Considerando todas as Martas que não estamos revelando, como fica o futuro da seleção quando a Marta parar?
É complicado, porque estamos vendo a Formiga jogar a sétima Copa. A Formiga foi da minha geração! O povo está admirado aqui. Mas o que é que a seleção vai fazer quando elas se aposentarem? Realmente é de se preocupar, mas é o que eu falei: se você olhar bem pelo Brasil, tem jogadoras. Mas aí é o que eu falei antes para você: quem vai ser responsável para desenvolver esse trabalho de não ficar na dependência dessa geração que está agora? Daí vem uma coisa que foi foco quando a Emily [Lima] era treinadora da seleção.
Querendo ou não, a Emily não estava visando os resultados imediatos. A Emily estava visando dar chances para as jogadoras. Agora, se você quer colocar alguém à frente da seleção para conseguir os resultados, sinto muito, mas não vai dar certo. É preocupante, porque você não sabe qual é a nova geração. A seleção precisa de renovação e de experiência andando juntas. Eu não estou dizendo que elas deveriam ter parado. A Formiga joga muito, poxa, eu queria a Formiga no meu time! O que ela joga, caramba... Mas enquanto você se despede da Formiga e aproveita enquanto ela ainda está jogando, você já tem de começar a pensar que a Formiga não vai jogar para sempre.
O americano sempre fala que o brasileiro é diferente. O brasileiro tem aquela técnica que é natural, é imprevisível. Mas eles não entendem por que a gente ainda não chegou ao topo. É por isso que eles falam: 'imagina se a Marta tivesse nascido aqui'. Aqui, o futebol feminino tem seu próprio espaço, não só o espaço que sobrou do masculino. No Brasil, não. Como eles [homens] já ganharam cinco vezes, ficam lá no topo sozinhos. E o futebol masculino nunca foi crime no Brasil, como o feminino foi. Mas é preocupante, quem é que vai ser a próxima Formiga? Sei lá, meu.
Você citou o trabalho da Emily em tom positivo. Desde que a convocação para a Copa foi anunciada, muito se questiona o fato de que o Santos da Emily não teve atletas chamadas pelo Vadão.
Tomara que não tenha nada do tipo, porque eu acho que as jogadoras do Santos não merecem pagar um preço por seja lá qualquer problema pessoal que você tenha. Eu vi e assisti à seleção quando a Emily estava a frente, e deu para entender o que ela estava tentando fazer. Não é fácil, porque tem o fato de ser uma mulher à frente de uma seleção. Quando você não tem apoio total de cima, fica difícil mesmo.
Aí todo mundo fica querendo ver um erro para poder condenar. Ela não teve a chance de perder nove jogos seguidos. O Vadão teve. Caramba! Qual era o problema, então? Eu espero que não seja por isso [que as santistas não foram chamadas], porque, para mim, é questão de ter capacidade. Não é que um treinador homem não possa comandar a seleção feminina, não é isso. Mas se é isso que está rolando hoje, a ideia de que o Santos não tem jogadoras na seleção por causa disso, é uma pena.
Como eu já conheço os bastidores, a gente sabe que há politicagem. Quando eu fazia parte da seleção, você não podia falar. Se falasse, não voltava para a seleção. Tinha de ficar calada e aceitar o que eles diziam para você fazer. A gente tem de engolir muita coisa para fazer parte da seleção. É uma pena. É uma questão de você representar o país, não é só representar o Santos e a Emily. Pelo amor de Deus, né.
Você tinha de "ficar calada" para não sofrer consequências?
Eu não vou falar se é isso que está acontecendo hoje, porque não estou convivendo com elas. Eu vou falar o que aconteceu comigo: a gente teve de deixar muita coisa de lado para poder representar a seleção. Ficar quieta e não comentar muito. Porque você sabia que de repente poderia não voltar. Não sei como é o regime agora. O grupo tem de estar fechado com a seleção que foi escolhida. De repente, as meninas não estão falando nada porque deve estar tudo bem, vai saber. Mas elas devem estar incomodadas, porque ninguém quer perder. Duvido que não estejam incomodadas.