A NBA em uma bolha

Liga de basquete busca refúgio em resort na Disney para tentar terminar temporada em meio à pandemia

Brunno Carvalho Do UOL, em São Paulo Joe Murphy/NBAE via Getty Images

Se "sair da bolha" virou uma expressão normal nas discussões on-line, a pandemia causada pelo novo Coronavírus fez com que a NBA "entrasse em sua bolha" para poder dar sequência a sua temporada.

Fechar um resort dentro do complexo da Disney, em Orlando (EUA), foi a solução encontrada pela principal liga de basquete do mundo para tentar proteger seus atletas e evitar o que está acontecendo com a MLB. A liga de beisebol norte-americano convive com um surto da doença com apenas uma semana de jogos, após 12 atletas e outros integrantes da comissão técnica do Miami Marlins —um time localizado no mesmo estado em que a NBA se sitiou, a Flórida— terem sido diagnosticados com o vírus.

Foi necessário um esquema de guerra para que a ideia da "bolha" pudesse ser viabilizada ao menos para que os jogos recomecem, com oito dos 30 times da NBA excluídos dessa excursão alternativa para a Disney. O planejamento inicial da organização prevê que o campeonato seja decidido até 13 de outubro.

A solução exigiu um grande esforço, não apenas de planejamento, mas financeiramente. O site "The Athletic" estimou que a organização desembolsou por volta de US$ 170 milhões (R$ 875,6 milhões) para inflar essa "bolha". Os custos vão desde a reserva dos hotéis aos milhares de testes de Covid-19 que serão feitos nos quase 100 dias em que a NBA ficará na Disney.

Depois de 22 dias de preparação, a NBA retorna seus jogos oficiais amanhã (30) para encerrar uma temporada que já entrou para a história, mesmo que não seja concluída.

Odeio a ideia da [bolha da NBA]. Tudo o que quero é permanecer saudável e seguro, manter as pessoas ao meu redor seguras. Quero ter certeza de que posso viver por um longo tempo e não ter nenhum tipo de consequência no futuro disso [Covid-19]. Infelizmente, não sou um grande fã da ideia. Mas, novamente, vou fazer o meu trabalho

Joel Embiid, pivô do Philadelphia 76ers

Joe Murphy/NBAE via Getty Images Joe Murphy/NBAE via Getty Images

Três arenas para jogos e espaços de relaxamento na "bolha"

A NBA reservou três dos 18 hotéis existentes no complexo da Disney para seus 22 times: Grand Destino Tower, Grand Floridian e Yatch Club. Os estabelecimento são de padrões diferentes de conforto. Os times de melhor campanha ficaram nos estabelecimentos mais luxuosos.

Os atletas foram colocados em um quarto e estão proibidos de visitar outros dormitórios. A regra é uma das várias pensadas pela organização para evitar contatos considerados desnecessários.

O complexo de 90 hectares conta com três arenas que estarão à disposição da NBA. Esses ginásios acolherão maratonas de até seis jogos por dia e os treinos de todas as equipes dentro da bolha. As equipes ainda terão sete ginásios de diferentes dimensões à disposição para treinamentos.

As partidas contarão com detalhes para indicar a equipe mandante e vídeos de torcedores em enormes telões na lateral da quadra. Público presente? Só se jogadores de outros times tiverem interesse em assistir —em uma fase posterior, seus familiares também serão permitidos.

Em uma resposta aos pedidos de igualdade racial, a frase "Vidas Pretas Importam" estará escrita em todas as quadras da "bolha".

Como uma maneira de relaxar os atletas confinados, a NBA preparou espaços de distração. Os atletas terão acesso a lounges com videogame e TV, mesas de pingue-pingu, além de shows virtuais de DJs.

O complexo ainda conta com espaço para sessões de medição, cabeleireiros e manicures e pedicures, que poderão ser feitas mediante agendamento. Quem preferir alguma atividade em ar aberto pode se contentar com piscinas e também com decks para pescaria.

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Protocolos da bolha

Quais times foram selecionados para dar continuidade à temporada?

São nove da Conferência Leste: Boston Celtics, Brooklyn Nets, Indiana Pacers, Miami Heat, Milwaukee Bucks, Philadelphia 76ers, Orlando Magic, Toronto Raptors e Washington Wizards. Pelo Oeste, 13: Dallas Mavericks, Denver Nuggets, Houston Rockets, Los Angeles Clippers, Los Angeles Lakers, Memphis Grizzlies, New Orleans Pelicans, Oklahoma City Thunder, Phoenix Suns, Portland Trail Blazers, Sacramento Kings, San Antonio Spurs e Utah Jazz.

