Missão Belfort na NFL

Davi Belfort, filho do lutador de MMA Vitor Belfort, pode se tornar o primeiro quarterback brasileiro na NFL

Lucas Tieppo Colaboração para o UOL em São Paulo Arquivo pessoal

O caminho para se tornar uma estrela do futebol americano é longo e requer uma preparação de nível profissional para aqueles garotos que sonham se tornar uma estrela da bola oval. O funil para entrar na maior liga do esporte é apertado, a concorrência é grande e o trabalho começa anos antes da estreia como profissional. Mas, se é para sonhar alto, o ideal é começar cedo e cercado de todo a estrutura disponível para chegar lá.

É assim que Davi Belfort, filho do lendário lutador de MMA Vitor Belfort, encara o desafio para construir desde já, aos 15 anos, uma carreira como quarterback, a principal posição do futebol americano, de sucesso da NFL.

O futuro parece promissor. O adolescente tem alguns pontos a seu favor. Além de uma família que valoriza o esporte, tem acesso aos melhores técnicos e locais de treino, pratica o esporte com jogadores profissionais e já até conseguiu mesmo uma bolsa universitária para jogar futebol americano.

O adolescente pode ser o primeiro brasileiro a se tornar quarterback na NFL, mas sabe que o caminho é longo — pelo menos sete anos — e cheio de responsabilidades. Mas, apesar de não colocar pressão em si mesmo, treina muito para não ficar para trás e quer servir de inspiração para que crianças brasileiras saibam que também podem jogar futebol americano.

Arquivo pessoal

Assista à entrevista de Davi e Vitor Belfort

Portas abertas para a universidade

Nos Estados Unidos, as trajetórias estudantil e esportiva de quem sonha se tornar jogador da NFL estão interligadas. O caminho é um só: high school (equivalente ao ensino médio brasileiro), universidade e Draft (recrutamento de atletas das equipes universitárias). Geralmente, jogadores com potencial ganham uma bolsa de estudos para atuar no futebol universitário e, no futuro, candidatam-se ao Draft da liga. Essa oferta costuma acontecer quando os atletas/estudantes estão no segundo ano do high school, faltando dois para entrar na universidade.

Para Davi, no entanto, a oferta da Universidade do Estado do Arizona chegou bem antes do esperado. Aos 15 anos e prestes a iniciar o high school, o jovem já possui uma porta de entrada no futebol americano universitário.

"Não estou preocupado. Na minha cabeça eu não tenho essa oferta. Estou preocupado em ser a melhor versão de mim mesmo todos os dias. Mas não quero me acomodar com isso. Quero sempre evoluir. Nem entrei na high school ainda. Tenho muito a provar", disse Davi.

A oferta veio por meio do técnico particular do jovem, Chris Flores, um dos maiores especialistas em desenvolvimento de atletas de futebol americano. Ele enviou vídeos dos treinos para colegas na Universidade do Arizona e logo veio a ligação com a oferta de bolsa de estudos.

Davi já foi procurado por outras três universidades, que não ainda ofereceram bolsa de estudo, mas ainda acha muito cedo para se comprometer com qualquer uma delas.

Fiquei feliz também porque meus pais não vão precisar pagar a universidade. É muito caro. Farei de graça e só jogarei

Davi Belfort

Arquivo pessoal/Instagram @davibelfort

Rotina de profissional aos 15 anos

Davi é parte de uma família que leva o esporte profissional a sério. Não é preciso lembrar que Vitor Belfort é um dos maiores lutadores da história e tem no seu entorno profissionais bem preparados. Aos 43 anos, o pai segue a rotina de atleta de alto nível e agora passa para o filho esse legado.

Enquanto o pai conversava com o UOL Esporte, Davi passava por uma sessão de fisioterapia em uma das principais clínicas dos Estados Unidos, na Flórida. O local recebe astros do esporte. Davi também treina boxe com o pai, é acompanhado de perto pelo técnico particular Chris Flores, faz sessões de treinos com jogadores da NFL, se exercita na academia da família, a Belfort Fitness Lifestyle, e joga pela escola na Flórida.

