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Atleta treina em sauna para prova de 217 km em deserto da Califórnia

Ultramaratonista Carla Goulart treina em sauna para encarar corrida no deserto - Arquivo Pessoal
Ultramaratonista Carla Goulart treina em sauna para encarar corrida no deserto Imagem: Arquivo Pessoal

Felipe Pereira

Do UOL, em São Paulo

16/07/2014 06h00

Recentemente, Carla Goulart, 38 anos, correu 100 quilômetros, nada mais que um treinamento. O verdadeiro desafio é a Ultramaratona Badwater, com 217 quilômetros de extensão e realizada num deserto da Califórnia. No melhor cenário, ela passará 30 horas correndo numa temperatura que beira os 60 graus e com umidade do ar que não passa de 4%.

Para enfrentar condições tão extremas, Carla inclui na preparação treinamentos em uma câmara de adaptação com temperatura de 55 graus. O equipamento começou a ser usado há um mês em sessões de uma hora. Com a proximidade da ultramaratona que inicia na segunda-feira (21), a intensidade aumentou.

Na última semana, foram seis dias de treino com duas horas e meia de duração. “O mais importante é ficar ali para o organismo acostumar com a temperatura. Não importa se correndo, pulando corda ou fazendo agachamento”. O equipamento fica na UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e é usado para pesquisas e treinamento de atletas de alta performance.

Mas a ultramaratonista ressalta que a câmara de adaptação não resulta somente em ganhos físicos, mas também mentais. Ela explica que é necessário força de vontade para completar o treinamento e isto é crucial para prova. Carla diz que numa ultramaratona precisa lidar com dor, cansaço, roupa molhada e fedida, sono. Ela prevê um cenário bem complicado para Badwater, que se intitula a prova mais difícil do mundo.

“Vai ter muitas bolhas nos pés porque o asfalto é muito quente. E sou muito clara e o sol me incomoda. Trabalho a mente dizendo gosto do sol, gosto do deserto para tudo ficar tranquilo”.

O ambiente a ser encarado por Carla é dos mais inóspitos. Logo depois de o sol nascer a temperatura se aproxima dos 40 graus e só faz subir. Respirar é complicado e como todo cenário de deserto quase não há vegetação. O asfalto leva a montanhas.

A Badwater começa a 85 metros abaixo do nível do mar e termina em 2,3 mil metros de altitude. Encarar condições tão adversas exige muito do corpo e pode ser perigoso conta Ismael Forte Freitas Junior, professor de Composição Corporal relacionada a Atividade Física e Saúde na Unesp (Universidade Estadual Paulista).

Ele declara que o ambiente sobrecarrega o sistema cardiorrespiratório que trabalha para manter a temperatura do organismo em 36,5 graus. A situação se complica ainda mais por causa da baixa umidade, que leva à excessiva perda de líquidos. O professor explica que o organismo é 60% composto de água que precisa ser expelida para diminuir o calor.

Neste processo, os batimentos cardíacos sobem para um nível muito além do normal. A temperatura alta aliada a perda de líquido pode derrubar a pressão arterial e causar um mal súbito. Por este motivo, sugere a ingestão de até 300 ml de líquido a cada quarto de hora, o limite da capacidade de absorção corporal.

Carla está atenta a estes perigos e já tem a estratégia traçada. A atleta vai comer em intervalos de duas horas e a cada hora consumir gel de carboidratos, whey protein, água e água de coco. Em caso de sentir necessidade, comerá banana. Ela não vai pular o almoço e macarrão a bolonhesa é uma opção.  Enquanto corre, mascará gengibre para evitar enjoo.

Se tudo ocorrer como a ultramaratonista espera, os 217 quilômetros serão vencidos em 30 horas. Para cumprir esta meta ela não pretende dormir. Caso algo saia do planejado o plano é terminar a prova em 35 horas. Num cenário com tudo dando errado o limite é  48 horas, tempo limite para ganhar o cinturão da prova.

Independente de como vai acabar a Badwater, Carla sabe que vai estar com muita dor nas pernas quando parar. “Estando bem treinado, na corrida você não sente. Mas depois quem disser que não sente é porque está anestesiado”.

Sensação conhecida por uma pessoa que não é nova em ultramaratonas. A atleta conta que completou a primeira maratona aos 19 anos e com o tempo percebeu que no final ainda tinha energia e vontade de correr mais. O sonho de Carla é correr mil milhas no Alaska. Claro que ela já ouviu que é louca, mas pensa bem diferente disso.

“Não sou louca, sou muito mais normal do que vocês porque correr 21 quilômetros (meia-maratona) dá para fazer colocando o coração. Mas na ultra-maratona tem que ter a mente muito forte.”