Agora é cartola

Futuro gestor, Prass analisa Abel Ferreira e Jesus, critica futebol brasileiro e lembra saída do Palmeiras

Beatriz Cesarini, Danilo Lavieri e Vanderlei Lima Do UOL, em São Paulo Marcello Zambrana/AGIF

Ex-goleiro Fernando Prass, não. Ou pelo menos, não só isso. O gaúcho de 43 anos agora quer ser conhecido como gestor de clubes de futebol. Ídolo de times como Palmeiras e Vasco, ele está estudando administração de empresas e já dá pitacos sobre os bastidores do mundo da bola no Brasil e no mundo.

Quando a comparação entre Abel Ferreira e Jorge Jesus foi colocada em jogo durante o papo no UOL Entrevista, na sexta-feira (18), no Canal UOL, Prass foi assertivo. Disse que o português que comandou o vitorioso Flamengo de 2019 não é superior ao conterrâneo do Palmeiras.

"O jardim do vizinho é sempre mais verde. Nos últimos anos, ninguém ganhou mais títulos que o Palmeiras e duvido que o torcedor trocaria as últimas conquistas. Foi legal o Jorge Jesus, mas é muito pouco analisar por apenas um ano que ele fez. O Abel agrega muito ao futebol brasileiro, principalmente na questão tática. Ele é muito exigente nessa questão e há uma falsa ideia de que isso mata a técnica, pelo contrário. O Dudu é um exemplo.

Se o Dudu não marcar, mais difícil vai ser para recuperar a bola. Ou seja, menos tempo com a bola. Isso vale para o time todo. Um time que não se esforça para recuperar a bola é um time que fica menos com a bola. Então, se você quer ter um time que tenha posse de bola, você precisa de empenho para recuperar a bola".

Fernando Prass também fez duras críticas à estrutura do futebol brasileiro, pediu pela união dos clubes e projetou o seu futuro como administrador. E já avisou que poderá contribuir com administração de qualquer clube, até no rival Corinthians. Para isso, a figura do goleiro vitorioso precisa ficar um pouco de lado para dar espaço à de gestor.

Marcello Zambrana/AGIF

"Faltou ganhar uma Libertadores, disputar o Mundial"

Palmeiras tomou a decisão certa no mundial

A avaliação de Fernando Prass sobre a atuação do Palmeiras no Mundial de Clubes é positiva. Apesar da derrota por 1 a 0 para o Chelsea, na prorrogação, o ídolo alviverde considerou correta a estratégia de Abel Ferreira para o confronto contra o clube britânico.

O Palmeiras conseguiu equilibrar o jogo justamente pela questão defensiva. Se jogasse mais para frente, talvez fosse mais fácil para o Chelsea. Acho que o Palmeiras tomou a decisão certa, só não tomou a decisão mais romântica, a que os torcedores e parte da mídia queriam, até porque o Chelsea tem um elenco acima."

Marcello Zambrana/AGIF Marcello Zambrana/AGIF

Futebol brasileiro tem um delay de 25, 30 anos

A dificuldade em vencer um clube europeu no Mundial da Fifa passa pelo atraso do Brasil quanto à organização estrutural e financeira do futebol, segundo Prass. O gaúcho fez críticas ao calendário de campeonatos, à arbitragem e à desigualdade entre os clubes, que acaba gerando falta de competitividade.

"A gente fala a tanto tempo da questão do calendário que acabamos nos acostumando, então é bom que cheguem pessoas de fora e falem o quanto esse calendário é um absurdo. O Abel, assim que chegou, falou muito disso. Eu falava desde 2013. Ou seja, 10 anos se passaram e nada mudou. Tem time em Portugal que é SAF (Sociedade Anônima de Futebol) há 25, 30 anos e no Brasil só foi aprovado agora. Em um mundo globalizado, é inadmissível esse delay. Precisamos muito evoluir, não tem como treinar ou descansar nesse calendário", comentou.

"Sobre a arbitragem, hoje tudo é profissional, até o gandula é profissional. O único amador é o árbitro. Os clubes faturam quase R$ 1 bilhão e deixam a partida na mão de um cara amador. É muito amadorismo na gestão para não ter uma profissionalização", acrescentou.

Na Europa, a competitividade é sempre muito alta em qualquer campeonato. Por isso o debate do futebol tem que ser mais coletivo do que o modo individualista que é hoje."

Fernando Prass

Tullio Puglia - FIFA/FIFA via Getty Images

Brasil precisa da mesma competitividade da Europa

Apesar da ligação com o Palmeiras, Prass entende que não é bom para o futebol brasileiro como um todo que apenas poucos times vençam. Para ele, só alta concorrência durante a temporada inteira, entre a maioria das equipes, pode igualar as coisas.

"O único jeito para melhorar o futebol brasileiro é pensar no coletivo. Hoje, Palmeiras, Flamengo e Atlético-MG são o topo do futebol nacional, mas só jogam em alta competitividade por pouco tempo no ano. E entre eles. Quando vão enfrentar um Chelsea, um Real Madrid, que são times que jogam em alta competitividade no ano todo, além de terem um calendário organizado, fica difícil", destacou Prass.

"Após sofrer a goleada por 5 a 0 do Manchester City, na Liga dos Campeões, Ruben Amorim, treinador do Sporting, falou que o time inglês é uma faculdade e o Sporting é uma escola primária. Isso tem muito a ver com a parte de elevar a competitividade e de não ter uma hegemonia de dois, três times. A gente se baseia muito no resultado, um exemplo é o meu: se eu tivesse errado o pênalti em 2015, contra o Corinthians, ninguém falaria que eu treinei bem na semana, mas que não deveria inventar do goleiro bater pênalti", concluiu.

