A rápida resposta alvinegra

Em um ano, Botafogo dá 'resposta mais rápida do mundo' para a torcida e paga conta com juros

Alexandre Araújo e Igor Siqueira Do UOL, no Rio de Janeiro (RJ) Buda Mendes/Getty Images

Ninguém pode calar aqueles que gritam aos sete ventos que "é tempo de Botafogo". A equipe, que há poucos dias ganhou a América, também colocou tons de preto e branco no Brasil. O torcedor pode, enfim, bater no peito e dizer que é campeão brasileiro!

O Glorioso, que superou o trauma da última temporada e foi decisivo nos momentos cruciais da campanha, levanta o título e encerra um jejum que beirava três décadas.

Gerações de alvinegros que não puderam ver o feito de Túlio Maravilha, Donizete, Gonçalves, Wagner e companhia, em 1995, se deleitam com a primeira conquista do clube na Era dos pontos corridos.

O título foi confirmado neste domingo (8) contra o São Paulo e fez o Manequinho - mascote que fica em frente à sede e é personagem nas comemorações dos títulos - vestir mais uma faixa.

O Botafogo é tricampeão brasileiro uma semana depois de conquistar a Libertadores para exorcizar de vez os fantasmas de 2023.

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Igor Siqueira/UOL

O efeito da fé e a bênção da padroeira

O zagueiro Alexander Barboza gosta de tatuagens. E uma delas, no braço direito, tem a frase: "A fé não faz as coisas mais fáceis. As faz possíveis".

Acreditar no que não se vê é que motivou a reconstrução técnica, tática e psicológica do Botafogo na temporada.

A tatuagem de Barboza de certa forma se encaixa na mística que esse time construiu e nos fantasmas que afastou para ser campeão da Libertadores e do Brasileiro.

"Eu sinto que quando alguém deposita fé sobre algo ou alguém, as coisas vão acontecer. Eu vou resumir com o meu gol contra o Peñarol. Eu procurei muito, depositei a fé. No jogo anterior, cheguei a fazer, mas foi anulado. Mas no jogo seguinte eu sabia que faria o gol. Dentro de mim, eu sabia", explicou o zagueiro ao UOL, depois de fazer um dos gols nas semifinais da competição continental.

Na ocasião, ele vinha de uma frustração: o gol anulado diante do Criciúma, em um empate amargo nos últimos instantes, no Maracanã, pelo Brasileirão. Mas o time estava com apetite de conquistas e mostrou isso depois.

"Eu quero ganhar tudo o que eu jogo. Essa é minha fé. Eu creio. E vou lutar por isso. Falo de mim e do time todo, que quer ganhar todas as competições que tem pela frente", avisou ele, de forma até premonitória.

A fé transbordou as quatro linhas e chegou às arquibancadas com um toque do destino. O título do Brasileiro acontece em um 8 de dezembro, dia de Nossa Senhora da Imaculada Conceição, que é padroeira do Botafogo. Pedidos à santa não faltaram. A data é também o aniversário de fusão entre o Club de Regatas Botafogo (1894) com o Botafogo Football Clube (1904), em 1942.

Vitor Silva / Botafogo

Palmeiras, de novo

Algoz em 2023, ano que causou feridas, o Palmeiras foi, novamente, o rival na corrida pelo título, e também o fiel da balança da campanha. Desta vez, porém, a história teve final feliz para o clube de General Severiano.

A dura virada sofrida para o Alviverde no ano passado, quando ganhava por 3 a 0 e perdeu por 4 a 3, em casa, foi o jogo que mudou o cenário do Glorioso. Àquela altura, o time, com o então interino Lucio Flavio, chegou ao terceiro jogo sem vencer — havia empatado com o Athletico-PR e perdido para o Cuiabá — e viu a vantagem na liderança cair para três pontos.

Daquela partida em diante, porém, o Botafogo não mais venceu. Foram três derrotas e cinco empates, e uma derrocada que fez o time não conseguir nem sequer vaga direta na Libertadores de 2024.

O ano mudou e, na atual jornada, o Alvinegro não construiu uma vantagem tão pomposa como a da edição anterior, mas, ainda assim, abriu uma "gordura" frente aos adversários na briga pelo título.