Após a entrevista, por exemplo, Vitor Belfort treinou boxe com o ex-jogador Ray Lewis, um dos maiores defensores da história da NFL. Nas redes sociais, o lutador registrou o encontro de Lewis com o filho e o chamou de "mentor" da carreira do jovem. Outros atletas da NFL também procuram Belfort para treinar e receber mentoria de carreira. E Davi aproveita o embalo para ter contato com estrelas que poucos garotos de 15 anos que sonham ser jogador têm.

"Eu treino boxe com meu pai na academia BFL. O boxe é muito similar com a posição de quarterback. Muitos jogadores da posição, como o Russell Wilson (do Seattle Seahawks), treinam. O movimento é similar dos dois esportes", analisou Davi.

O Davi já tem uma rotina de atleta profissional. Tem que estar focado no processo, falo para isso para ele sempre. Não pode pensar no destino. Muita gente sonha, mas não trabalha para chegar. Tem o caminho até o sonho

Vitor Belfort, lutador de MMA

Arquivo pessoal

Família Belfort SA

Como qualquer adolescente de 15 anos, a carreira de Davi é conduzida pelos pais, Vitor Belfort e Joana Prado. Joana é vista como a head coach, a técnica principal que conduz a organização familiar. Além de Vitor na luta e Davi no futebol americano, a família ainda tem Kyara na ginástica e Vitória no vôlei.

"Sei que o físico é importante, mas nos meus 16 anos de casada com um atleta de ponta, descobri que o treinamento mental e um bom ambiente, um lar saudável, são fundamentais para uma boa performance", analisa Joana.

Vitor e Joana esperam que os filhos também pensem grande fora dos campos e quadras e usem a trajetória dos pais como modelo de negócio. Hoje, o casal trabalha para expandir a Belfort Fitness Lifestyle para o Brasil, além de outros negócios, para cuidar não só do corpo das pessoas, mas também da mentalidade.

"Como mãe, tenho que ensinar meus filhos que o esporte e a educação andam juntos e mostrar a eles que o aprendizado os ajudará a não somente analisar e assinar bons contratos, mas também a discernir e fechar excelentes negócios. Acho que o Vitor me chama de head coach porque enxergo o treinamento como um todo", explicou Joana.

"Uma família é como uma empresa, tem a área financeira, a do marketing, o recurso humano. Não é diferente", completou Vitor.

Meus pais me ajudam muito. Meu pai é de outro esporte, mas a mentalidade é a mesma. Muitos jogadores da NFL treinam com ele na offseason [intertemporada]. Aprendo sobre a mentalidade, recuperação, o treino físico. Eles são meus mentores número um

Davi Belfort

Arquivo Pessoal/Instagram @davibelfort

Caminho até a NFL tem muita pressão

O auge de qualquer atleta de futebol americano é jogar na NFL, mas chegar lá e se manter é uma das missões mais difíceis do esporte de alto nível. Inúmeros jogadores já passaram por todo o caminho: jogaram no ensino médio, tiveram carreira consolidada na universidade e foram escolhidos no Draft, mas acabaram fracassando.

Davi tem talento, acesso a uma estrutura profissional e apoio da família. O garoto foi escolhido o principal nome da sua faixa etária da Flórida e o 14º de todo o país. "Eu não sinto essa pressão. Claro que existe, mas não olho assim. Fui o primeiro quarterback brasileiro a receber uma bolsa de estudo. É uma benção. Quero mostrar para as crianças [brasileiras] que podem jogar futebol americano e não só futebol", afirmou Davi.

Já o pai, Vitor, admite a pressão e gosta dela. Para ele, o filho só tem a ganhar. "Diamante cresce na pressão. Feijão, carne, tudo que vai na pressão fica melhor. Uma criança cresce na pressão. Tudo que tem pressão é bom. Tem que saber lidar com isso."

