'Me vejo atuando em clube'

Comentarista Raphael Rezende se vê como "agente transformador" e trocaria SporTV para trabalhar como dirigente

Bernardo Gentile Do UOL, no Rio de Janeiro Arquivo pessoal

Assim como milhões de brasileiros, Raphael Rezende se define como "um apaixonado por futebol". A escolha do jornalismo como profissão foi apenas "um meio", como ele mesmo diz, para realizar o sonho de trabalhar com o que ama. A função de comentarista entrou na vida de Rezende no "susto" depois de uma confusão com escalas de trabalho na SportTV, onde dá seus pitacos futebolísticos desde 2008.

Consolidado na profissão, aos 36 anos, Rezende se tornou, não apenas um comentarista, mas um estudioso do assunto. Fez cursos na CBF (Confederação Brasileira de Futebol) para balizar e melhorar sua atuação, tirou licença B de treinador e se formou em gestão de futebol.

Com comentários baseados na teoria, ficou conhecido no meio esportivo pelas análises táticas. Seus comentários e sua forma de pensar o futebol dentro das quatro linhas levantam bastante polêmica e geram rixa com outros comentaristas da "velha guarda".

Rezende não se preocupa. Vê a si próprio como um "agente transformador", alguém que quer passar conhecimento e mudar a atual estrutura do futebol brasileiro. Neste contexto, os estúdios de TV ficam pequenos e ele se vê trabalhando no futuro diretamente na gestão de algum clube. "Um objetivo, que é meio ideológico, é participar do processo de mudança e transformação do meio mesmo [clubes e imprensa] e das pessoas, que consomem futebol", afirma o comentarista em entrevista ao UOL Esporte.

Arquivo pessoal/Instagram

"A minha veia é o futebol"

Como um bom apaixonado, o futebol foi fundamental até na hora da escolher a carreira. O jornalismo foi a opção para que Raphael Rezende pudesse trabalhar direta ou indiretamente com sua grande paixão.

"O jornalismo era quase como um meio e não um fim, sabe? Acho que me difiro um pouco de várias pessoas com quem eu convivo e respeito muito, que tem mais a veia jornalística da coisa. A minha veia não, a minha veia é o futebol. Foi ele que me trouxe até aqui", disse o comentarista.

Com o perfil completamente diferente do de alguns colegas de profissão, ele tem a certeza que sua vida não se resume ao jornalismo e, por isso, não segue uma 'cartilha' para conquistar cada vez mais espaço na empresa. São escolhas que direcionam sua carreira para caminhos menos tradicionais e até mesmo surpreendentes.

"Se eu fosse imaginar que o fim é o jornalismo, que se encerra uma trajetória dentro apenas do jornalismo, eu me imaginaria tendo a oportunidade de acompanhar uma seleção brasileira na Copa do Mundo. Imagina, pouquíssimas pessoas têm essa possibilidade, fazer um comentário no canal com essa presença, com esse espaço, em uma final de Copa do Mundo. Mas isso passa por tantas variáveis, passa por uma construção de carreira que, muitas vezes, independente do que é o nosso trabalho especificamente. Claro que depende também, mas não só disso", afirmou.

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Chance de comentarista no susto

"Eu fazia uns pilotos, o que a gente chama de testes de narração, de comentário para ajudar o Bruno Souza, que hoje é narrador do canal e era de uma turma de estágio mais recente do que a minha, era como se fosse meu calouro. Ele fazia narração de diversos esportes e, no futebol, quando ele precisava gravar alguma coisa, ele me pedia para fazer o comentário. Então, os chefes na época tinham algum material nosso e meu, especificamente, sobre futebol. E um dia de maio de 2008, eu havia acabado de ser contratado (havia chegado no fim de 2007) e estava produzindo uma partida do Campeonato Mineiro.

Naquela época, as escalas passaram a ser enviadas por e-mail, e o saudoso Valdir Espinosa, que comentava jogos com a gente, estava escalado, mas ele não ficou sabendo, passou batido por ele. E não tinha nenhuma pessoa na casa para fazer o jogo no lugar dele. Era uma partida da Libertadores do Estudiantes [da Argentina] lá no Equador. Um dos meus chefes na época, o Luis Franco, virou para mim e falou: "olha, é você ou você, por mim está liberado e depois a gente vê o que acontece". E aí eu encarei, imagina?

