PA já ganhou na loteria

O velocista Paulo André Camilo até pode não vencer o BBB, mas ele já tem muito a comemorar

Beatriz Cesarini e Demétrio Vecchioli Do UOL, em São Paulo João Cotta/Globo

Quem nunca deitou a cabeça no travesseiro e se pegou pensando na resposta à pergunta do milhão: "O que eu faria se ganhasse na Mega Sena?" Paulo André Camilo está entre os brasileiros que ganharam na loteria. Não que a conta bancária dele já esteja repleta de dígitos, mas, ao ser um dos 22 escolhidos para participar do BBB 22, o velocista chegou aos 4 milhões de seguidores no Instagram antes de 35 dias de programa.

Na era das redes sociais, influenciadores e #publis, seguidor é patrimônio. Tratado com cuidado, rende mais que poupança e outras aplicações. Em pouco mais de um mês de programa, o semifinalista olímpico dos 100m rasos acumulou mais do que quase todos de seu esporte, de hoje ou do passado.

Atual campeão olímpico da prova de Paulo André, o italiano Marcell Jacobs tem 760 mil seguidores no Instagram. Eliud Kipchoge, recordista mundial da maratona e talvez o maior atleta em atividade hoje no planeta, tem 1,7 milhão. O britânico Mo Farah, destaque das Olimpíadas de 2012 e 2016, acumula 1,1 milhão. Quem mais se aproxima é a norte-americana ShaCarri Richardson, que não competiu nos Jogos de Tóquio após ser flagrada com maconha no antidoping, que tem 2,2 milhões de seguidores.

As exceções são Usain Bolt, com 11 milhões de seguidores, e Caitlyn Jenner, do clã Kardashian, que foi campeã olímpica do decatlo, com 12,5 milhões.

PA jura que, quando acabar essa aventura na casa mais vigiada do país voltará às pistas e ao esporte de alto rendimento. Isso significaria continuar acordando cedo e encarando as dores do treinamento para se tornar o homem mais rápido do Brasil em todos os tempos mesmo sabendo que publicar três Stories em seu Instagram pode pagar no mínimo R$ 35 mil...

O provável é que muita coisa ainda aconteça até Paulo André deixar de ser seguido por câmeras 24h por dia e começar a ganhar dinheiro com isso. Mas, no lugar dele, você resistiria à tentação de nunca mais precisar trabalhar?

João Cotta/Globo
Fabio Rocha/Globo

Corrida pelo milhão é fora da casa

Há algum tempo o BBB deixou de ser uma corrida pelo prêmio principal, hoje em R$ 1,5 milhão. Esse valor é quase irrelevante perto do faturamento que o reality cria para seus participantes. O objetivo é ficar exposto por mais tempo e da melhor forma possível, acumulando capital publicitário e seguidores nas redes sociais. É isso que é transformado em dinheiro nos meses e anos seguintes ao programa.

Paulo André falou sobre isso com o surfista Pedro Scooby — que também está confinado, na semana passada. "Quero viver aqui, dar o máximo, estou amando estar aqui. Mas tenho medo de não conseguir completar minha missão. Colher do que eu plantei aqui". Ele quer ganhar o programa, mas a missão é construir sua imagem no BBB e faturar depois.

Marcos Moraes, diretor da MM Estratégia e Marketing e empresário dos ex-BBB's Arthur Picoli e Bill, explica o potencial de fazer dinheiro: "Em menos de um ano, as pessoas que agencio já fizeram mais do que dois prêmios do BBB aqui fora. É preciso ter foco e saber usar o reality a próprio favor. Se entrar só por entrar não funciona", diz.

Fábio Rocha/Globo

Paulo André diverte fãs e arrasa corações

Em poucos dias, Paulo André foi de um dos melhores velocistas da história do Brasil, com potencial para ser o primeiro brasileiro a correr os 100 metros abaixo dos 10 segundos, para conquistar os telespectadores do BBB. Seu jeito "molecão" e brincalhão deixou de lado a "marra" que gera alguma indisposição na comunidade do atletismo. O atleta fez amizade com os atores Douglas Silva, Tiago Abravanel e Arthur Aguiar e com o surfista Pedro Scooby. O grupo lembra aqueles amigos de escola, que não perdem a oportunidade de zoar e dar risada.

Ele também despertou o coração dos fãs ao viver um affair com a influencer Jade Picon. Desde que se conheceram, na casa localizada em Curicica, no Rio de Janeiro, PA e Jade não esconderam o interesse um no outro, mas demoraram para engatar um relacionamento. Se por um lado o atleta se mostrou todo solto para zoar, quando o assunto é paixão, ele ficou tímido.

