Bronze Sub-Zero

Netinho conheceu o taekwondo quando ia jogar videogame; hoje, é bronze na 'categoria ninja'

Thiago Arantes Do UOL, em Paris (FRA) Albert Gea/REUTERS

Chutes altos, socos rápidos e saltos com voadora giratória. Os golpes do taekwondo às vezes parecem comandos de um videogame, e a história do terceiro medalhista olímpico brasileiro da modalidade une as duas coisas.

Antes de ser Edival Pontes, bronze na categoria até 68kg em Paris, Netinho era uma criança que gostava de videogame. Daquelas que procuravam um amigo com um Super Nintendo para sentar diante da TV e não sair mais.

O amigo era filho de um professor de taekwondo, que um dia tirou a garotada da frente da tela e botou para treinar. Netinho gostou, seguiu e não parou mais.

Nos duelos do clássico Mortal Kombat, ele era Sub-Zero. Um ninja de quimono azul, frio, que dominava os adversários com força e rapidez.

No Grand Palais de Paris, também.

A medalha de bronze veio com colete azul, depois de 8 horas esperando para saber se teria direito a lutar ou não na repescagem; um exercício de paciência. No pódio, Netinho beijou a medalha e, quando olhou para o lado, entendeu bem onde estava. "Essa categoria só tem ninja", comentou.

Ele também era um deles. Edival Pontes, o Sub-Zero brasileiro.

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No final do ciclo, a gente achou que eu não ia conseguir chegar. Eu mesmo achei que eu não ia conseguir chegar. Mas dentro do meu coração, vinha aquela coisa: 'você não pode ficar sem essa medalha, né? Você não pode encerrar sua carreira sem essa medalha'. Sei que eu estou muito novo, dá para fazer mais um ciclo aí, tranquilo. Mas eu sentia dentro de mim assim que eu não poderia encerrar minha carreira sem essa medalha.

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Medalha com direito a revanche

Quando Edival Pontes viu que a primeira luta da repescagem pela medalha de bronze seria contra o turco Hakan Reçber, uma pergunta veio à cabeça. "Meu Deus, será que eu vou perder pra esse cara de novo?"

Em Tóquio, Reçber eliminou o brasileiro. Mas não foi só uma derrota. Aquela luta jogou Netinho na realidade. Meses antes de ir às Olimpíadas, ele perdeu o pai, seu maior amigo e confidente. Triste, fraco e sem o ponto de equilíbrio, tentou encarar todas as dores do mundo e os desafios dos Jogos Olímpicos sozinho. E Falhou.

Eu perdi um pilar muito grande que me sustentava ali nas horas que eu não tinha para quem recorrer. Eu acho que era sempre o meu pai. A partir do momento em que meu pai partiu, eu não tinha essa pessoa.

Depois da derrota em Tóquio, Netinho mudou. Procurou um coach, passou a falar de seus problemas e a lidar com eles de forma mais aberta. Aprendeu a aceitar a dor.

Foi esse Netinho que colocou a medalha de bronze no peito em Paris. Derrotado na primeira luta, paciente para esperar uma segunda chance e decidido a não deixá-la escapar.

"Na minha cabeça eu fiquei assim: mano, vai ser só mais uma luta. Não, vamos colocar isso na cabeça de que agora é uma revanche. Depois que ganhei dele, eu falei 'agora, sim'".

Ainda faltava a luta do bronze, mas o ciclo de Netinho já estava fechado: o mesmo rival que o jogou na realidade em Tóquio abriu o caminho para a luta de sua vida. "Eu pensei: é agora, é a de bronze. Falei que ninguém ia tirar isso de mim".

E ninguém tirou.

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Doping quase minou os planos

Estar nos Jogos Olímpicos, por si só, já foi algo improvável para Netinho.

Ele foi campeão Pan-Americano em Santiago, em 2023. Mas no fim do ano passado, veio o anúncio de que fora flagrado em um exame de doping, realizado antes da competição no Chile. A substância não foi divulgada.

Inicialmente, o brasileiro alegou inocência. Mas a estratégia da defesa foi fazer um acordo e colocar o atleta em suspensão voluntária por 30 dias. Logo, entre dezembro e meados de janeiro deste ano, ficou sem poder treinar.

Apesar do risco à carreira e aos resultados, Netinho, oficialmente, manteve a medalha do Pan. A defesa argumentou que o uso da substância proibida não foi por algo relacionado à performance esportiva e conseguiu convencer os julgadores.