Apesar da empolgação típica da idade, Davi sabe que o caminho é longo e que a oferta da Universidade do Arizona é um grande passo, mas não definitivo. "É um projeto que vai demorar ainda, são sete ou oito anos até o Draft, mas estamos preparando agora para quando chegar lá, esteja na frente. Tenho essa oferta, mas não significa nada. Tenho muito a fazer ainda."

Arquivo pessoal/Instagram @davibelfort

Oportunidade de aprender com astros da NFL

Jogadores de alto nível da NFL são verdadeiras estrelas e o acesso a eles é praticamente impossível para a maioria dos garotos que sonham jogar na liga. Não para Davi. O garoto tem passe livre com grandes nomes do esporte, já que o pai ensina boxe para diversos atletas fora da temporada.

Na offseason, por exemplo, Davi lançou bolas para Travis Kelce, campeão com o Kansas City Chiefs, Mark Ingram, do Baltimore Ravens, e CeeDee Lamb, atleta do Dallas Cowboys. O astro Ray Lewis (foto) foi chamado de "mentor" do filho por Belfort.

"Fui abençoado por ter contato com vários jogadores da NFL e tento aprender com eles. São de outras posições, mas converso sobre o jogo, o que fariam diferente na trajetória deles", contou Davi.

O quarterback é um lutador do campo. O Davi tem que acertar a bola dele no queixo ou nariz do wide receiver, de quem está recebendo a bola. A diferença é que tenho que acertar no meio adversário. A mecânica é a mesma. Pés, quadril, o giro do corpo, é igualzinho a um soco

Vitor Belfort

Rob Carr / AFP

Estilo de jogo inspirado em astro

Davi mede atualmente 1,82m e, a julgar pela estatura dos pais (Joana tem 1,70m e Vitor tem1,83m), é improvável que ele ultrapasse a barreira de 1,90m. Historicamente, a posição de quarterback na NFL era ocupada por atletas maiores e com pouca mobilidade. Mas isso tem mudado e, cada vez, mais jogadores mais baixos e ágeis têm atuado.

Russell Wilson (foto acima), um dos melhores jogadores da posição, mede 1,80m. Já Kyler Murray, escolha número 1 do Draft de 2019, mede 1,78m.

"Tem vários caras em quem eu me inspiro. Um deles é o Russel Wilson. Ninguém conhecia ele no high school, teve só uma oferta de universidade e hoje é um dos melhores da NFL", explicou o jovem.

Davi conta que, nos treinamentos com nomes consagrados do esporte, sempre pergunta o que pode fazer para melhorar. "Eu tento pegar as melhores qualidades deles".

Streeter Lecka/Getty Images/AFP

Davi quer quebrar barreiras na NFL e servir de inspiração

Atualmente, o Brasil só tem um atleta na NFL. Cairo Santos (foto acima) foi o primeiro a atuar na liga, mas o kicker do Chicago Bears joga em uma posição menos prestigiada que o quarterback. Outro brasileiro que tenta a sorte na maior liga de futebol americano do mundo é Durval Queiroz, o Duzão, que segue no practice squad (elenco de treinos) do Miami Dolphins.

Davi já se tornou o primeiro brasileiro a receber uma oferta de bolsa de estudos para jogar futebol americano universitário como quarterback, mas o objetivo é romper a última barreira. "Quero levar a bandeira do Brasil na NFL".

Apesar do crescente número de fãs do esporte no Brasil, o acesso a quem sonha jogar na NFL ainda é bastante restrito, seja pelas universidades ou por programas internacionais da liga, como o que levou Duzão aos Dolphins.

Aos 15 anos, o jovem Davi parece conhecer o tamanho das responsabilidades que o futuro lhe reserva e não foge delas. "Ter alguém grande do país na NFL pode ser uma inspiração para crianças no Brasil", finalizou.

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