Eu nunca revi, imagino que tenha sido trágico, mas eles viram algum potencial, e, de lá para cá, foram dando oportunidades, não no susto, mas para tentar identificar o talento, enfim, se fazia sentido. Mas a primeira vez foi assim foi no susto total, foi bem fora do padrão.

O comentário veio muito cedo, eu imaginava algo para 10, 15, 20 anos de casa porque o comentarista nada mais é do que um jornalista de carreira no nosso imaginário. É o cara que construiu uma trajetória, que tem um respeito no meio e na profissão. E eu fugia completamente desse perfil. Eu achava que demoraria muito tempo, se talvez conseguisse construir esse nome, poderia lá na frente comentar os jogos"

A busca pelo conhecimento

Motivado por conhecer mais sobre sua paixão, Raphael se tornou um estudioso: consome muitos livros sobre futebol e já frequentou até cursos organizados pela CBF. E quanto mais aprende, mais ele quer dividir suas novas conquistas com telespectadores ou quem estiver interessado.

"Anos depois de entrar no SporTV já senti uma necessidade de buscar respostas sobre o futebol, que eu não tinha como jornalista. A busca pelo conhecimento é muito importante para abrir a cabeça das pessoas, para que a gente traga conteúdos mais relevantes e tente, de certa forma fazer com que o futebol, que a gente diz que é reflexo da sociedade, seja uma bolha de conhecimento para expandir um pouco essa ideia", diz Rezende.

E quanto mais conhecimento acumulou, mais as possibilidades se expandiram. A TV deixou de ser a única alternativa profissional para Rezende, que já vislumbra, no futuro, ajudar no processo de transformação do futebol, inclusive dentro de um clube.

"Em vez de aceitar o que são os problemas, que são recorrentes, eu acho que tem como fazer diferente e é nisso que eu acredito pensando em carreira em outro local. Pouco importa o local, mas a ideia, o conceito por trás. Eu acho que é esse de transformação e de acreditar no futebol melhor do que a gente tem hoje no Brasil", afirma.

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Estágios no Botafogo e em escolinha de ex-técnico do Fla

"Os estágios estão linkados a qual licença você está cursando. A Licença C que era de "Escola de Futebol", fiz na Escolinha do Flamengo, no Rio Mar, no Rio de Janeiro, na Barra da Tijuca, que é tocada pelo Rogério Lourenço, ex-treinador e ex-jogador do clube. Passei um período de três meses acompanhando as aulas, as crianças, enfim, os diversos processos que são feitos dentro de uma escola de futebol. A parte de gestão e também, a partir do dia a dia, de metodologia.

A Licença B, que é voltada para as categorias de base. Eu precisaria de um estágio também de três meses dentro de um departamento de divisão de base. Seguindo uma das categorias também para apresentar os treinos do dia a dia, e eu fiz essa parte com o Eduardo Barroca [treinador do Botafogo]. Inclusive, ele não me deu aula, mas é professor dos cursos na CBF. Eu sei que há uma resistência, a questão do que é a minha função [jornalista], do clube abrir de certa forma o dia a dia para o que é o seu funcionamento, mas eu não tinha isso, era muito mais interesse acadêmico mesmo do que jornalístico. Não fui produzir alguma matéria ou ter alguma fonte, descobrir algo que não é adequado dentro do clube, não era essa a questão. Então eu passei três meses com o Barroca no sub-20 do Botafogo, bem próximo já do período que ele foi para o Corinthians.

E a Licença A passa pela mesma questão, não sei nem se são só 90 dias como nas demais licenças ou se esse número ainda aumenta. Mas teria que conviver dentro da realidade de um departamento de futebol profissional e imagino que teria uma dificuldade ainda maior para o meu perfil, com a minha função, para eu ter esse acesso. Mesmo em relação com a casa mesmo porque pode haver até uma interpretação de um trânsito que não é legal para a isonomia, para o que é a minha função de trazer opinião"

Arquivo Pessoal Arquivo Pessoal

Dirigente de futebol? Teoria aplicada na prática

Inicialmente, o objetivo de Raphael Rezende era ter novas informações para balizar seus comentários na TV, mas a busca por conhecimento já abre novas perspectivas profissionais para o comentarista, inclusive como dirigente de futebol.

