Sabe, dezembro é uma época muito chuvosa lá no Acre, terra onde eu nasci. Eu sei disso não só pela minha infância, mas porque até hoje volto lá todo fim de ano. Eu criei uma espécie de ritual para cumprir.
Sempre que a temporada acaba, eu viajo para o Acre e vou até o campo onde eu me tornei goleiro. A história de que a grama não cresce onde o goleiro pisa pode até não ser verdade em uns poucos estádios de elite, mas ali no Acre era só terra, mesmo. Era muito, muito ruim. Eu me ralava muito. Chegava a jogar com três shorts para amortecer a queda.
Mas era o que tinha, sabe? Ou eu fazia o melhor ali, ou não tinha o que fazer. Quando você é moleque, tudo é legal. Cair no chão é legal, saltar para o lado é legal, se jogar é legal... A verdade é que o treino de goleiro é divertido de se ver se você não é goleiro.
Todo fim de ano eu volto àquele campo e treino nele. É verdade, você não leu errado: é naquele campo duro, onde eu me ralava inteiro e jogava com três shorts, que eu começo meu ano. A parte boa é que, como eu ia dizendo, dezembro é chuvoso no Acre. Lama é melhor que a terra dura.
Talvez você esteja se perguntando por que eu faço isso. Se você estivesse lá, eu te responderia sujo de lama: é um mergulho na realidade. É sentir o que o futebol é para muita gente e o que eu vivo hoje é exceção. Eu não quero esquecer isso jamais.