Conheci o atletismo ainda moleque, aos nove anos, vendo pessoas como o Jadel Gregório competir. Fiquei encantado. Mas pensar nisso como uma profissão estava meio fora de cogitação. Era só olhar para a minha própria casa. Meu tio também sonhava em ser atleta, mas minha avó nunca deixou. Ele teria que sair de casa, mudar de cidade, ficar longe da família. Não julgo por terem falado "não". A vida dos meus avós é muito diferente da minha hoje e da sua também, provavelmente. Eles eram pescadores e nunca saíram de perto da família.
Comigo seria igual. "Não", e pronto. Mas eu não aceitei. No início, eu não tive o apoio dela e passei a negociar. Ela não queria de jeito nenhum. Eu conversava e ela falava "não", tentava de novo e outro "não"... "Não, não, não". Foram meses tentando.
O meu tio não pôde seguir no atletismo, mas conseguiu se formar em mais de uma faculdade. Como ele não seguiu o sonho no esporte, fez o possível para que eu pudesse viver isso. "Não faça com o menino o que fez comigo", ele disse. E funcionou. Foi assim que, mesmo com dor no coração, minha avó permitiu, chorando muito. Somos muito apegados, eu era a companhia dela em casa.
Aos 14, depois de seis meses de insistência, saí de casa. A cena da minha vó chorando no portão, ao me dar tchau, ficou marcada em mim. Doeu muito ver minha vó chorar, mas eu enfrentei meu medo e arrisquei no meu sonho. Fiz as malas e mudei de Marília (SP) para Bragança Paulista (SP), para treinar atletismo em outra cidade.
Minha avó não tinha muita ideia do que era o esporte ou o que aquilo significava para mim. O "sim" dela foi mais pelo meu tio e pela minha insistência. Ela só foi mesmo entender o salto com vara no dia 15 de agosto de 2016, quando ganhei a medalha na Olimpíada do Rio.
Ela não costumava ir às provas, até pela distância. Uma vez a convidei para assistir ao Sul-Americano juvenil (2009). Essa história é engraçada... Ela sentou na arquibancada junto com a minha tia, bem de frente para onde acontecia o salto com vara. Quem acompanha sabe que são várias competições de atletismo ao mesmo tempo. Então, ela estava de frente, não tinha como não ver.
Acabei a prova, fiz o meu melhor resultado e ganhei medalha de bronze. Fui correndo mostrar para ela.
— Ué, mas já aconteceu a prova?
— Já, poxa. Você não me assistiu?
— Ah, eu estava procurando você aqui embaixo.
Embaixo era a pista de aquecimento, ou seja, ela não prestou atenção!
Quando ela percebeu que foi dando certo, até me cobrava para que eu mantivesse o foco, para não estragar meu futuro. Ela viu que valeu a pena me deixar sair de casa, mesmo só tendo conseguido me assistir de verdade na Olimpíada.