"Eu sei que o mercado é até muito mais complexo do que o do jornalismo, mas eu me vejo, por exemplo, ali na frente, pensando em uma oportunidade de aplicar o que eu acredito dentro de um clube. Pode ser em um clube buscando recuperação, vindo de baixo para cima, um projeto novo como é de clube-empresa no Brasil e que tem boas referências —tem um pensamento diferente com decisões mais técnicas— ou um gigante sofrendo. Enfim, as formas são diversas. Eu não tenho esse caminho bem definido até porque não sei quais portas se abrirão, mas hoje eu acredito, eu penso um pouco mais nisso, em deixar a teoria um pouco de lado e tentar aplicar. Claro que depende de entorno, de uma série de coisas", disse.

Raphael deixa claro que a decisão é difícil de ser tomada, afinal, sua função SporTV lhe garante uma estabilidade que dificilmente teria como dirigente no futebol brasileiro. "São carreiras muito distintas no que diz respeito ao nosso cenário. O jornalismo está passando por uma transformação. No meu trabalho, a gente tem uma estabilidade que é totalmente distinta do que é o mercado de maneira geral. Isso não existe no futebol. Então é uma transformação também pessoal. Seria uma vida muito diferente se eu desse um passo como esse", afirmou.

Apesar das ponderações, a vontade de arriscar existe e algumas conversas informais até já ocorreram, mas não houve nenhum convite oficial. E enquanto ele não chega, Rezende vai amadurecendo a ideia. "Já há uma troca nesse sentido de onde me imagino, fazendo qual função. Acho que tem muito mais a ver com portas, com oportunidades que apareçam".

E hoje acredito muito mais nessa chance [trabalhar em um clube] ou em, pelo menos, estar aberto a uma possibilidade de conversar sobre isso, de evoluir, de ter uma oportunidade de aplicar essas coisas que eu acredito. Ser um agente transformador onde quer que eu esteja e não necessariamente no jornalismo".

Raphael Rezende, sobre possibilidade de trabalhar como dirigente

Letícia Vorcaro/SporTV

Tática em segundo plano

Logicamente a tática dentro das quatro linhas foi assunto predominante em alguns dos cursos dos quais participou e um dos seus temas preferidos. Rezende sabe que muitos de seus companheiros de profissão sequer tocam no assunto - por falta de interesse ou de conhecimento. Para o comentarista, isso é um erro, já que a teoria é parte fundamental do futebol.

"A verdade é que a tática sempre esteve relegada a segundo plano aqui. A análise não é subjetiva e tem outros elementos. Eu acho que no jornalismo, principalmente, isso estava deixado de lado por que é mais fácil a gente debater comportamento, chuteira colorida, cabelo. São questões que já estiveram em evidência e que não fazem sentido, ou que, pelo menos, não são primordiais no sucesso ou no fracasso de um clube de futebol", desabafou.

"E elas são colocadas acima, né, acho que pela facilidade no trato. Na verdade, pela facilidade de trazer esse assunto e de se sustentar uma conversa mínima sobre isso. Dá trabalho falar de futebol, quando a gente está falando de campo e bola, e nem todo mundo está disposto, ainda mais com carreira consolidada, com trajetória já bem definida a andar para trás, a buscar novas soluções, novos conhecimentos. Acho que por isso que há essa resistência e essa busca pela manutenção do status que foi conquistado".

Estudiosos x Medalhões

O apreço pela parte teórica do futebol criou um verdadeiro racha nas redações esportivas. De um lado estão os comentaristas "estudiosos", que valorizam a parte tática. Do outro, jornalistas mais "cascudos", consolidados, e que entendem que o bastidor do clube importa mais, minimizando os métodos dentro do campo.

A discussão, evidentemente, não está restrita apenas às redações esportivas, mas a todos que, de alguma forma, acompanham o futebol. Quem tem acesso às informações passa a enxergar o jogo de uma outra forma. Com a ajuda da internet é muito mais fácil consumir e aprofundar o tema. Mas nem todos estão dispostos.

"Eu acho que a competição vai existir em qualquer cenário. A gente tem hoje uma facilidade muito grande de troca de informação, de acesso à informação e até de contato, de convívio com a rede social. Então, eu acho que quando você propõe algo que foge do padrão vigente, do que vem sendo feito, é óbvio que quem foi contemplado em um outro momento, em uma outra leitura dentro desse meio vai sentir incomodado e de certa forma vai reagir para proteger o seu ambiente, seu espaço conquistado. Eu acho que passa por aí qualquer tipo de incômodo, que não é diretamente com o que está sendo proposto ali do outro lado, é com o risco que está sendo gerado para o seu próprio espaço".

