Nômades de Bancada

Pai e filho param de pagar aluguel e vão morar em Corsa para conhecer estádios pelo Brasil

Guilherme Eduardo Colaboração para o UOL, em Ibiporã (PR) Theo Marques/UOL

Se alguém te convidasse a abandonar sua casa para morar em um Corsa 2009 e sair pelo país conhecendo estádios de futebol, você toparia? Quando o comerciante Mateus Perondi, de 24 anos, fez a proposta, o aposentado Josimar Perondi, de 51, disse sim.

Pai e filho saíram de Itajaí, em Santa Catarina, no dia 10 de agosto, às 10h13 da manhã, rumo ao que mais tarde eles descreveriam como a aventura de suas vidas. Dois meses depois acordaram mais uma vez dentro do carro, dessa vez em Ponta Grossa, no Paraná. Os bancos tinham sido transformados em camas com a ajuda de cobertores e travesseiros, e toalhas eram usadas para bloquear a luz solar no interior do veículo. O café da manhã: um saco de pão de forma, um pote de doce de leite, um litro de achocolatado e um cacho de banana.

Essa foi a forma que os gremistas Mateus e Josimar encontraram de realizar um sonho antigo: viajar e conhecer estádios, mesmo com um orçamento apertado. Foram quase três meses de estrada, 5 estados percorridos e 73 estádios visitados. Em alguns, como no Bento de Freitas, do Brasil de Pelotas, foram recebidos como visitantes ilustres e fizeram um tour pelas dependências. Em outros, como no Allianz Parque, do Palmeiras, precisaram se contentar com uma vista da fachada porque acharam os ingressos para entrar caros demais (R$ 70).

A jornada foi interrompida pela recente disparada do preço dos combustíveis, o que inviabilizou momentaneamente a viagem. As aventuras da dupla que parou de pagar aluguel para viajar de carro estão sendo relatadas em um perfil no Instagram e um canal do Youtube, onde os "Nômades de Bancada" já conseguiram 8,6 mil inscritos e um total de 367 mil visualizações.

O UOL Esporte conversou com Mateus e Josimar por WhatsApp quando estavam em um posto de combustível, na cidade de Roseira (SP). As fotos foram feitas no estádio Couto Pereira e no Pinheirão, em Curitiba.

Theo Marques/UOL
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Tempestade leva viajantes a abandonar acampamento

A ideia inicial era levar tudo de que precisavam para viver no Corsa e passar as noites acampados em uma barraca ao lado do carro. Mas o tempo instável do Sul logo faria os viajantes mudarem de plano. Já na primeira noite, tiveram que dormir no Corsa devido à forte chuva e ventos que atingiram a cidade de Governador Celso Ramos (SC). "Se a gente não tivesse desarmado a barraca, ia dar coisa feia lá", conta Mateus.

Inicialmente incomodada com o espaço apertado, a dupla foi pegando o jeito e aprendendo formas de deixar o carro mais aconchegante. "Vai botando uma coberta, um travesseiro por baixo ali onde fica a curvinha do banco e já fica mais retinho. E vamos nos ajeitando."

Naturais de Caxias do Sul, Mateus e Josimar até cogitaram sair em viagem com um carro mais espaçoso, mais adequado a empreitadas desse tipo. Desistiram de comprar uma Kombi e resolveram improvisar com o Corsa mesmo. "O melhor motorhome que tu tens, é aquele que tu tens na garagem", costuma dizer Mateus. "A Kombi não é tão fácil assim. É um carro que dá muita manutenção, bem mais que nosso Corsa, e não é tão econômico".

A gente conheceu muita gente, muito lugar, e viu o quão pouco precisa para se viver.

Mateus Perondi

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Gremistas pegaram a estrada depois da morte da mãe

Quando ainda moravam na serra gaúcha, pai e filho precisaram viver o luto da perda da mãe e esposa, que morreu em 2016. Josimar desenvolveu um princípio de depressão e resolveu deixar a cidade onde construiu a vida com a mulher. Tudo lembrava ela. Escolheram fincar raízes em Itajaí, no litoral de Santa Catarina. Aposentado, Josimar passou a dirigir para a Uber e Mateus trabalhava no estoque de uma loja de estética, mas acabou perdendo o emprego por causa da pandemia. Pai e filho abriram um comércio de açaí no bairro e começaram a economizar para pegar a estrada.