Outro problema durante o afastamento foi manter o controle mental. De volta à ativa, ele retornou à forma rapidamente, não caiu tanto no ranking e conseguiu a vaga em Paris 2024 na seletiva continental. Tudo isso veio à nota nas lutas olímpicas.

"Toda vez que eu entrava ali eu pensava nisso, eu pensava: 'Pô cara, passei por umas coisas aí que eu nem acreditava que eu ia estar aqui. Por que é que eu vou deixar passar essa oportunidade?' Então, com certeza, isso me deu muitas forças para estar aqui medalhando", disse ele.

Os outros medalhistas olímpicos do taekwondo

  • Natália Falavigna

    Natália Falavigna faturou o bronze em Pequim 2008 (categoria acima de 67 kg). Na ocasião, ela caiu nas semifinais diante da norueguesa Nina Solheim. Mas venceu a sueca Karolina Kedzierska na disputa pela medalha.

    Imagem: Ezra Shaw/Getty Images
  • Maicon Siqueira

    Maicon Siqueira conquistou o bronze na Rio 2016 (acima de 80kg). Ele fez o caminho da repescagem porque Abdoul Razak Issoufou, do Níger, foi finalista. Na disputa pela medalha, desbancou o britânico Mahama Cho.

    Imagem: Jamie Squire/Getty Images
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Salvo na repescagem

O formato de disputa do taekwondo nos Jogos Olímpicos força uma situação curiosa: como todos os atletas derrotados pelos finalistas entram na repescagem, quem perde no começo precisa torcer.

No caso de Netinho, a torcida foi por Zaid Kareem, da Jordânia. Logo na estreia, o brasileiro perdeu o duelo em três rounds. A única chance de brigar por uma medalha era se o rival vencesse as duas lutas seguintes.

"Eu estava muito confiante de que quem passasse na primeira luta iria ter a final. Foi o que tivemos na cabeça, nos mantivemos concentrados. Confiamos no jordaniano, que é um fenômeno. Conseguimos", disse o brasileiro.

Fiquei ali no Instagram, fiquei falando com a namorada, com a minha mãe, todo mundo: "Ah, ele vai para o final e eu vou, galera. Vamos deixar as coisas acontecerem". Então, quando ele fez o último ponto que ele ganhou, aí, sim, a gente torceu bastante.

A torcida deu certo: primeiro, Kareem passou pelo turco Hakan Reçber, nas quartas de final. Depois, em uma luta emocionante, passou pelo espanhol Javier Pérez Polo. O jordaniano abriu uma porta para a medalha de Netinho.

Dali pra frente, era com ele. Netinho, então, venceu justamente os adversários que Zaid deixou para trás. E conquistou o pódio.

Assim que eu perdi hoje, eu me senti que eu estava bem, não estava entendendo porque eu tinha perdido a luta. Na minha cabeça, já tava pensando: "Não, vou de novo". Não sei se eu troco de categoria ou se eu fico nessa, porque essa categoria de ninja as lutas são sempre muito árduas. Então, eu acho que o bronze ficou com gostinho aí de que a gente pode pegar um ouro, quem sabe, futuramente."

Edival Pontes, o Netinho, medalhista de bronze, sobre a caminhada em Paris e o futuro

Wander Roberto/COB Wander Roberto/COB

Vida longe de casa de um garoto promissor

Netinho ficou até 15 anos em João Pessoa. O avanço tecnológico acelerou a saída de casa.

Na capital paraibana, ele continuou treinando com o colete convencional, perdeu o ritmo de treino e às vezes não achava tempo para manter o taekwondo na agenda.

Mas como queria levar o esporte a sério, a primeira mudança foi para Brasília, como mestre Washington.

A partir daí, a carreira começou a decolar de vez. Chegou à seleção juvenil e ganhou o Mundial da categoria e a Olimpíada da Juventude, em 2014.

O primeiro ciclo olímpico, em Tóquio, chegou quando ele já treinava no interior de São Paulo, sob a tutela de Nicholas Pigozzi e Carmen Carolina — a primeira atleta da modalidade a ir a uma edição de Jogos Olímpicos, em Sydney 2000.

Como os dois técnicos estavam em vias de mudança para os Estados Unidos, Edival se juntou a Diego Ribeiro, técnico da seleção, e passou a treinar em Itaboraí (RJ). Essas mudanças todas o transformaram em um medalhista olímpico.

