Há 61 anos, uma mulher juntou seus poucos pertences, cinco filhos, e subiu em um pau de arara para cruzar pela primeira vez na vida a fronteira do seu mundo: o município de Corrente, no Piauí. O destino era a recém-inaugurada Brasília, mas alguns quilômetros adiante um dos passageiros foi encontrado morto e o caminhão deu meia volta com o finado.
Para aquela mulher que aprendeu a ler sozinha para ser capaz de decifrar a Bíblia, teria sido mais fácil concluir que as pedras no caminho eram um sinal divino. Mas Dona Lídia voltou ao pau de arara e, 12 dias depois, chegou a Brasília, surpreendendo seu marido, meu pai, o primeiro Joaquim Cruz, que havia migrado antes. Aquela aventura ficou no meu DNA. O gene do desbravamento.
Eu ainda era bem pequeno e a família voltou para Corrente. Ali, pela segunda vez, minha mãe determinou o meu destino. Quando meu pai optou por viver sua fase playboy, ela armou uma rede para ele, preparou farofa com carne seca, pegou os seis filhos, subiu no pau de arara e voltou sozinha para Brasília. Ele foi atrás um tempo depois.