Marcello Zambrana/AGIF

O gestor Fernando Prass

Além de cursar administração de empresas, Fernando Prass já fez estágios no Palmeiras, no Lyon e no Valladolid desde a sua aposentadoria como goleiro. Ele fará participações como embaixador do Alviverde na HBO Max durante o Paulistão, mas o que ele quer mesmo é ir para o lado da cartolagem.

Recentemente, inclusive, esteve em conversas avançadas com o Vasco, chegou a deixar tudo encaminhado para voltar a trabalhar no clube do Rio de Janeiro, mas a "descoberta" de novas dívidas impediram o acerto.

"O presidente do Vasco me ligou. Eu estava até com o Juninho Pernambucano, em Lyon. Estávamos com tudo acertado para eu ser o gerente de futebol, mas ainda não tinha o executivo de futebol, que eu entendia que seria o meu superior e acho que, para ser contratado, teria que ter a aprovação do executivo. Eu falei isso para o presidente e acertamos de esperar. Tempos mais tarde, o Salgado me ligou e falou que não seria possível a minha contratação porque tinha achado questões financeiras que não estavam previstas", lembrou.

Tenho um amigo no Palmeiras que, quando surgiu a ideia de processar os responsáveis por gerir mal o clube, ele foi contra. Eu perguntei porque ele era contra e ele me disse que se fosse processar o presidente que fazia dívida, ninguém aceitaria ser presidente."

Fernando Prass

Ale Cabral/AGIF Ale Cabral/AGIF

Não adianta gastar tudo pensando em ganhar

Durante a entrevista, Prass bateu várias vezes na tecla de responsabilidade de gestão. Enquanto jogador, ele era um dos poucos que ia a público cobrar melhores condições para os atletas, regulamentação do setor e brigas por direitos no futebol. Agora, fora de campo, reforça a sua preocupação.

Ele destaca que é muito fácil um dirigente entrar, gastar o dinheiro de várias gestões e sair sem nenhuma responsabilidade depois do término de seu mandato. O segredo de um clube com futuro, para Prass, é o que sabe ser sustentável. E isso não significa, necessariamente, se transformar em uma Sociedade Anônima de Futebol, as famosas SAFs.

"A SAF não é a solução dos problemas. A questão central não é o modelo de administração, mas sim o modo que ele administra, com uma gestão sustentável e responsável. Agora, se perguntar qual eu prefiro, eu prefiro a SAF porque ela te oferece mais saídas do que em um quadro associativo, muito mais ferramentas para administrar. Se você vai viajar para o interior de SP, só vai pela Castelo, que é o único caminho. Esse seria o modelo associativo. Agora a SAF teria mais opções, a Bandeirantes, a Anhanguera, que aí vai do seu estilo, se você quer um caminho mais rápido, mas com pedágio, ou um que pode até ser mais longo, mas sem pedágio e por aí vai. Por isso o mais importante é ter um modelo de gestão sustentável."

Ale Cabral/AGIF

Como gestor, teria conduzido saída do Palmeiras de outra maneira

Em todas as suas entrevistas que deu desde a saída do Palmeiras, Fernando Prass não escondeu a mágoa que tem com Alexandre Mattos, então diretor de futebol do Alviverde. O ex-goleiro conta que foi chamado no meio de um churrasco de confraternização para receber a notícia e que jamais agiria assim se fosse o gestor.

"Eu sempre deixei aberto o canal de conversa, mas foi mal conduzido. Me falaram que não iriam renovar comigo durante um churrasco. Eu estou indo para o lado da gestão, por isso se fosse eu no lugar dele, teria feito diferente", analisou.

Na época, Prass foi dispensado e Jailson, que também estava no fim do seu contrato, recebeu uma proposta de renovação.

"Hoje eu vejo da maneira mais natural possível. Eu já tinha conversado com o preparador de goleiros, com a diretoria e até com o próprio Mano Menezes (o técnico na época). Eu comentava que não fazia sentido ter no elenco três goleiros com mais de 30 anos, então sabia que se saísse o Jaílson naquele ano, eu sairia no próximo".

Saída foi anunciada em um churrasco

Mauro Horita/AGIF

No futuro, Prass se vê trabalhando nos bastidores de times rivais

Prass sabe que a sua imagem vai sempre ter alguma ligação com os clubes em que jogou, especialmente o Palmeiras, onde acabou sendo mais vencedor. Para ele, no entanto, isso é um problema que o atrapalhará apenas no curto prazo. Ele ainda destacou a importância de os clubes contratarem ex-jogadores que estejam de fato preparados para o cargo, uma vez que a experiência dentro de campo nem sempre é útil na hora de gerir uma equipe.

"Óbvio que eu adoraria trabalhar em clubes com o qual eu tenho identificação, até porque já conheço algumas pessoas de lá, mas também passa a impressão de que você está ali só porque é ex-jogador. Ser um ex-jogador não te garante em nada. Você pode ser um jogador medíocre e um ótimo administrador, não te garante nada", afirmou.

"Eu não me vejo trabalhando no Corinthians ou em um rival a curto prazo. Isso porque ainda está muito recente, me vinculam com a imagem de um ex-jogador, e não a de um dirigente. Então, eu ainda tenho que passar por uma quarentena natural. O Alex, por exemplo, é ídolo do Palmeiras e hoje é treinador do São Paulo", relembrou.

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