Você não pode fazer um comentário raso sobre algo que o telespectador possa ter a sensação de que ele sabe mais do que você. Você tem que estar alinhado com ele, você tem que estar no mínimo no mesmo nível na troca e na conversa. Não pode deixar passar batido, não pode trazer desinformação, eu acho que esse é o respeito que deve ter.?

Raphael Rezende

Taís Vilela/TV UOL

Discussão com Renato Maurício Prado

O choque de gerações e de propostas diferentes colocou jornalistas em rota de colisão. E Raphael Rezende se viu em meio a um acalorado debate com o experiente jornalista Renato Mauricio Prado, colunista do UOL Esporte e comentarista do SporTV, nas redes sociais. Os dois discutiram após o empate entre Palmeiras e Flamengo, no dia 20 de setembro. Prado questionou a experiência do colega de profissão, que respondeu o chamando de "gagá".

Segundo Rezende, essa não havia sido a primeira alfinetada feita por Prado. "O incomodo dele é algo recorrente e aconteceu em várias redes. Um dia especificamente durante o trabalho eu acabei respondendo e isso gerou o choque, uma troca de mensagens. Não acho que seja certo ou a melhor forma de lidar", disse.

"Vejo que tem aquilo que falei da mudança. A questão da resistência, de ver um quadro se modificando, Ele, conceituado dentro da casa, e eu tendo um espaço sendo a única pessoa com aquele perfil ali, de incômodo, de certo movimento na estrutura bem consolidada de status de cada um. Eu acho que passa muito por isso, mas eu só tenho a lamentar para falar a verdade. Não tem muito o que falar além de pedir desculpa por ter trocado em algum momento. E seguir o jogo, sabe? De certa forma é relevar o que é um pensamento diferente do meu e seguir o jogo, não tem muito como ser diferente disso", disse.

Futebol tem diversos clichés, mas se eu fizer um paralelo entre a questão do torcedor e o caso com o Renato, para mim, a grande diferença é que eu estou falando de um igual. Eu estou falando de alguém que é um companheiro de profissão, mesmo que em um outro estágio da carreira. Me incomodou que ele se incomodasse tanto comigo. E, talvez, por isso, eu tenha reagido naquele momento. Hoje sou bem mais comedido no uso das redes sociais do que já fui."

Raphael Rezende

Reprodução/SporTV

Pedrinho: "companheiro de cruzada"

Com pouco tempo de SporTV, Pedrinho logo se mostrou bem alinhado com a forma de pensar de Raphael Rezende. O ex-jogador do Vasco se revolta com comentários rasos sobre o futebol e sempre tem falas parecidas com as do "agente transformador". Por causa dessa parceria na bancada, o jornalista se refere ao ex-jogador como seu mais novo "companheiro de cruzada".

"É um parceiro recente de jornada. Foi uma identificação imediata até por isso a gente tenta o máximo fazer o 'Troca de Passes'. Sempre torço para estar com o Pedrinho. Queria que ele estivesse no programa umas, duas, três, quatro vezes na semana porque eu acho que o tamanho, a voz, o conteúdo dele nesse caminho chamam mais atenção. Então acaba sendo mais relevante se a gente tiver esse pensamento sendo difundido", afirma.

"Eu respeito muito os que são ótimos em traduzir as questões do jogo, os que identificam, com facilidade, determinados comportamentos no futebol. Acho que são extremamente relevantes, mas eu cito muito o Pedrinho porque eu acho que ele engloba o todo, o que é a complexidade da gestão, a complexidade da informação quando a gente fala de jornalismo, respeita o que ele teve de trajetória, mas não se encerra nisso", diz. "Não é só pegar sua bagagem e transferir para o jornalismo ou transferir para uma gestão ali na frente. Eu acho que ele faz isso muito bem e por isso essa admiração. Sempre que eu posso conviver, estar próximo e, ao mesmo tempo, citar o nome dele porque é um trabalho bem diferenciado", completa.

Jornalismo como espelho do futebol

Curiosamente, o choque geracional que Raphael encontra no jornalismo ocorre no futebol. Há uma guerra nos clubes entre os cartolas não remunerados e os dirigentes profissionais. Mesmo que migre para um clube de futebol, a vida do hoje comentarista não será nada mais fácil. Mudam apenas os personagens e os cenários.

"Existe o paralelo, mas com diferença primordial: no futebol você será rapidamente demitido se houver um confronto ideológico", disse.