A história, então, ganhou ares de romance de novela, com direito a fã clube e torcida pelo tão esperado beijo de #JaDré. Cerca de um mês após o início do reality, o casal finalmente deixou a vergonha de lado e trocou carícias no quarto do líder, longe dos outros colegas de confinamento, mas diante — é claro — das câmeras da casa mais vigiada do país. Os telespectadores foram à loucura e ainda suspiram quando PA e Jade protagonizam cenas de carinho.

No dia 22 de fevereiro, PA passou por uma das maiores emoções desde que começou sua caminhada no BBB. Ele estava no paredão ao lado de Gustavo e Brunna. Os votos da casa o colocaram na berlinda pela primeira vez. Ele pôde respirar tranquilo, porque não ficou nem perto de sair: recebeu apenas 1,58% dos votos do público pela saída.

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reprodução/Globo
O ginasta Petrix Barbosa foi cancelado pelo público por sua participação no BBB20

Não é tão fácil assim ganhar na loteria BBB

Paulo André caiu nas graças do público, mas nem sempre é assim. O BBB também representa um risco grande. Um deslize, por menor que seja, causa um furacão fora da casa e, em minutos, uma pessoa pode passar a ser completamente odiada. É o cancelamento.

O ginasta Petrix Barbosa sentiu na pele o movimento negativo das redes sociais. Ele participou do BBB 20 há dois anos, tentou armar um plano para desestabilizar as mulheres comprometidas e foi acusado de assédio dentro do programa por atitudes que teve com Bianca Andrade e Flayslane. Acabou eliminado na segunda semana do reality show que coroou Thelma como vencedora da edição.

Assim que deixou a casa, Petrix soube que tinha sido "cancelado" pelo público. O atleta não conseguiu reverter a imagem ruim que marcou sua passagem pelo reality e ficou bem longe de conseguir usufruir da popularidade que o BBB pode dar. Perdeu na loteria e deixou escapar a chance de se consolidar na seleção de Portugal, país que agora representa na ginástica.

Ricardo Bufolin/CBG

Acabou um sonho lindo que vivi lá dentro, e um pesadelo que vivi e que a minha família sofreu aqui fora... Que pena que eu não tive mais tempo lá, e mais chances para que todos aqui de fora pudessem me conhecer melhor, de verdade. A mesma pessoa que lá dentro eles enxergaram, me conheceram de verdade. Não sou uma fala, não sou uma narrativa. Sou humano. E nós erramos sim, e peço perdão por todos meus erros, e a todos que eu possa de alguma forma ter magoado".

Petrix Barbosa, após deixar casa do BBB em 2020.

Javier SORIANO / AFP Paulo André nas Olimpíadas de Tóquio, em 2021

Paulo André nas Olimpíadas de Tóquio, em 2021

Reprodução/Instagram
Arthur Picoli, do BBB 21

Arthur, do BBB 21, é base de comparação para Paulo André

O Programa Caixa de Apoio aos Heróis Olímpicos, ligado à Confederação Brasileira de Atletismo e bancado por patrocínio da Caixa Econômica Federal, dá uma espécie de salário aos "heróis olímpicos" aposentados da modalidade, contratados como embaixadores do banco. Pelo contrato mais recente, Sandro Viana, Claudinei Quirino, Rosemar Coelho e outros ganharam R$ 5,5 mil ao mês.

Em um país onde raramente os atletas são registrados em carteira de trabalho, o que os impede de ter aposentadoria, o patrocínio tem grande serventia. Mas esses valores são baixos perto do que Paulo André, que a vida toda treinou para ser como eles, pode ganhar com um post no Instagram.

Só de estar na casa do BBB, o atleta já lucra: ele ganha um salário por mês acordado num contrato com a Globo, um bônus a cada semana que se mantém no reality e mais uma gratificação nos retornos de paredão além dos prêmios em ações de patrocinadores.

"O Arthur (Picoli), por exemplo, tem um engajamento de dois milhões de views em stories e um combo de três stories dele está em torno de R$ 35 a 40 mil. Os valores dele não caem", detalha Moraes.

O educador físico ficou 93 dias no programa e saiu do BBB21 com 3 milhões de seguidores em seu perfil no Instagram. Hoje, Arthur tem 4,8 milhões de fãs na rede social. Paulo André está com 4,3 milhões (e subindo) após 36 dias. E ainda tem a favor dele o fato de ser um atleta de resultados expressivos (o que agrega valor à imagem) e ter potencial para trabalhar como modelo fotográfico.

