Fla Ostentação

Primeiro título de "Era Rica" do Rubro-negro era considerado obrigação e traz ansiedade por novas conquistas

Alexandre Araújo, Bernardo Gentile e Vinicius Castro Do UOL, no Rio de Janeiro Thiago Ribeiro/AGIF

A imagem dos jogadores do Flamengo levantando a taça do Campeonato Carioca era esperada - até pela maioria dos torcedores rivais - desde a primeira rodada da competição. Nos bastidores, embora o discurso político estivesse sempre presente, o título também era tratado como obrigação. Ainda que tenha vencido o Estadual em 2017, a edição de 2019 foi a primeira conquistada a partir do momento em que o clube desandou a comprar jogadores.

A explicação é simples. Apenas em direitos econômicos recentes, incluindo aí as aquisições que movimentaram a torcida, casos de Everton Ribeiro, Vitinho, Rodrigo Caio, Arrascaeta e Bruno Henrique, o Flamengo gastou mais de R$ 180 milhões. Um poderio financeiro incomparável no Rio de Janeiro e diante do qual títulos são imaginados como consequência natural.

O Campeonato Carioca veio por um caminho tranquilo e em muitos jogos até com os reservas atuando - todo o elenco foi utilizado pelo técnico Abel Braga. Se por um lado a conquista referenda as escolhas e até alivia em parte a pressão, ao mesmo tempo traz novas cobranças e a expectativa por títulos expressivos. Eles ainda não são tão obrigatórios quanto o Estadual, mas já estão próximos de tal patamar.

Thiago Ribeiro/AGIF

"Disparidade do Fla no Carioca já era vista desde cedo"

Gilvan de Souza/Divulgação

Como o Flamengo atingiu isso?

O sucesso do Flamengo em campo, tendo jogadores "galácticos" no elenco, passa pelo êxito atingido fora das quatro linhas. O Rubro-Negro começou 2019 com um orçamento que girava em torno de R$ 750 milhões, sendo que, deste montante, uma fatia de R$ 200 milhões seria destinada ao futebol, com metade voltada a compra de direitos dos atletas.

Um ponto importantíssimo e que também possibilitou isso foi a venda de jogadores como Vinicius Júnior e Lucas Paquetá. O primeiro foi para o Real Madrid, da Espanha, em transação que envolveu 45 milhões de euros (cerca de R$ 164 milhões), enquanto o segundo foi para o Milan, da Itália, em tratativa que rendeu 35 milhões de euros (aproximadamente R$ 150 milhões).

Além disso, o clube controlou e diminuiu em pouco mais de 50% as dívidas. Tal ato, inclusive, foi uma das principais promessas de campanha do ex-presidente Eduardo Bandeira de Mello, em 2013, quando assumiu o clube pela primeira vez - teve dois mandatos até 2018. Atual presidente, Rodolfo Landim teve parcela de contribuição para o atual momento financeiro. Ele foi um dos responsáveis pela montagem do plano de recuperação do clube, justamente quando era vice de planejamento de Bandeira.

Quem são as estrelas milionárias?

  • Everton Ribeiro

    R$ 22 milhões (05/06/2017)

    Imagem: Luciano Belford/AGIF
  • Vitinho

    R$ 53 milhões (27/07/2018)

    Imagem: Alexandre VIdal/CR Flamengo
  • Rodrigo Caio

    R$ 22 milhões (29/12/2018)

  • Arrascaeta

    R$ 64 milhões (12/01/2019)

    Imagem: Alexandre Vidal / Flamengo
  • Bruno Henrique

    R$ 23 milhões (23/01/2019)

    Imagem: Alexandre Vidal/Flamengo
  • Gabigol

    Salário de mais de R$ 1 milhão/mês (11/01/2019)

    Imagem: Thiago Ribeiro/AGIF
Thiago Ribeiro/AGIF

A diferença nos cofres para os rivais

Após investir mais de R$ 100 milhões em contratações só na atual temporada, o Flamengo finalmente atingiu um novo status. No Rio de Janeiro, o cenário é ainda mais favorável, já que os principais rivais estão completamente afundados em dívidas e contam com pouco dinheiro para investir em atletas.

Botafogo, Fluminense e Vasco, por exemplo, utilizam em maioria as trocas de jogadores e negociações sem custos para reforçar os respectivos elencos, enquanto veem o maior rival abrir os cofres.

A diferença fica nítida também na folha salarial. O Flamengo gasta mais de R$ 12 milhões por mês com o departamento de futebol. Somados, Botafogo (R$ 3,5 milhões), Fluminense (R$ 3,5 milhões) e Vasco (R$ 4 milhões) não chegam ao valor.

Alexandre Vidal/ Flamengo

Abel: o antídoto para um ambiente conturbado

O primeiro nome anunciado pela gestão de Landim foi o de quem teria a missão de comandar o elenco: Abel Braga. A oficialização do acerto aconteceu ainda em dezembro, antes mesmo de a nova gestão assumir o clube. Era um desejo da diretoria, que via em Abel um técnico vitorioso e com a experiência necessária para conduzir um grupo com jogadores renomados e criticados pelos fracassos recentes. Landim teve conversas também com Renato Gaúcho e chegou a analisar o argentino Sampaoli, hoje no Santos.