Em relação à evolução das duas profissões, Rezende vê o jornalismo caminhar mais lentamente, desde a graduação, primeiro emprego até a consolidação da carreira. Nos clubes, porém, tudo depende de quem tem o poder de decisão.

"Eu acho que no jornalismo esses ciclos são mais duradouros. A questão é geracional. A gente vai ter chefes com outra cabeça em cinco, 10, 15, 20 anos, a gente vai ter outro tipo de pensamento sendo colocado em prática em decisões importantes. No futebol, eu acho que os ciclos são mais curtos", compara. "Eu não sei se dá para dizer que que essas pessoas [cartolas] especificamente vão perder espaço porque tudo depende de quem tem a caneta na mão, de quem domina o processo decisório e essas pessoas vão e voltam no futebol. Os ciclos, os mandatos, são muito pequenos e instáveis, né? As decisões políticas tomam conta, e você perde a essência do critério mais técnico para tomar decisão no futebol.

Arquivo pessoal~/Instagram Arquivo pessoal~/Instagram

Sem medo de contrariar

Um dos assuntos mais debatidos entre torcedores e expectadores é a suposta preferência que canais de comunicação dão para os clubes de maiores torcidas. No Rio de Janeiro, inclusive, foi criado o termo 'Flapress', que se refere ao tratamento diferenciado que a imprensa local dá ao clube, muitas vezes sem merecimento e em detrimento dos outros times. Como comentarista, Raphael Rezende diversas vezes contrariou o senso comum e bateu de frente com a maior torcida do país.

Na final do Mundial de 2019, o Flamengo segurou o Liverpool durante os 90 minutos e perdeu na prorrogação, por 1 a 0. Grande parte da mídia seguiu a linha dos torcedores e disse que o Rubro-negro havia jogado de igual para igual. Raphael Rezende, no entanto, foi a voz dissonante. E, claro, sofreu com os fanáticos nas redes sociais.

"Eu acho que a gente não pode se ater ao que é o movimento de torcida, ao falar o fácil, falar o que as pessoas querem ouvir. Não é ser do contra sem embasamento, mas é trazer outro viés, outro tipo de pensamento para o jogo, independentemente, do quanto isso vai reverberar ou do quanto isso vai gerar de incômodo".

Rezende acredita realmente que clubes de grande torcida tenham mais espaço no debate até por conta do alcance e audiência que geram. "Mas, dentro do trabalho de comentarista, eu acho que o mais importante é que você seja capaz de falar do assunto que está sendo colocado, nunca desmerecer os outros clubes. Ah, vou fazer o jogo do Bahia com o Sport Campeonato Brasileiro, eu tenho que saber o que está acontecendo naquela realidade, pode não ser o meu dia a dia, mas é preciso aprofundar. Eu acho que é por aí, é o meu comportamento".

Eu não posso deixar de falar as coisas que eu acredito, que eu identifiquei pura e simplesmente porque tem muitas pessoas, já que é a maior torcida do Brasil, ficarão incomodadas. Eu estaria abrindo mão do que é a essência da minha profissão, da minha função.?

Raphael Rezende

Perfil já fechou portas

O perfil de Raphael Rezende, portanto, não é nem um pouco de agradar a todos a qualquer custo. As rusgas conquistadas ao longo do caminho, claro, fecharam algumas portas e tiraram algumas oportunidades que pareciam certas. Hoje, ele se diz satisfeito na participação do "Troca de Passes" no fim das noites — o que o ajuda a conciliar a vida de pai e profissional ao mesmo tempo.

"Eu convivi e convivo com essas pressões e com essa dificuldade de crescimento vindo de muita gente que, de certa forma, pelo tempo de carreira, pelo prestígio que tem, consegue ter influência em determinadas decisões e modifica um pouco o que são oportunidades", admitiu sem dar maiores detalhes.

Além de portas fechadas no SporTV, a personalidade forte também pode lhe tirar oportunidades como um futuro dirigente de futebol. Ele entende que o perfil do comentarista agregador acaba sendo mais fácil, mas, definitivamente, Rezende trilha o próprio caminho.

"De certa forma, o meu perfil profissional acaba gerando uma dificuldade maior em ser respaldado. O perfil de comentário acaba sendo mais aceito quando ele é agregador, quando de certa forma agrada as pessoas que tomam decisões ou que estão no dia a dia dos clubes. Isso gera um carinho, isso gera um contato mais natural com o torcedor, com o dirigente, com quem quer que seja. Eu acho que esse é um caminho fácil sem dúvida, mas não me vejo assim", finaliza.

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