Hoje ele só quer paz

Radamés vence depressão, lamenta exposição em romance com a ex Viviane Araújo e acha tranquilidade em Brasília

Marinho Saldanha Do UOL, em Brasília (DF) Reprodução/Instagram

Aos 35 anos, Radamés olha para trás orgulhoso. Não apenas do que construiu ao longo da carreira, de ter se tornado jogador de futebol em um grande clube que aprendeu a amar, de ter conseguido uma situação confortável para família. Mas também pelas cicatrizes que o caminho deixou.

Seja no joelho direito, de uma cirurgia complicada ocasionada por uma lesão, ou na alma, em razão dos momentos de depressão da qual também escapou com a seriedade de quem se fez volante e zagueiro no campo.

Hoje, não é mais o menino visto como "playboyzinho do futebol" ou "modelinho", nas palavras do próprio. Revê esta fase com a segurança que os fios de barba branca que começam a nascer lhe deram. Entende que foi prejudicado pelo relacionamento público com a atriz Viviane Araújo. A coluna social não era o seu lugar.

Eis a seguir a história de Radamés Martins Rodrigues da Silva, que, em Brasília, finalmente encontrou a sua paz, com esposa, filhos e um novo clube.

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Sem dinheiro para o ônibus no começo

"Minha história não começou diferente de 99% dos jogadores de futebol. Acho que todos passaram por esses perrengues." Assim Radamés começou a contar sua trajetória ao UOL Esporte num encontro após treino do Brasiliense, clube que defende desde 2018 e com o qual tem vínculo até o fim do ano.

Mas a humildade com que trata seu princípio não o faz deixar de recordar tudo que aconteceu. E a mãe, Glaucia, foi pilar dessa história. Enquanto o pai trabalhava como caminhoneiro, era ela quem carregava o pequeno à rotina de treinos que abreviou a infância de um garoto de 10 anos, com restrições de custo de vida e de tempo.

"Muitas vezes não tínhamos dinheiro para o ônibus. Pedíamos emprestados para tios. Eu dizia que iria sozinho, mas minha mãe não queria que eu andasse o Rio de Janeiro todo sozinho de ônibus. Tinha vezes que tinha dinheiro para a passagem e não para o lanche. Comia um, o outro não. Teve uma vez que eu cismei que seríamos assaltados, mas minha mãe disse: 'filho, se descermos aqui, não temos dinheiro para seguir em outro ônibus'", contou.

Mas entre venda de pizza, picolé, rifa e empréstimos familiares, Radamés conseguia treinar futebol de campo em Xerém, futsal nas Laranjeiras e ainda estudar. Muito por força de Dona Glaucia. "Abdiquei da minha infância e adolescência. Carnaval, aniversário, férias, praia, não podia ir, tinha jogo. Mas valeu a pena demais. Minha mãe foi guerreira."

Foram 15 ou 16 anos de Fluminense, quatro anos no profissional. Vivi minha infância e adolescência no clube, se tornou meu clube do coração. Aprendi a torcer, amar, admirar. Minha formação, minha educação, além da minha família, devo ao Fluminense.

Radamés

Thiago Ribeiro/AGIF

"Adotado" por Abelão

Eis que o menino cresceu. O zelo da mãe foi ficando para trás a medida que os passos eram dados na base do Flu. E de lá veio a relação mais forte que teve no futebol, mais do que uma parceria, um pai no esporte: Abel Braga.

Foi Abelão quem deu a primeira chance para Radamés, quem o levou para atuar fora do país e conseguir seu primeiro contrato realmente bom. Tudo começou em um jogo contra o Volta Redonda, pelo Campeonato Carioca.

"Subiram vários jogadores porque o time já estava classificado, e o Abel queria descansar alguns jogadores. Eu fui bem na partida, e no final ele chegou para mim e falou: 'garoto, não precisa mais voltar para Xerém que amanhã você começa a treinar conosco'. Eu tinha 18 anos, não acreditava de tão feliz."

Abel firmou Radamés no time. Depois, quando treinou o Al-Jazira, levou o defensor para os Emirados Árabes. "É um cara que tenho uma das maiores gratidões no futebol. Me bancou, me dava confiança, me colocava para jogar. Até então eu não tinha ganho nada absurdo financeiramente, quando ele me levou foi realmente meu primeiro contrato bom, me abriu as portas fora do país, fiquei muito amigo dele e da família até hoje."

Estevam Avellar/TV Globo

Barrado no Irã por fotos sensuais de Viviane Araújo

Em 2014, Radamés estava prestes a receber sua segunda oportunidade fora do país. Mesmo que tivesse contrato firmado com o São Bernardo para disputa do Paulistão, uma oferta importante do Tractor Club, do Irã, tinha mudado os planos do defensor, que foi liberado pela equipe paulista. Mas ele não esperava que tivesse o visto permanente recusado por conta de fotos sensuais de Viviane Araújo, com quem tinha um relacionamento.