O ano mudou e, novamente, a vantagem se diluiu. Restavam três jogos quando o Glorioso viu o Palmeiras assumir a ponta — ambos com 70 pontos, mas os paulistas com uma vitória a mais —, e a rodada seguinte reservava um duelo direto no Allianz Parque.

Os rivais voltaram a lembrar daquele fantasma que a torcida alvinegra queria esquecer. Mas o ano tinha mudado. Os comandados de Artur Jorge não deram chance. Mesmo fora de casa, se impuseram, venceram por 3 a 1 e voltaram a assumir a liderança, abrindo três pontos de vantagem e colocando uma mão na taça. A segunda mão quase foi posta já na rodada seguinte, após vitória sobre o Internacional, mas um gol do Palmeiras já no fim do duelo contra o Cruzeiro adiou a festa. Contra o São Paulo, diante da torcida em um Nilton Santos lotado, enfim, campeão.

Vitor Silva/ Botafogo

De 'vilão' a herói

A disputa particular e as histórias cruzadas entre Botafogo e Palmeiras têm um personagem que se tornou protagonista: Adryelson. Titular no Glorioso de 2023, foi expulso no jogo no Nilton Santos quando o placar da partida marcava 3 a 1. Aquele jogo acabou da forma que todos sabem e, com o passar das rodadas, o título, outrora tão perto, ficou cada vez mais distante.

Ao fim da temporada, o zagueiro despediu-se de General Severiano e, juntamente ao goleiro Lucas Perri, rumou ao Lyon, da França, clube que integra a Eagle Football, grupo gerido por John Textor.

Sem muitas oportunidades no outro lado do oceano, retornou ao Alvinegro. Começou no banco na "decisão" no Allianz, mas quis o destino que Bastos acusasse uma lesão nos minutos iniciais. Adryelson saiu do banco e foi autor do gol que colocou justamente o 3 a 1 no placar, reescrevendo o próprio destino e de seus companheiros neste confronto.

Da segunda divisão à glória na Série A

O Botafogo que celebra o título do Brasileiro era, há três anos, campeão da segunda divisão deste mesmo campeonato. Aquela conquista marcava não apenas o retorno à elite, mas uma retomada após um rebaixamento com rodadas de antecedência e um horizonte nebuloso pela frente.

Na ocasião, o acesso já garantia quantias maiores de direitos de transmissão na temporada seguinte, boa notícia em meio à crise financeira que o clube atravessava. Semanas depois da conquista, mais precisamente no dia 24 de dezembro de 2021, uma notícia ainda melhor: o Alvinegro anunciou o acordo com John Textor para a compra de 90% das ações da SAF.

Desde então, o Botafogo atravessou uma reformulação no departamento de futebol, que começa a dar frutos nesta terceira temporada. Até aqui, na Era SAF, houve um investimento que gira em torno de R$ 374 milhões, em cifras que não levam em consideração luvas e comissões.

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Ninguém passa

A vitoriosa campanha do Botafogo teve alguns ingredientes, dentre eles, um sistema defensivo sólido.

O Alvinegro teve a defesa menos vazada da competição, com 29 gols sofridos em 38 jogos, fruto também do entrosamento da dupla de zagueiros formada pelo angolano Bastos e pelo argentino Barboza.

O curioso é que boa parte do setor chegou a General Severiano para a atual temporada, como o próprio Barboza, o goleiro John, os laterais Vitinho e Alex Telles e o volante Gregore.

Buda Mendes/Getty Images

Brasileiro, ora pois

O título do Botafogo representou o tri de técnicos portugueses no Campeonato Brasileiro. O Alvinegro alcançou o topo do pódio com Artur Jorge, após duas conquistas do Palmeiras de Abel Ferreira.

Nos últimos seis anos, quatro técnicos portugueses se sagraram campeões da principal competição do Brasil. Em 2019, Jorge Jesus tinha conseguido tal feito com o Flamengo, enquanto em 2020 e 2021, Rogério Ceni e Cuca venceram com Flamengo e Atlético-MG, respectivamente.

Artur, que chegou ao Alvinegro em abril, também igualou feito do compatriota ex-Fla, conquistando a Libertadores e o Brasileiro na mesma temporada.

Thiago Ribeiro/AGIF Thiago Ribeiro/AGIF
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