Elas acordam às 6h30 da manhã e uma hora depois estão fazendo musculação. Elas treinam em aparelhos pneumáticos, do modelo mais moderno, do mesmo tipo que astros do futebol e celebridades têm em casa. Elas têm os melhores personal trainers e se consultam com o melhor nutricionista da cidade. No inverno, elas nadam em águas aquecidas até o meio da tarde e voltam pro sobrado com três quartos, uma piscina e dois carros na garagem, onde veem filmes e a novela das 9 até cair no sono.
Elas têm pais que sempre deram tudo pra elas, e o que os pais não dão elas ganham das marcas que as patrocinam: roupas, celulares, suplementos e equipamentos de natação. Elas são extrovertidas, engraçadas e gostam de puxar assunto com estranhos. Elas não precisam de muita coisa pra se divertir e ficariam horas brincando numa máquina de pinball no shopping ou tentando pegar ursinhos de pelúcia. Se você passar dois dias ao lado delas não verá tristeza nem um minuto sequer.
Quando não estão treinando, estão fazendo vídeos pro Instagram e pro TikTok, dancinhas e dublagens, desafios e enquetes. Elas têm 10.800 seguidores. Elas ganham 30 mil por mês, entre bolsas do governo federal, estadual e municipal. Elas sofreram bullying na escola, e hoje os que faziam bullying dizem que elas são o orgulho da cidade. A família delas acumulou muito dinheiro nos últimos anos — e também muita angústia.
A mulher mais rápida do Brasil no nado peito faz 100 metros em 1m7s. Elas fazem em 1m16s. Elas viajam o mundo a trabalho: Austrália, México, Itália, Inglaterra... Estiveram em Tóquio ano passado e devem estar em Paris em 2024. Elas são loiras, jovens e têm o corpo que a maioria das mulheres da idade delas gostaria de ter. Pra ser sincero, elas têm a vida que a maioria das pessoas de 24 anos, como elas, gostaria de ter.
Mas as nadadoras gêmeas Débora e Beatriz Carneiro não têm algo que a maioria das pessoas têm: um cérebro totalmente funcional. Beatriz e Débora não conseguem fazer contas, a não ser com números muito redondos, tipo 10 + 10 (elas precisam de alguns segundos pra ter certeza). Elas não sabem ver a hora em relógio analógico, não conseguem conferir o troco, nem fazer um pix no celular. Elas terminaram o ensino médio, mas têm dificuldade pra entender ou escrever textos longos e silenciam em conversas sobre temas complexos, mesmo quando são sobre elas.
O quociente de inteligência de uma pessoa convencional fica entre 90 e 110. O QI de Débora é 49; o de Bia, 48. Para as gêmeas, entender a passagem do tempo é tão difícil quanto a física quântica é pra nós. Um dia o treinador queria encontrá-las no lobby do hotel em que a equipe se hospedava em São Paulo e disse a Débora: "Me encontra lá embaixo em 15 minutos." Débora travou. Pegou o telefone, ligou a quem sempre recorre nessas situações e perguntou:
"Pai, quanto é 15 minutos?"