Dois comprimidos de seis miligramas de Lexotan, um hipnótico que costuma funcionar para crises de ansiedade e agitação. Duas taças de vinho tinto, típicas do almoço de confraternização com colegas jornalistas após um grande evento. Duas ligações estrondosas que culminaram numa briga familiar num momento pouco propício para que tudo fosse resolvido. Não necessariamente nessa ordem.
A combinação de decisões tomadas naquele 9 de julho de 2006 fizeram Fernando Vanucci acreditar, por uma década, que toda sua trajetória dentro do jornalismo esportivo havia desabado num sopro. A transmissão da RedeTV na final do Mundial na Alemanha, em que a Itália venceu a França nos pênaltis (e o Brasil já havia sido eliminado fazia tempo), se tornou o primeiro viral de Copa da internet. Foi um baque para Vanucci. Mas não só para ele.
O editor-chefe de esporte da emissora, que acompanhava do switcher a abertura do programa Bola na Rede, se desesperou. No ponto, pedia que Vanucci chamasse o intervalo, mas o narrador deu de ombros. Quando a fatídica frase "A África do Sul nem é tão longe assim, é logo ali", Marcio Ogata derrubou o programa sem transição.
A audiência da RedeTV à época, com a TV Globo sendo quem detinha os direitos de transmissão da Copa do Mundo, era inexpressiva. Foi o que, por um momento, tranquilizou Vanucci e a equipe que acompanhava o programa. Num período em que os celulares ainda tinham como função principal ser um telefone e o YouTube tinha acabado de ser lançado, não tinha como o vacilo de Vanucci viralizar. Mas viralizou.
Os dias que seguiram foram dolorosos para ele, que foi um dos pioneiros no que hoje é comum, o jornalismo esportivo irreverente. Teve uma carreira sólida e brilhante, se tornou uma das principais vozes do futebol brasileiro, e sonhava com outro destino para os anos que encerrariam seu ciclo profissional. Não foi possível.
Vanucci gostaria que o episódio infeliz fosse esquecido, mas, como não foi, precisou ser ressignificado. Em 2018, estreou um programa no UOL denominado "A Rússia é logo ali", com referência ao bordão do dia que ele, inicialmente, queria esquecer. Durante os 31 dias de Copa do Mundo, o narrador foi o rosto do UOL Esporte para as principais notícias do torneio. Dois anos depois, morreu vítima de infarto. Seu legado, entretanto, permanecerá para sempre vivo.