"O campeonato iria começar e estava perto de vencer o meu visto (provisório), e começaram a falar que o país não queria me dar o visto permanente. Tinha um brasileiro que jogava comigo lá, o Edinho, que falava a língua deles, o farsi. Ele disse que quando um jogador vai para lá fazem uma pesquisa profunda sobre ele, e quando fizeram isso apareceram fotos da minha esposa na época, que era uma pessoa pública, de biquíni, seminua, no Carnaval, e não quiseram dar meu visto permanente por isso, disseram que era antiético."

Barrado por causa fotos sensuais da atriz, Radamés fez um acordo, recebeu parte do pagamento do contrato e voltou ao Brasil. "É um país muito estranho, para tudo."

Divulgação / AgNews

Romance atrapalhou a carreira

E não foi apenas a chance no Irã que, para Radamés, foi influenciada pelo relacionamento que teve com a atriz Viviane Araújo. Mas, sim, a carreira toda foi pautada por isso. O atleta se confundiu com a figura pública e acabou sendo interpretado de forma equivocada.

"Algumas pessoas, fãs dela, acham que eu me dei bem no futebol por causa da Viviane. E foi o contrário. Eu sempre fui muito prejudicado por me relacionar com uma pessoa tão pública. Quem me conhecia sabia do meu profissionalismo. Eu não bebo, não faço noitada, mas tudo que eu fazia com a Viviane saía na coluna social. Era: Radamés foi a praia com Viviane, coluna social. Radamés foi na quadra do Salgueiro com Viviane, coluna social. Radamés foi visto passeando com cachorrinho e Viviane, levou a Viviane ao cinema... e começaram a achar que eu não queria jogar bola, era só vida social", contou.

"Todo mundo achava que meu extra-campo era um absurdo. Sinto que isso mais me prejudicou que ajudou. Depois que me conheciam, muitos treinadores diziam que estavam surpresos com meu profissionalismo. As pessoas não acreditavam em mim por isso, achavam que eu era aquele menino marrento, rostinho bonito no futebol, que namorava uma famosa", completou.

Radamés e Viviane ficaram juntos por dez anos. O relacionamento terminou em 2017.

É difícil eu me arrepender de algo que eu fiz. Mas pela forma que tudo acabou, teve processo, burocracia do término, bate um arrependimento, sim. Te confesso que bate. Quando a gente é moleque, querendo ou não se está envolvido, e no coração ninguém manda. As coisas vão acontecendo como tem ser. Mas hoje eu faria de outro jeito.

Radamés, sobre relacionamento com Viviane

Eu fazia tudo que qualquer atleta fazia, ou até menos, mas o que eu fazia aparecia. Em todo lugar tinha um papparazzi, praia, cinema, shopping, sempre. Começaram a confundir as coisas, duvidar do meu profissionalismo. Achavam que eu era 'playboyzinho', 'modelinho'... Isso prejudicou minha carreira, além das lesões que eu tive.

Radamés, sobre impacto na carrreira

Reprodução/Instagram

Lesão grave e depressão

Além da imagem criada a partir de seu relacionamento, Radamés também sofreu com lesões. A mais grave ocorreu quando ele defendia o Boa Esporte. O rompimento de todos os ligamentos do joelho direito deixou cicatrizes externas e internas.

Radamés viu sua cirurgia ser recusada por dois médicos. Apenas o especialista Vitor Favilla topou e adiantou que o caso era complexo. "Rada (apelido), sua lesão é muito grave. Nela, apenas 12% dos atletas conseguem voltar a jogar. Sua chance é bem pequena, mas farei o que eu puder", adiantou o médico, no relato do jogador. O prazo para regresso: de um ano a dois meses a um ano e meio.

Foi quando um novo inimigo surgiu. Depois do preconceito pelo relacionamento com uma famosa, foi a vez da depressão ameaçar Radamés.

"Eu só queria dormir, engordei 16 kg, ficava o dia todo em casa, dormindo, não queria fazer fisioterapia. Eu morava a duas quadras da praia, acordava com sol lindo, não queria descer, não queria correr, mergulhar, nada. Só queria ficar deitado no quarto escuro, me sentia muito triste. Nunca tinha ficado tanto tempo em casa, foi me dando uma coisa estranha."

A saída foi encarar a doença de peito aberto, com auxílio profissional.

Testemunho para não ser ignorado

Às vezes você em sabe que tem. Procurei ajuda profissional, fizemos testes, e realmente era depressão. Foi quando tive essa ajuda para retomar. Hoje minha psicóloga é minha amiga, madrinha do meu filho, a doutora Aparecida Miranda. Ela me deu força, falou que eu iria voltar, colocou isso na minha cabeça, acreditei e consegui. Hoje faço um trabalho com Márcio Micheli, especialista em comportamento humano e inteligência emocional. Eu indico ajuda profissional para todo mundo. Até quem nunca teve quadro de depressão deve ter. Coaching, psicólogo, todo mundo precisa de ajuda.

