A japona vermelha da menina ofuscava os olhos inquietos de Miltinho. Eram dez da manhã, os alunos do colégio estadual Professor Salatiel De Almeida se aglomeravam afoitos pelo centro de Muzambinho, Minas Gerais. Em minutos, o sino badalaria e os pés apressados se direcionariam de volta à escola.
Miltinho fitava a japona vermelha de sua namoradinha, que vinha de família tradicional da pequena cidade. Ela o encarava de volta e os dois andavam até um banco da praça, onde sentavam lado a lado e conversavam. Ainda era namorico de adolescente, mas Miltinho gostava dela e achava que seria a mulher de sua vida.
Um dia, naquele ritual que se repetia, Milton percebeu que a menina tinha o semblante triste. Perguntou o que havia acontecido. Ela, chateada, disse que não poderia mais namorá-lo: "Meu pai mandou acabar com nosso namoro porque você não tem futuro".
Miltinho ficou triste pra burro e achou que não se recuperaria daquele amor negado. Mas os olhos curiosos encontraram outro olhar. Um dia, durante o footing na praça da cidade, em que os garotos andavam em um sentido e as garotas, no outro, ele percebeu que uma mocinha o olhou com carinho.
Milton se sentiu afagado. Apertou o passo para, na próxima volta, reencontrar a moça. Na segunda vez em que a viu, ela o olhou da mesma forma: com carinho. Miltinho não sabia ainda, mas aquela, e não a menina da japona vermelha, era a mulher de sua vida.
Hoje, 56 anos depois, Milton Neves tem certeza: aquela menina do olhar carinhoso se tornou o Pelé das mulheres. Seu nome era Lenice.