Bate-papo com João Palomino, jornalista com 40 anos de carreira, sendo 25 na ESPN Brasil. Fundador da empresa de streaming Live Sports.
UOL Esporte: O que leva um profissional da mídia tradicional a abrir uma empresa que dialoga com inovação?
João Palomino: Na época em que eu estava na ESPN, e mesmo em outras empresas, sempre houve barreiras para essa discussão de como seria o modelo de distribuição com a chegada forte do streaming, das TVs conectadas, da possibilidade de o consumidor escolher a hora e o produto que quer assistir. As operadoras com as quais as empresas têm contrato não permitiam essa discussão porque a mudança de modelo de negócio era um risco. Mas sempre foi um tema. Até que em setembro fui procurado pelo Nilson Fujisawa, um cara de tecnologia, que tinha uma inquietação parecida e decidimos partir para o mundo do streaming com algo mais parrudo.
E o que dá para fazer de novo ou diferente?
Eu venho do jornalismo, então acredito muito em produção, em histórias bem contadas que vão provocar o engajamento com o consumidor. Os torcedores precisam de uma experimentação favorável, precisam se sentir pertencendo a algo. Um exemplo fora do futebol é o ciclismo. Tem uma gama de pessoas que se interessam pelas voltas, pelos equipamentos, pelos circuitos. Mas não há uma canalização do conteúdo do ponto de vista de produtos e nem algo que chame atenção de pessoas que praticam o ciclismo. Pertencimento é uma palavra feia, mas diz muito. Dar informações sobre equipamentos, equipes e atletas em segunda, terceira tela, é uma forma de cativar. Isso não é geracional, isso é hábito. Quando estou vendo um jogo e tem um lance polêmico em que a transmissão não chegou a qualquer conclusão, eu abro o celular para ver o que as pessoas estão falando, é imediato. Como transformar isso em um ecossistema bacana, em que você possa ter não o controle, mas coparticipação? É o desafio atual.
Você falou anteriormente sobre ciclismo. Acha que existe uma realidade de segmentação, de as pessoas pagarem para consumir especificamente aquilo que interessa e descartarem pacotes mais generalistas de conteúdo?
Não tenho dúvida. Existe uma demanda reprimida, uma carência, uma necessidade de as pessoas se informarem mais sobre o que acontece na região delas, na cidade delas, no clube delas, no esporte delas. Elas querem mais informação disponibilizada a partir dos gostos delas. A base de dados hoje é tudo. TV aberta nem se fala, mas a TV fechada também limitou a presença de outros esportes que não o futebol pós-Olimpíada, não houve legado. O torcedor fanático vai atrás disso.
E a partir da segmentação, o foco será a experiência?
Essa palavra "experiência" é muito poderosa. Tem uma frase que gosto demais e usei narrando um jogo da NBA uma vez, falando de tudo que acontecia paralelamente: "O jogo é um mero detalhe". Falei no aspecto de organização, preparação, cultivo de novos fãs. A experiência anterior do cara na arena é muito importante, como ele chega, como é recebido, o banheiro, o preço das coisas, o que come, o que bebe, o lugar que senta, como encontrar o lugar, se chega rápido em casa, se não chega rápido, quais são os atrativos para aumentar a permanência dele no local, como é o app que traz informações adicionais. Tudo isso faz com que a experiência seja bacana e o cara queira voltar. Mas se ele chega no estádio e toma bordoada da policia, não tem onde fazer xixi, a comida é azeda ou cara, o lugar para sentar não está lá, estão todos de pé e você sentado, na hora de ir embora não tem transporte e chega tarde em casa... tem que ser muito fanático para voltar. On-line é igual.