Os medalhistas brasileiros

  • Larissa Pimenta (bronze)

    A chave é acreditar: Larissa é bronze no judô depois de muita gente (até uma rival) insistir que ela era capaz.

    Imagem: Wander Roberto/COB
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  • Willian Lima (prata)

    Dom e a medalha de prata: Willian sonhava em ganhar a medalha olímpica, e com seu filho na arquibancada. Ele conseguiu.

    Imagem: Wander Roberto/COB
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  • Rayssa Leal (bronze)

    Tchau, Fadinha. Oi, Rayssa: Três anos depois da prata em Tóquio, brasileira volta ao pódio em Paris e consolida rito de passagem.

    Imagem: Kirill KUDRYAVTSEV / AFP
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  • Equipe de ginástica (bronze)

    Sangue, suor e olho roxo: Pela primeira vez na história, o Brasil ganha medalha por equipes na ginástica artística. E foi difícil...

    Imagem: Ricardo Bufolin/CBG
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  • Caio Bonfim (prata)

    Buzina para o medalhista: Caio conquista prata inédita na marcha atlética, construída com legado familiar e impulso de motoristas.

    Imagem: Alexandre Loureiro/COB
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  • Rebeca Andrade (prata)

    'Paro no auge': Rebeca leva 2ª prata, entra no Olimpo ao lado de Biles, Comaneci e Latynina, e se aposenta do individual geral.

    Imagem: Rodolfo Buhrer/Rodolfo Buhrer/AGIF
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  • Beatriz Souza (ouro)

    Netflix e Ouro: Bia conquista primeiro ouro do Brasil em Paris após destruir favoritas e ver TV.

    Imagem: Alexandre Loureiro/COB
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  • Rebeca Andrade (prata)

    Ninguém acima dela: Rebeca ganha sua quinta medalha olímpica, a prata no solo, e já é recordista em pódios pelo Brasil.

    Imagem: Stephen McCarthy/Sportsfile via Getty Images
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  • Equipe de judô (bronze)

    O peso da redenção: Brasil é bronze por equipes no judô graças aos 57kg de Rafaela Silva.

    Imagem: Miriam Jeske/COB
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  • Bia Ferreira (bronze)

    A décima: Bia Ferreira cai para a mesma algoz de Tóquio, mas fica com o bronze e soma a décima medalha para o Brasil.

    Imagem: Richard Pelham/Getty Images
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  • Rebeca Andrade (ouro)

    O mundo aos seus pés: Rebeca Andrade bate Simone Biles no solo, é ouro e se torna maior atleta olímpica brasileira da história.

    Imagem: Elsa/Getty Images
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  • Gabriel Medina (bronze)

    Bronze para um novo Medina: Renovado após problemas pessoais e travado por mar sem onda, Medina se recupera para conquistar pódio olímpico.

    Imagem: Ben Thouard / POOL / AFP
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  • Tatiana Weston-Webb (prata)

    Ela poderia defender os Estados Unidos, mas fez questão de ser brasileira e ganhou a prata de verde e amarelo

    Imagem: William Lucas/COB
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  • Augusto Akio (bronze)

    Com jeito calmo, dedicação e acupuntura, Augusto Akio chegou ao bronze. Mas não se engane: ele é brasileiro

    Imagem: Luiza Moraes/COB
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  • Edival Pontes (bronze)

    Bronze sub-zero: Edival Pontes, o Netinho, conheceu o taekwondo quando ia jogar videogame; hoje, é bronze na 'categoria ninja'

    Imagem: Albert Gea/REUTERS
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  • Isaquias Queiroz (prata)

    Esporte de um homem só - Isaquias Queiroz segue soberano na canoagem e se torna 2º maior medalhista brasileiro da história olímpica.

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  • Alison dos Santos (bronze)

    Piu supera tropeços em Paris, mostra que estava, sim, em forma e conquista seu segundo bronze olímpico.

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  • Duda e Ana Patrícia (ouro)

    Dez anos depois do título nos Jogos Olímpicos da Juventude, Duda e Ana Patrícia são coroadas em Paris

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  • Futebol feminino (prata)

    Prata da esperança - Vice-campeã olímpica, seleção feminina descobre como voltar a ganhar e mostra que o futuro pode ser brilhante.

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  • Vôlei feminino (bronze)

    Evidências - Programada para o ouro, seleção de vôlei conquista um bronze que ficou pequeno para o que o time fez em Paris.

    Imagem: REUTERS/Annegret Hilse
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