A hora dos novatos

Nova geração de técnicos toma lugar dos 'medalhões' e domina o começo do Brasileirão

Arthur Sandes Do UOL, em São Paulo Staff Images / CONMEBOL

O Brasileirão que começa hoje (29) dá as caras como o campeonato do futuro. Não exatamente por novas regras, regulamento ou jovens jogadores chamando a atenção em campo; desta vez as revelações estão na área técnica. A nova geração de treinadores está perto de, cedo ou tarde, decretar o fim da uma era.

Alguns destes treinadores já são amados, criticados e campeões como se tivessem 20 anos de profissão, outros estão começando agora e têm no Brasileirão o trabalho mais desafiador da carreira. Todos eles são pouco mais velhos do que o jogador mais experiente de seus elencos. Na média, os 20 técnicos são mais jovens, têm menos tempo de carreira e menos títulos do que os que iniciaram as últimas edições do Brasileirão (veja no gráfico abaixo).

Não é que os técnicos chamados medalhões já acabaram —ainda tem um ou outro representante por aí—, mas os clubes da Série A parecem cada vez mais propensos a adotar os projetos de técnicos novos, notadamente estudiosos, de preferência de formação europeia e com a principal licença de treinadores do mundo (a UEFA Pro). O futebol brasileiro pode estar mudando...

Staff Images / CONMEBOL
Rodrigo Coca/Agência Corinthians

Os estreantes no Brasileiro

Reforçando uma tendência recente, neste ano o futebol brasileiro dá mais espaço aos técnicos no início de suas carreiras. Não à toa, seis 'novatos' disputam o Brasileirão pela primeira vez na área técnica: António Oliveira (Athletico), Crespo (São Paulo), Juan Pablo Vojvoda (Fortaleza), Miguel Ángel Ramírez (Inter), Sylvinho (Corinthians) e Umberto Louzer (Sport).

A missão deles é usar o Brasileirão para se consolidar e assim engrossar a lista da nova geração de treinadores já bem estabelecidos. No melhor dos mundos, tentam seguir os passos de Abel Ferreira e Rogério Ceni, expoentes desta nova safra e atuais campeões da Libertadores e do próprio Brasileiro, respectivamente.

Os citados têm entre 36 e 48 anos e por isso baixam consideravelmente a média de idade dos técnicos da elite, que agora é dominada pelos 'quarentões': dos 20 treinadores, só Guto Ferreira (55) e Cuca (57) têm mais de cinquenta anos.

Este rejuvenescimento se reflete na experiência deles: na média, o tempo de carreira dos atuais técnicos da Série A é 22% menor se comparado ao de 2020 (veja no gráfico mais abaixo).

RAMON BITENCOURT/O TEMPO/ESTADÃO CONTEÚDO

Os "medalhões" que restaram

Cuca é o técnico mais experiente desta primeira rodada: com 12 títulos, ele é também o mais vencedor e tem quase 25% dos títulos dos outros 19 treinadores que começam esta Série A (os demais somam 50).

Apenas quatro técnicos (Barroca, Cuca, Ceni e Diniz) iniciam o terceiro Nacional seguido empregados em um clube da elite. Além disso, esta edição têm apenas dois campeões na área técnica: Cuca (2016) e Rogério Ceni (2020). No ano passado eram sete títulos e três campeões (pois só Luxemburgo tem cinco).

Dos treinadores campeões dos últimos 15 anos, Jorge Jesus, Carille e Tite agora têm empregos internacionais (este na seleção); Muricy, Paulo Autuori e Antônio Lopes têm cargos diretivos; Abel Braga, Andrade, Geninho e Marcelo Oliveira estão sem cargo; e Leão está aposentado.

Alexandre Vidal / Flamengo

Nova geração empilha títulos

Os jovens técnicos chegam chegando. Estão entre eles o atual campeão brasileiro e carioca (Ceni), o da Libertadores e da Copa do Brasil (Abel Ferreira), o paulista e o da Sul-Americana (Crespo), o gaúcho (Tiago Nunes) e o cearense (Vojvoda).

Do outro lado do espectro, Cuca foi campeão mineiro com o Atlético-MG, levantou a 12ª taça importante de sua carreira e passou a ser o técnico mais vezes campeão entre os 20 do Brasileirão.

No entanto, nem todo treinador do Brasileirão está na turma da nova geração ou dos medalhões. Guto Ferreira (Ceará) e Roger Machado (Fluminense), por exemplo, já têm suas carreiras consolidadas mas não têm décadas e décadas de profissão ou passagem por clubes grandes a cada temporada.

Leonardo Moreira / Fortaleza

Clubes fogem do 'mais do mesmo'

Pode não ser um movimento intencional, afinal Renato Gaúcho, por exemplo, só está desempregado porque quer, mas a tendência nos clubes de elite tem sido apostar em técnicos que estejam mais próximos do início do que do final de suas carreiras.

Neste cenário, os nomes 'batidos' do mercado brasileiro de técnicos parecem perder espaço. Quem ganha prestígio é o treinador de perfil estudioso, seja aquele que teve formação europeia (como Abel Ferreira, Sylvinho e Tiago Nunes), seja o que se destacou com ideias diferentes no futebol sul-americano (Vojvoda) ou até os que cumprem os dois quesitos (Crespo e M. A. Ramírez).

Muitos fatores podem ajudar a explicar esta tendência, desde a própria ação do tempo (afinal treinadores também envelhecem) até a desvantagem financeira e esportiva dos times brasileiros se comparados à Europa (técnicos valorizados podem buscar outros mercados, como Sampaoli e Jorge Jesus). Fato é que há uma ruptura com o modelo histórico; um fenômeno que não chega a ser inédito, mas que alcança proporção singular neste começo de Brasileirão.

É um processo natural de os clubes buscarem capacitação. Os treinadores jovens têm estudado mais, buscam novas ferramentas para agregar ao trabalho, e isso aos poucos vai aparecendo tanto no desempenho em campo quanto nos resultados. É claro que há exceções e que não quer dizer que um treinador vai ser melhor só porque é mais novo, mas no geral os técnicos jovens têm tido um entendimento melhor do futebol de hoje.

Rodrigo Coutinho, blogueiro do UOL Esporte

Começa hoje!

O Cuiabá de Alberto Valentim disputa o primeiro jogo de Brasileirão de sua história contra o Juventude de Marquinhos Santos, às 19 horas (de Brasília) de hoje (29), na abertura do campeonato. A noite de primeira rodada ainda tem Bahia x Santos e São Paulo x Fluminense.

Se por um lado a nova geração inicia o torneio com espaço e em alta, por outro não custa lembrar que o Brasileirão é, historicamente, um moedor de treinadores. Resta saber se os novatos vão se segurar durante os altos e baixos da temporada ou se os clubes vão voltar a invocar os 'medalhões' de sempre.

Alexandre Schneider/Getty Images
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