A bolha exigirá quantos dias em quarentena?

As regras de quarentena serão padrão para todos que entrarem na área reservada pela NBA. Quem adentrar o espaço precisará ficar 48 horas isolado em seu quarto e terá que registrar "negativo" em dois exames para Covid-19. As condições podem ser mudadas dependendo das atividades do novo hóspede.

Caso algum jogador precise deixar a bolha, terá de ficar alguns dias em isolamento quando voltar, novamente dependendo de que lugares e quais pessoas ele visitou no ambiente externo. Além disso, terá que registrar dois exames negativos de Covid-19 antes de ser liberado para voltar aos treinos e jogos.

Os jogadores não poderão sair da bolha?

A recomendação da NBA é para que os atletas evitem deixar o espaço. No entanto, Liga e jogadores acordaram que a saída será liberada em caso de nascimento de um filho, morte de um familiar ou problema de saúde e outros tipos de emergências pessoais. O ala Gordon Hayward, do Boston Celtics, por exemplo, já anunciou à liga que deve deixar o resort nas próximas semanas por conta do nascimento de um filho. Caso tenham que sair, os atletas serão submetidos às regras de quarentena explicadas acima.

Como funcionarão os testes de Covid-19?

De acordo com o protocolo da NBA, todos que estiverem na bolha serão submetidos a testes de Covid-19 todas a cada noite. Os resultados serão divulgados nas manhãs seguintes.

Com base no protocolo, é possível dizer que os times que disputarão as finais poderão ser testados até 99 vezes durante o período em que estarão lá. As equipes começaram a chegar no dia 7 de julho, e o último jogo das finais está previsto para o dia 13 de outubro.

E se algum atleta tiver resultado positivo para Covid-19?

Um atleta diagnosticado com Covid-19 será imediatamente levado para o "alojamento de isolamento". Lá, passará por um novo teste para confirmar o resultado positivo e apenas poderá deixar o local quando consecutivos exames derem negativo.

As equipes estão liberadas para substituir um atleta diagnosticado por outro que não viajou para Orlando. O novo jogador precisará passar pelas regras de isolamento e o substituído não poderá voltar para a bolha.

Quantas pessoas cada equipe levou para a bolha?

O protocolo da NBA permitiu que cada equipe levasse 37 pessoas a campo, contando jogadores, técnicos, membros da comissão técnica, seguranças e outros tipos de funcionários.

O número aumentará nos playoffs, uma vez que os clubes eliminados deverão deixar o local. As equipes que se classificarem para o mata-mata poderão adicionar mais duas pessoas ao seu estafe. Caso cheguem às finais de conferência, mais outros dois membros poderão chegar.

Jogadores poderão receber familiares e convidados?

Nenhum convidado está permitido durante a temporada regular da NBA. No entanto, chegada de familiares e outras pessoas serão liberadas depois da primeira rodada dos playoffs. O atleta que quiser receber convidados ficará responsável por arcar com os custos da reserva de um quarto adicional. Além disso, os visitantes ficarão em isolamento por uma semana e passarão por dois testes de Covid-19 em um período de três dias antes de serem liberados para ficar na bolha.

Furou a bolha e foi a casa noturna

Jesse D. Garrabrant/NBAE via Getty Images Jesse D. Garrabrant/NBAE via Getty Images

As regras rígidas da bolha divulgadas pela NBA não impediram alguns casos de desobediência. Como já dito acima, os atletas estão liberados para deixar o complexo em algumas situações específicas. Mas passeios por outros lugares não estão entre as permissões dadas pela Liga.

O caso mais emblemático de "fura-bolha" aconteceu com Lou Williams. O armador dos Los Angeles Clippers foi autorizado a sair do local para participar de um funeral em Atlanta, sua cidade-natal. O problema foi que o jogador decidiu visitar uma casa noturna de strip-tease no período em que ficou fora.

A "escapada" de Williams foi descoberta após o rapper Jack Harlow postar uma foto com o jogador dentro do local. Mais tarde, o cantor apagou a postagem e disse que se tratava de uma imagem antiga. Na foto, contudo, Lou Williams aparece usando uma máscara da NBA, que foi entregue aos atletas dentro da "bolha" em Orlando.