A renda mensal era complementada pelo inquilino da casa que deixaram em Caxias (R$ 600), mas também era desfalcada pelo aluguel de cerca de R$ 1.000 do imóvel em que moravam em Itajaí. Por sorte o negócio do açaí floresceu. Quando eles conseguiram juntar o suficiente para iniciar a jornada, carregaram o Corsa e deixaram Itajaí. Gremista desde a histórica Batalha dos Aflitos, em 2005, Mateus também é torcedor de outros times menores, como o Caxias e o Marcílio Dias. Sua ideia era conhecer de perto como os torcedores desses times se relacionam com os estádios.

"Acho massa torcer para vários times. Em cada estado eu tenho meu favorito", diz Mateus.

Seguidores turbinam Instagram e Youtube e fazem doações

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A história de Mateus e Josimar teve ressonância com muitos usuários do YouTube, a julgar pelos comentários deixados na plataforma. "Ah, se eu pudesse ter de novo meu velho pai aqui comigo. Ame muito teu pai, meu amigo! Isso é uma riqueza sem preço!", escreveu o seguidor Gelson José no comentário mais curtido do vídeo "Cansamos de pagar aluguel e fomos viver viajando", o mais assistido do canal (157 mil visualizações). A base de fãs costuma ajudar a dupla com doações via Pix e solidariedade viajante.

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Em São Paulo, eles prolongaram a estadia graças a um seguidor, que ofereceu um espaço pra dormir e tomar banho. A intenção de fazer um canal na internet era guardar as lembranças da viagem. Mas os Nômades de Bancada conseguiram alcançar os requisitos mínimos para monetizar os vídeos, e eles esperam receber em breve seus primeiros pagamentos. "Se der visualização e tiver um retorno financeiro, melhor. A gente tá no lucro", diz Mateus, que investiu em um notebook e uma câmera do tipo GoPro, para dar um aspecto mais profissional aos vídeos.

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Sinal de Wi-Fi emprestado e os perrengues da estrada

Josimar e Mateus trocaram o conforto de uma vida fixa pela liberdade e os perrengues do nomadismo moderno. Na estrada quase tudo é improviso. Um posto de combustível não é apenas o local onde você vai abastecer o carro, mas onde você também pode tomar banho e pernoitar em segurança. A energia elétrica para carregar os celulares e o Wi-Fi para fazer as postagens também precisam ser "emprestados" dos postos, lanchonetes, restaurantes e outros estabelecimentos que se encontram pelo caminho.

A dupla cozinha as refeições na estrada mesmo, com um fogareiro portátil, e a mesa é posta em um dispositivo guardado no carro. Quando a chuva impede uma refeição ao ar livre, o jeito é pagar mais e apelar a uma marmita consumida dentro do veículo. Mateus lembra que a maior dificuldade é lavar roupas, algo que os inexperientes viajantes não haviam calculado. Quando encontraram uma solução (uma lavanderia self-service em Maringá), aproveitaram para informar seus seguidores com o vídeo "Como lavamos as roupas durante a viagem" (7,2 mil visualizações).

"Antes da gente sair, a gente não conhecia nada disso de viagem. É tudo novo para nós, e fomos devagarzinho", afirma Mateus.

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Novos planos: sanduíche na praia e economia para 2022

Depois de subir até o Rio de Janeiro e visitar mais de 70 estádios, a família Perondi voltou a Itajaí no início de novembro. "A gasolina está muito cara, e tem muito pedágio, muitos custos", lamentou o filho.

Os dois já se preparam para aproveitar o verão do litoral e empreender novamente, juntar dinheiro e se preparar para uma nova aventura de carro. A ideia é vender refrigerante e sanduíche na praia antes de pegar a estrada novamente e conhecer novos estádios em outras partes do Brasil, talvez até fora dele. Sobre os constantes elogios que recebem pela relação de pai e filho que mantêm, Mateus admite que, nos perrengues da estrada, algumas discussões acontecem, como em toda família. "Mas a gente sabe que pode contar com outro", diz ele.

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