Radamés

Lara Maria/Instagram/Reprodução

Paz em Brasília: pai de família e projeto de aposentadoria

A capital federal surgiu como bálsamo para Radamés. A tranquilidade oferecida pelo Brasiliense, que honra com suas responsabilidades e criou um ambiente de retomada para o jogador, entregou um cenário em que ele se vê pleno após tantos desafios.

"Eu tinha contrato com Boa Esporte, que na época jogava Série B do Brasileiro. Minha esposa tinha uma vida em Varginha, família e trabalho lá. Mas houve a proposta, ela estava grávida do nosso primeiro filho, todo mundo falava bem do Brasiliense, a estrutura é muito boa... Conversamos e ela topou. Quando cheguei, vi que era melhor do que eu imaginava. Criamos raízes aqui, amizades, adoramos o ambiente. Não posso negar que a paz e a tranquilidade de jogar aqui me fazem querer ficar mais e mais", revelou.

Casado com Caroline Furlan e pai de três filhos — a enteada Giovana, 10 anos, Matheus, 2 anos, e Mariana, 1 ano—, ele olha para trás orgulhoso.

"Vivo com meus filhos, minha esposa, em uma paz tremenda. Sempre fui apaixonado por criança, mas não sabia o tamanho disso. O amor vai aumentando, crescendo, e isso traz muita força para lutar, acordar todos os dias e seguir em frente. Depois que tive meus filhos, virei outro homem, em todos os sentidos, de verdade. Hoje eles e minha família são as coisas mais importantes para mim, quero eles sempre comigo. Me sinto realizado pessoalmente, profissionalmente, e se eu encerrar minha carreira hoje, fechou com chave de ouro. Só tenho a agradecer a Deus", finalizou.

Fim da carreira no Brasiliense?

Eu era para ter me aposentado aos 30 anos com a lesão. Estou com 35, portanto, no lucro. A gente vai fazendo aniversário, a idade aumenta, e achamos que vamos piorar. Mas na verdade se vai melhorando, a experiência, a confiança, nos cuidamos mais. Não sei dizer se vou jogar mais dois, três, cinco anos. Tenho contrato até o fim do ano e espero renovar, me aposentar no Brasiliense.

Radamés

Quero ficar no futebol. Fiz cursos de gestão, quero fazer de técnico. Minha esposa acha que tenho networking bom para ser empresário, mas eu gostaria de trabalhar no campo, ser treinador ou gestor. Ela diz que realmente a vida continuaria a mesma, ir para um lado ou outro, trabalhos curtos. E querendo ou não com três filhos não dá para fazer isso. Mas quero ficar no futebol.

Radamés

Paulo Cruz/Agif

Uma história com Marcelo

Entre parceiros antigos, Radamés recorda de Marcelo. O lateral que atualmente defende o Real Madrid poderia ter "resolvido a vida" dele e dos colegas com uma proposta da Rússia, mas recusou, para surpresa de todos, com 17 para 18 anos.

"A proposta resolveria a vida dele, era muito dinheiro. E a nossa, porque o Fluminense estava com salários atrasados. A direção precisava vender alguém para nos pagar. A proposta era absurda. E ele falou: não vou. Eu me lembro do Tuta (ex-centroavante) dizendo: 'moleque, você tem noção do tanto de dinheiro que esses caras estão de pagando?'", relembrou.

"Ele sempre inventava uma desculpa. Primeiro era a namorada, que hoje é esposa dele, Clarice, que não poderia ir porque era menor de idade. Os russos falaram com a mãe dela e conseguiram autorização. Depois era o cunhado, melhor amigo dele. Também iriam levar o cunhado e a esposa do cunhado. Daí ele falou que pensava na seleção, mas naquela época muitos jogadores que estavam na Rússia estavam sendo chamados. A gente falava para ele ir, mas não teve jeito, os caras subiram a proposta, mas ele bateu o pé."

Quis o destino que o parceiro de Flu se desse ainda melhor. Recusando o dinheiro que salvaria a todos naquele momento, Marcelo ficou por pouco tempo no Brasil. "Uma semana depois que os russos desistiram veio a oferta do Real Madrid. O moleque realmente é diferenciado. Quando é alguém iluminado, parece que algo falava dentro dele para não ir, recusar."

Amizades para sempre

Conversamos até hoje em grupos de WhatsApp, trocamos mensagens, nos criamos juntos. O Marcelo é um cara muito legal. Sempre teve uma personalidade diferenciada. Não sei se ele volta a jogar no Brasil algum dia. Ele é ídolo máximo no Real Madrid e tem projetos na Espanha. Alguma coisa me diz que não. Mas pode ser.

Radamés, sobre Marcelo

O Thiago tem uma história de superação linda. Ele saiu da base do Flu, foi para o RS Futebol, depois Juventude, foi para Rússia, teve pneumonia, quase morreu, e voltou desconhecido. Mas nos treinos nós já víamos que era diferenciado. Tinha muita velocidade para zagueiro, ganhava dos atacantes. Quando deram chance, só cresceu.

Radamés, sobre Thiago Silva

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