Fontes ouvidas por diversos sites dos Estados Unidos disseram que Williams teria jantado no local e permanecido por um curto período. Em contato com funcionários da NBA, ele teria confirmado essa versão. O jogador já citou o restaurante do clube como um de seus prediletos em entrevistas antigas.

O caso inesperado gerou um problema para NBA. A liga ficou em dúvida sobre quanto tempo em quarentena seria o ideal para um episódio desse, com tamanha exposição ao vírus. Por fim, Williams foi levado a dez dias de quarentena, uma espécie de castigo, e perderá os dois primeiros jogos oficiais dos Clippers.

Joe Murphy/NBAE via Getty Images

Bruno Caboclo

O brasileiro furou a quarentena de maneira acidental. De acordo com Chris Vernon, jornalista e âncora na rede de podcasts "The Ringer", Cabloco deixou seu quarto para simplesmente pedir mais comida aos funcionários --em vez de usar o telefone. Naquele momento, os atletas estavam cumprindo quarentena, proibidos de deixar seus dormitórios sob qualquer circunstância. O brasileiro foi obrigado a ficar mais alguns dias em isolamento.

Rocky Widner/NBAE via Getty Images

Richaun Holmes

O pivô do Sacramento Kings desrespeitou os limites territoriais da bolha ao sair para simplesmente receber um pedido de entrega --descontente que estava da comida servida no hotel. "Pedi algumas asas de frango e saí para buscar, mas não tinha muita noção das restrições. Eles me obrigaram a cumprir os protocolos, e entendi completamente. Não vou cometer esse erro de novo", disse. Holmes também ficou dez dias isolado.

Vamos ser claros: isso aqui não é a Síria. Não é tão difícil. Estamos vivendo em um puta resort. Todo mundo vai reclamar, todo mundo tem suas preferências, nada muito sério. Só um pouco de comida seca aqui e acolá

Steven Adams, pivô do Oklahoma City Thunders

David Sherman/NBAE via Getty Images David Sherman/NBAE via Getty Images

Anel inteligente e "disque-fujão"

A experiência na bolha conta com dois componentes curiosos na busca por garantir a segurança do complexo. O primeiro deles é simples: um disque-denúncia contra quem planeja escapar do local sem ser visto.

O site "The Athletic" afirmou que a linha já recebeu diversas denúncias nas primeiras semanas de "bolha". Um dos denunciados foi Dwight Howard, pivô do Los Angeles Lakers. Durante uma live, ele disse ter sido dedurado por não usar máscara no complexo [só é permitido ficar sem a proteção durante os jogos].

O outro componente é mais sofisticado. Trata-se de um anel "inteligente", que servirá para medir as frequências cardíacas e respiratórias de quem o estiver usando, além da temperatura. Quando a pessoa estiver em ambiente fechado, o anel disparará um alarme caso fique muito próximo de outra pessoa.

Apesar de disponibilizar os anéis, a NBA não obrigará os jogadores a usar. A decisão partirá de cada um —muitos atletas consideraram o dispositivo invasivo.

RNI/Divulgação

Bolha está sem casos em estado com epidemia descontrolada

A NBA se prepara para voltar em um dos estados que mais tem sofrido com novos casos de Coronavírus. No último mês, a Flórida triplicou seus casos de infectados. Atualmente, 451.423 pessoas já foram diagnosticadas com o vírus na região, com 6.333 mortes.

A situação da Flórida é acompanhada pelos Estados Unidos como um todo. O país segue apresentando uma alta no número de infectados. No último mês, a quantidade de pessoas diagnosticadas com o vírus aumentou em quase dois milhões e está em 4.568.037 casos, com 153.765 mortes. O país está longe de se livrar da pandemia, e por isso diversos epidemiologistas consideram o plano de isolamento da NBA o mais adequado numa tentativa de retomar as atividades esportivas.

Apesar da situação de preocupação no país, a NBA tem conseguido se manter segura na bolha. A última rodada de testes, desta quarta-feira, em 344 pessoas, não apresentou nenhum diagnóstico positivo.

Garrett Ellwood/NBAE via Getty Images Garrett Ellwood/NBAE via Getty Images

Uma nota de corte para entrar na bolha e outra para os playoffs

Por que a NBA voltou com apenas 22 times para sua temporada? Se era para excluir clubes, por que não retornar, então, diretamente com os 16 classificados para os playoffs? A resposta é bastante complexa, mas pode ser resumida basicamente por conta do impacto financeiro desse complemento da temporada regular.