A chegada do treinador para o início do ano aconteceu após o Flamengo ter nada menos do que 13 comandantes nos seis anos de Eduardo Bandeira de Mello. Alguns, inclusive, com duas passagens, como foi o caso de Dorival Júnior, que, coincidentemente, foi o primeiro e o último da lista.

Abel havia deixado o Fluminense em junho do ano passado, alegando um grande desgaste no dia a dia de trabalho. Considerado um técnico "caro", chegou a ser procurado pelo Santos e pelo próprio Flamengo (para substituir Maurício Barbieri) ainda em 2018, mas afirmou que só assumiria um time em início de temporada.

Thiago Ribeiro/AGIF

Arrascaeta virou um dilema para Abelão

O alto investimento no elenco e as diversas opções para a formação do time titular trouxeram também dor de cabeça a Abel Braga. O treinador se viu diante de um dilema: seis craques para apenas quatro vagas no setor ofensivo. Diego, Everton Ribeiro, Arrascaeta, Bruno Henrique, Vitinho e Gabigol lutavam pelo espaço na equipe.

Inicialmente, buscando manter a estrutura da equipe que já vinha do ano passado, Abel adotou o 4-3-3, tendo Cuéllar, Willian Arão, Diego, Everton Ribeiro, Bruno Henrique e Gabigol. Na disputa, sobraram Vitinho e Arrascaeta, justamente as duas maiores contratações da história do Flamengo.

Deixar Arrascaeta no banco despertou a ira dos rubro-negros, encantados com a qualidade técnica do uruguaio. Abel foi vaiado e, mesmo com o título, convive com pedidos de demissão nas arquibancadas e redes sociais.

Reginaldo Pimenta / Raw Image / Ag. O Globo

Título ameniza dor após perdas em CT

A conquista do Estadual ameniza um pouco o 2019 que começou conturbado pela maior tragédia da história do clube. O incêndio no CT Ninho do Urubu matou dez meninos das categorias de base e deixou outros três feridos.

Até o momento, apenas as famílias de Athila Paixão e de Gedinho, além do pai de Rykelmo, entraram em acordo com o Flamengo pelas indenizações. Os outros familiares ainda estão em negociação e não há prazo para resolução.

A dor pela perda de vidas tão jovens jamais será apagada, mas a conquista do Campeonato Carioca serve de homenagem aos meninos que sonhavam em brilhar no Maracanã.

Números da conquista

  • 4 títulos de vantagem

    O Flamengo ampliou a diferença no ranking do Carioca. Agora, são 35 títulos contra 31 do Fluminense.

  • R$ 12 milhões

    É quanto o Fla gasta mensalmente com o futebol. O valor supera os outros três grandes do Rio juntos.

  • R$ 3,5 milhões

    É a premiação do título embolsada pelo Flamengo. Metade do valor vai para o departamento de futebol.

  • R$ 110 milhões

    Foi o que o Flamengo investiu nas contratações de Arrascaeta, Rodrigo Caio e Bruno Henrique

Marcello Zambrana/AGIF

Brasileirão é outra história

A supremacia do Flamengo fora de campo se provou também dentro das quatro linhas no Rio de Janeiro. Com o fim do Campeonato Carioca, o Brasileirão se inicia, assim como a batalha do Rubro-negro para se impôr contra rivais no âmbito nacional. O Palmeiras é o principal deles, já que conta com forte parceria e possui um dos melhores elencos do país.

O Flamengo também deve ter dificuldades contra Cruzeiro e Grêmio. Apesar de sempre lutar pelas primeiras posições, o Rubro-negro ainda precisa de um título de expressão. Verdade seja dita, os cariocas falharam recentemente nos campeonatos mais importantes.

Conmebol/Divulgação

Obsessão por títulos de peso continua

O Estadual não é algo que o clube tenha comemorado tanto. Isso porque, a competição foi vista como uma obrigação pelos torcedores e dirigentes do Rubro-negro. A ânsia é por um título de expressão. O Flamengo disputa Copa do Brasil, Campeonato Brasileiro e Copa Libertadores, a principal obsessão do clube desde a primeira e única conquista, em 1981.

O Campeonato Brasileiro também é algo que tem sido bastante desejado pelos torcedores. A última conquista foi em 2009 sob o comando de Adriano e Petkovic. Após virar o "novo rico", o Rubro-negro tem o sonho de mudar o rumo da prosa. Em 2016, foi terceiro colocado e vice-campeão na temporada passada.

Kai Pfaffenbach/Reuters

Flamengo ainda vai ao mercado

Apesar do alto investimento feito, o elenco receberá novos nomes na janela do meio do ano. O Flamengo já tem um acerto com o lateral-direito Rafinha, atualmente no Bayern de Munique, da Alemanha. O jogador terá um vínculo de dois anos e chega no dia 1º de julho.

Além disso, a diretoria busca um segundo volante e um zagueiro, posições consideradas importantes no grupo. A zaga, inclusive, já era um setor apontado desde o começo, com a procura de um nome mais experiente após a despedida de Réver, que foi para o Atlético-MG. Um dos sondados foi Miranda, da Inter de Milão, mas as conversas não avançaram. Jemerson e Gil são os alvos atuais.

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