A chave é acreditar

Larissa Pimenta é bronze no judô depois de muita gente insistir que ela era capaz

Beatriz Cesarini do UOL, de Paris Wander Roberto/COB

Quando Larissa Pimenta desceu do tatame, ouviu de sua técnica, Sarah Menezes, que ela era campeã olímpica. A judoca, que tinha acabado de vencer não a final, mas a decisão da medalha de bronze, contra a campeã mundial Odette Giuffrida, não entendeu nada: "Mas eu fui bronze."

Para mim, você é campeã olímpica, Sarah Menezes, campeã olímpica em 2012 e, hoje, técnica da seleção feminina de judô do Brasil.

Esse elogio de quem já tinha subido ao pódio em uma Olimpíada resume bem o caminho que Larissa Pimenta teve de percorrer para se tornar a 26º medalhista olímpica do judô brasileiro, a terceira do Brasil hoje em Paris. Quando ela não acreditava, muita gente se esforçou muito para a convencer de que era possível.

"A Sarah é uma pessoa muito especial para mim. Lutamos muito juntas, aprendi muito com ela. Nada melhor que, nesse momento, estar com ela. Ela foi uma pessoa que acreditou muito em mim", admitiu a brasileira.

E todo o Brasil agradece por isso.

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O primeiro desafio: a morte da avó

A avó de Larissa se chama Maria do Carmo. "A minha maior motivação era ela. Falava que um dia queria me ver na televisão, nos Jogos Olímpicos, e eu me inspirava, falava: 'Vou dar isso para ela'. Porque dinheiro não traz felicidade, não traz nada. Eu queria muito trazer isso para ela, de me ver na televisão, ela amava".

Dona Maria do Carmo não chegou a ver a neta no pódio olímpico: morreu em 2015 e, por causa disso, a judoca quase deixou o esporte. "Passei uma época da minha vida bem difícil quando a perdi. Eu estava nos Jogos Escolares e foi bem difícil. Cheguei a parar de fazer judô".

Ela precisou de acompanhamento psicológico para voltar aos tatames e, quando retornou, ainda precisava encontrar um caminho para chegar à elite do esporte. E aí veio outra incentivadora, que acreditava mais em Larissa do que ela mesma.

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'Eu ia desistir. Era minha última competição'

"A Andreia Berti foi a pessoa que me colocou aqui de novo. Eu já não queria mais, ia desistir, era a minha última competição. Mas eu fiz 11 lutas e me levaram para o Pinheiros. Eu tinha só 14 anos e nem sabia o que era Pinheiros ou Olimpíada", conta Larissa. "A minha gratidão vai ser eterna. Ela foi mais do que técnica, é a minha segunda mãe na vida. Sempre cuidou de mim, sempre confiou".

Ao ir para um dos maiores clubes do esporte olímpico brasileiro, o status de Larissa mudou e ela entendeu que seria atleta. Foi no clube, por exemplo, que passou pela mudança que a tornou mais forte, capaz de virar medalhista olímpica: a subida de categoria.

Em 2019, ela ganhou quatro quilos e deixou a categoria ligeiro, para quem pesa até 48kg, para competir nos meio-leves, até 52kg. Além da possibilidade de mais músculos, ela ainda aproveitou o espaço que Erika Miranda, dona de quatro medalhas em mundiais que se aposentou em 2018, abriu.

Larissa agarrou a chance. No Campeonato Pan-Americano de judô de Lima, em 2019, conquistou a medalha de ouro com direito a vitória sobre a então veterana Sarah Menezes —a mesma que virou sua técnica.

Essa vitória mudou o status de Larissa em sua própria mente. Mas ainda faltava um degrau. E quem disse que ela poderia superá-lo foi uma adversária: a francesa Amandine Buchard, cinco vezes medalhista em mundiais.

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'Levanta que não acabou'

Esse terceiro incentivo aconteceu no ponto mais baixo do dia de Larissa: a única derrota que sofreu, justamente para Buchard. Nas quartas de final, a brasileira chorava pela eliminação e coube à francesa tirá-la do buraco.

"Quando terminou a luta, eu me joguei. E ela falou, levanta, não acabou ainda. Ela foi me levantar. Eu estava, tipo, 'acabou'. Mas realmente não tinha acabado." Buchard sabia por experiência própria: ela é dona de cinco medalhas de bronze em Campeonatos Mundiais. Portanto, em cinco vezes ela teve de se levantar após uma derrota para subir ao pódio.

Depois daquelas frases, Larissa ainda venceu alemã Mascha Ballhaus, na final da repescagem, e encarou um bicho-papão na decisão do bronze, a italiana Giuffrida. A vitória veio após punições. Quando ela percebeu que venceu, se ajoelhou e chorou. E nem teve coragem de olhar para sua técnica, Sarah.

"Quando eu desci ali, a escada, tinha medo da reação dela", admite. Foi nesse momento que Sarah a chamou de campeã olímpica.

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'Ela acreditava quando eu não acreditei'

"A Sarah é uma pessoa muito especial para mim. Desde criança sou muito fã, mais ainda agora.

Preciso ser honesta: quando eu não acreditava em mim, ela falava: 'Você pode, você merece. Se você pega no kimono, ninguém te segura'. E hoje ela falou isso muito, muito, muito, muito. E eu comecei a me sentir muito grande, muito forte.

Ela é honesta. Quando ela falou que eu era campeã olímpica, eu juro, fiquei em branco. Naquele momento eu acreditei. Foi muito confuso para mim, mas ver ela emocionada foi incrível."

Ficou muito especial assim. Finalmente sentir que eu mereço.

Luis ROBAYO / AFP Luis ROBAYO / AFP

Quem é Larissa Pimenta

Larissa Cincinato Pimenta, 25 anos, leva no sobrenome — que também já foi apelido — um tempero que marca sua trajetória no esporte. Chamada pelos amigos de Pimentinha na infância, a paulista de São Vicente começou no judô porque sua mãe acreditava que a modalidade faria a filha brigar menos com os dois irmãos mais velhos.

Aos poucos, a paulista de São Vicente (SP) entendeu como seu temperamento e sua personalidade ajudariam no esporte. "Desde criança as pessoas brincam sobre isso. Depois de um tempo, eu fui aprendendo a reconhecer o que era ser a Pimenta, a Pimentinha que a galera fala. Sou muito competitiva, gosto de desafios. Todos os atletas gostam, mas só porque meu sobrenome é Pimenta, eles já colocam como apelido".

Larissa foi a Tóquio e perdeu nas oitavas de final para a japonesa Uta Abe, que terminou a competição com a medalha de ouro. Não foi o suficiente para a brasileira. "É muito gratificante estar lá, mas não foi suficiente para mim, quando você tem a sensação de que tem condições reais de trazer uma medalha. Foi o que me motivou neste ciclo de Paris".

Larissa voltou e já avisava antes de estrear em Paris 2024: "Não sou o tipo de atleta que vai [só] para participar." Dito e feito.

Os medalhistas brasileiros

  • Larissa Pimenta (bronze)

    A chave é acreditar: Larissa é bronze no judô depois de muita gente (até uma rival) insistir que ela era capaz.

    Imagem: Wander Roberto/COB
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