Cada time vai disputar oito partidas em Orlando, antes de a fase decisiva se iniciar. Todas as partidas serão televisionadas, satisfazendo cotas contratuais com as redes que injetam bilhões de dólares na liga. No outro lado da equação, os jogadores podem perder US$ 645 milhões (mais de R$ 3 bilhões!) em salários caso o campeonato não seja concluído.

E por que o Leste voltou com apenas nove times, enquanto o Oeste retorna com 13? É que a NBA estabeleceu uma nota de corte. A liga opera tradicionalmente com uma estatística que se chama "games back", ou jogos atrás. Esse número é definido por uma fórmula não muito simples: você subtrai o saldo de vitórias e derrotas de uma equipe do saldo de outra e, depois, o divide por dois. Pois bem: para ir a Orlando, um clube precisaria estar no máximo seis "jogos atrás" do oitavo colocado —estando, desta forma, ainda com chances de se classificar aos playoffs.

Há quem diga que, no final das contas, o mais importante para o marketing era permitir que o ala-pivô Zion Williamson, calouro sensacional do New Orleans Pelicans, tivesse chance de jogar os mata-matas: suas partidas têm gerado audiência acima da média. Mas todos que vão à quadra têm chances. Afinal, em nova mudança de regualmento, eles não precisam ultrapassar o oitavo colocado Memphis Grizzlies na classificação. Eles só precisam terminar a fase de classificação até quatro "jogos atrás" dos Grizzlies.

Digamos que os emergentes Pelicans estejam posicionados nesta faixa, as duas equipes fariam um primeiro duelo eliminatório antes de os playoffs começarem. O clube de New Orleans precisaria derrotar o de Memphis em duas partidas seguidas. Enquanto aos Grizzlies só bastaria um triunfo para assegurar sua presença nos mata-matas. O mesmo raciocínio vale para o Leste, com o combalido Washington Wizards tentando alcançar Orlando Magic ou Brooklyn Nets.

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Vale ou não vale?

Os jogos disputados pela temporada regular da NBA em Orlando vão definir a ordem de classificação para os playoffs. As estatísticas resultantes dessas partidas serão computadas também nos registros históricos dos atletas que tenham ido à quadra. Mas, ao mesmo tempo, a liga também determinou que, para definição das premiações desta campanha, os jornalistas deveriam encaminhar seus votos antes de o campeonato recomeçar. Isto é: os mais de 100 jogos realizados dentro da "bolha" serão ignorados, valendo apenas os realizados antes da interrupção abrupta da liga em março, depois de o pivô Rudy Gobert, do Utah Jazz, ter sido diagnosticado com a Covid-19 horas antes de um jogo em Oklahoma City.

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Presença mínima brasileira

Dois dos três jogadores brasileiros que iniciaram a temporada da NBA continuam em ação dentro desta bolha criada pela liga. Mas não dá para esperar muitos minutos de exibição para o armador Raulzinho, do Phiadelphia 76ers, e o ala-pivô Bruno Caboclo, do Houston Rockets, durante essa estadia na Disney. O pivô Cristiano Felício já está eliminado com seu Chicago Bulls.

Raulzinho vem lidando com dores nas costas e não jogou muito nos amistosos disputados em Orlando. O problema é que o time vem tentando aclimatar em seu elenco dois reforços de perímetro que chegaram durante a temporada, vindos do Golden State Warriors: os alas Alec Burks e Glenn Robinson III. Eles não concorrem diretamente com o armador —que foi o primeiro reserva na posição durante boa parte da temporda—, mas acrescentam versatilidade a uma equipe já povoada por atletas polivalentes.

Já Caboclo vai se adaptando ao Houston Rockets, depois de ser adquirido pela franquia texana numa troca em fevereiro. O jovem brasileiro jogou pouco nos amistosos dos últimos dias e é visto pela franquia como um projeto de médio prazo.

Do lado da quadra, o ex-pivô Tiago Splitter também está dentro da bolha da NBA como assistente do Brooklyn Nets.

Onde assistir?

Todas as partidas realizadas pela NBA dentro de sua bolha terão transmissão garantida no Brasil, em veículos diferentes: ESPN, SporTV, Band ou o serviço de streaming da liga, pago, mas com exibição também em português. As partidas transmitidas pela ESPN também serão exibidas pelo Watch ESPN, disponível para quem assina o UOL Esporte Clube.

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