o desfile dos atletas partiu da Champs-Élysées até a Praça da Concórdia. O evento teve tom forte no que diz respeito à inclusão de pessoas com deficiência — e muitos artistas com tais condições participaram dos shows.
Tony Estanguet, presidente do Comitê Organizador dos Jogos, e Andrew Parsons, presidente do Comitê Paralímpico Internacional, citaram "revolução paralímpica" e que os atletas querem "alcançar algo maior que a glória pessoal: desejam igualdade e inclusão".
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Um coletivo de 12 atletas, medalhistas paralímpicos e de diversas nacionalidades, fez um revezamento e levou a chama olímpica à pira em formato de balão. A primeira parte desta caminhada foi ao som de "Bolero", do francês Maurice Ravel.
A cerimônia aconteceu sob bom tempo e os presentes puderam ver até o pôr do sol, um contraste com o temporal da abertura das Olimpíadas.
Shows e pirotecnia
O canadense Chilly Gonzales abriu a festa. O pianista esteve acompanhado de 140 dançarinos e artistas, alguns com deficiências. O ato era baseado no "paradoxo", mostrando que uma sociedade que se diz inclusiva e ainda encontra muitos obstáculos para as pessoas com deficiência.
Durante a apresentação, Théo Curin, nadador e apresentador de TV francês, chegou em um carro com inúmeras Friges, mascotes paralímpicos. Ele, que participou dos Jogos Paralímpicos Rio 2016, é amputado das duas mãos e duas pernas, consequência de uma forte meningite quando tinha 6 anos.
Pouco depois, Christine and the Queens prestou homenagem a Edith Piaf. O francês apresentou uma versão da canção "Non, je ne regrette rien". Uma das mais consagradas artistas da França, Piaf já tinha sido lembrada nas Olimpíadas, em representação feita por Celine Dion.
A patrulha francesa coloriu o céu de Paris de azul, branca e vermelha. Após a contagem regressiva, houve um show pirotécnico com as cores em referência à bandeira da França. As Phryges, mascotes das Paralimpíadas, foram ao palco para dar as boas-vindas aos atletas.
Após os desfiles, Lucky Love cantou "My Ability", acompanhada por dançarinos. O cantor francês não tem o braço esquerdo. Depois que Emmanuel Macron, presidente da França, declarou os Jogos abertos, o corpo de bailarinos voltou ao palco, em uma apresentação toda coreografada. Houve a representação de grupos que superaram as diferenças e indicaram uma visão de uma competição nova e inclusiva onde a unidade e a igualdade têm sucesso.
Desfiles
A passagem das delegações foi embalada pelo DJ Myd. Os desfiles obedeceram à ordem alfabética, considerando a escrita em francês. Os primeiros países a entrar na Praça para a apresentação foram Afeganistão, África do Sul, Argélia, Alemanha, Angola, Arábia Saudita e Argentina. Uma curiosidade é que, diferentemente dos Jogos Olímpicos, a Grécia não abre esta etapa da cerimônia porque não foi o berço das Paralimpíadas.
"Trabalhamos muito para estar aqui. É a realização de um sonho. O ciclo paralímpico é formado por vários atos e os Jogos são o ato final. Eu fico emocionada, porque a gente deixa um marco na história do Brasil e do Movimento Paralímpico. Está tudo muito lindo", disse a nadadora cearense Edênia Garcia, da classe S3, ao site do CPB. Ela nasceu com doença de Charcot-Marie-Tooth, também conhecida como atrofia fibular muscular.
A delegação brasileira foi bastante festejada. Beth Gomes, do atletismo, e Gabriel Araújo, da natação, foram os porta-bandeiras brasileiros. O Brasil será representado em Paris por 280 atletas, sendo 255 com deficiência, de 20 modalidades. Essa é a maior delegação em uma edição dos Jogos fora do Brasil — no Rio-2016 foram 278 atletas em todas as 22 modalidades.
Austrália e Estados Unidos, sedes dos Jogos de 2032 e 2028, respectivamente, entraram na Praça pouco antes da França. A delegação da dona da casa foi recepcionada ao som de "Les Champs-Élysées", de Joe Dassin. Depois, o público cantou "Que Je T'Aime", música de Johnny Hallyday.
Depoimentos
Após os desfiles das delegações, foram apresentados depoimentos de pessoas com deficiência em um telão no local. Elas narraram suas respectivas caminhadas, com passagens de aceitar as condições até recuperar o orgulho e confiança. O vídeo foi bastante aplaudido pelos presentes.
'Revolução Paralímpica'
Tony Estanguet, presidente do Comitê Organizador dos Jogos Paris-2024, citou 'revolução paralímpica' no discurso. "Bem-vindos ao país do amor e da revolução. Fiquem tranquilos: hoje, nada de tomada da Bastilha ou de guilhotina, pois começa hoje a mais bela das revoluções, a revolução paralímpica. Desta vez, os revolucionários são vocês, atletas. Vocês têm estilo e audácia. Como os revolucionários do mundo inteiro, têm coragem e determinação. Vocês lutam por uma causa maior que vocês, mas as suas armas são o desempenho, os recordes, as emoções do esporte. Vocês, um dia, ouviram uma lista de tudo que não poderia fazer, até que cruzaram a porta de um clube esportivo".
Andrew Parsons, presidente do Comitê Paralímpico Internacional, acompanhou o tom usado por Estanguet. "Sejam bem-vindos ao evento mais transformador da terra. (...) Aqui, nos Jogos de Paris, vamos celebrar aquilo que nos torna diferentes, mostrar que há força, beleza na diferença, e constitui força poderosa para o bem. (...) Convido a todos a abrir as mentes. O que vocês vão ver dos atletas paralímpicos são habilidades que vão surpreender. Estão aqui para alcançar algo maior que a glória pessoal: desejam igualdade e inclusão para si e 1,3 bilhão de pessoas com deficiências no mundo".
Revezamento para a pira
No fim da cerimônia, um coletivo de 12 atletas, todos medalhistas paralímpicos e de diversas nacionalidades, levaram a chama olímpica até a pira. Eles foram acompanhados por mais de 150 dançarinos e artistas carregando tochas ao som de "Bolero", do compositor francês Maurice Ravel.
A trajetória começou com Michael Jeremiasz, ex-jogador de tênis em cadeira de rodas, e passou por nomes como Beatriz Vio, esgrimista italiana, Oksana Masters, dos Estados Unidos, o alemão, Markus Rehm, a francesa Assia El Hannouni, e os também franceses Christian Lachaud, Béatrice Hess, Alexis Hanquinquant e Nantenin Keïta. A pira também foi o balão, como já tinha acontecido nas Olimpíadas.
Antes da abertura, quem desfilou com a chama olímpica foi Jackie Chan. O ator assumiu na rua Vieille du Temple, em Paris, horas antes do começo da cerimônia.
'Parastronauta' levou bandeira
O britânico John McFall levou a bandeira paralímpica para ser hasteada. Medalhista de bronze nos 100 metros T42, nas Paralimpíadas de Pequim-2008, pode em breve ser a primeira pessoa com deficiência a ir ao espaço.
Após deixar o espaço, McFall começou a trabalhar como cirurgião de trauma e ortopedista. Ele se tornou "parastronauta" em 2022, quando a Agência Espacial Europeia anunciou nova turma de astronautas em treinamento. "A ESA tem o compromisso de enviar ao espaço um astronauta com deficiência física. É a primeira vez que uma agência se esforça para se aventurar em um projeto desse porte. E envia uma mensagem muito, muito forte para a humanidade", disse ele, à época.