Reprodução/Instagram

Ao defender sua permanência no programa, Paulo André falou sobre o que ficou do lado de fora da casa. "Deixei, talvez, o auge da minha carreira para estar aqui. Não vou nem apelar pro meu filho de 5 meses porque muitos aqui têm seus filhos também, mas é muito difícil ter deixado ele lá".

O convite para o BBB veio em setembro, depois que PA foi semifinalista nas Olimpíadas de Tóquio nos 100m. Na mesma época, nasceu seu primeiro filho, com Thays Andreata, uma mulher com quem ele não tinha uma relação estável. Batizado de Paulo André, o bebê virou um incentivo para o pai aceitar entrar em confinamento. "A vida de atleta não é fácil no Brasil e vimos o BBB como uma forma de proporcionar uma vida melhor para nosso filho. Paulo André não mede esforços para ser um paizão", disse ela, em um post no Instagram.

Carlos Camilo, pai e treinador de Paulo André, foi contra a aventura, mas acabou prevalecendo o conselho do agente Basilio Morais, também ex-corredor. Pesou na decisão um aspecto que todo atleta conhece da vida em alto rendimento: qualquer lesão pode custar dois ou três meses de treino. Entrar no BBB o tiraria das pistas por até três meses. Se uma lesão poderia ter o mesmo impacto em preparação, porque não embarcar em uma aventura que poderia ser tão rentável?

Com o apoio ao atletismo em declínio no país, Paulo André poderia em breve, também, se ver sem recursos para sustentar a si mesmo, ao seu pai e treinador, e agora a uma criança. Quem vive no meio do atletismo conhece inúmeros exemplos disso.

Antes do BBB, Paulo André ganhava um bom salário mensal — nada astronômico, mas que permitia mantê-lo em atividade com mais conforto do que a maioria de seus colegas de atletismo. Ele recebia R$ 1.850 do Bolsa Atleta (em 2022 o valor aumenta para R$ 3.100 por causa das Olimpíadas de Tóquio), R$ 4.700 do programa de esporte de alto rendimento da Marinha, R$ 2.000 de bolsa do governo capixaba, um salário que não chegava aos cinco dígitos no Clube Pinheiros (em contrato que não foi renovado na virada do ano), R$ 1.650 mil, por seis meses, de um patrocínio da Caixa, e um valor não revelado de um contrato ainda vigente com a Nike.

Como a maior parte desses benefícios tem a ver com desempenho esportivo, não com imagem, ele não perderia muito dinheiro, mesmo se viesse a ser cancelado.

Wilson Melo/Folhapress
Robson Caetano nas Olimpíadas de Seul, em 1988, em que foi medalhista de bronze nos 200m

"Paulo André representa o atletismo brasileiro de forma positiva"

Medalhista olímpico e até hoje o homem mais rápido do Brasil, Robson Caetano apoia a participação de Paulo André no BBB. O ex-velocista, que participou da sétima edição de "A Fazenda", da TV Record, acredita que a projeção que o reality proporciona ao atleta é benéfica ao esporte. E avalia que o fato de PA estar sem treinar não é ruim.

"Falamos de uma geração diferente hoje, em que as mídias sociais fazem parte da vida de qualquer cidadão, qualquer um. Imagina um Adhemar Ferreira da Silva com essa pujança, tendo todo esse aparato de mídia social, na época dele? Ou mesmo eu ou um João do Pulo, por exemplo", refletiu Robson Caetano em entrevista ao UOL.

Para quem não conhece, Adhemar Ferreira da Silva é bicampeão olímpico do salto triplo. João do Pulo foi recordista mundial da mesma prova (e ganhou duas medalhas de bronze olímpicas). Já Robson é um dos maiores velocistas da América Latina, único brasileiro até hoje a correr os 100m em 10s00 e foi duas vezes medalhista de bronze em Olimpíadas.

Aos 23 anos, Paulo André foi semifinalista em sua primeira Olimpíada (em Tóquio, no ano passado), é campeão mundial de revezamento (em 2019) e tem como recorde pessoal nos 100m o tempo de 10s02 (ele já marcou 9s90 na distância uma vez, em 2019, mas a marca não foi homologada por causa do vento a favor, que ajudou na performance).

Reprodução/Twitter

Nós temos um Paulo André representando de maneira bem positiva não somente o atletismo, mas ele também. Isso é muito importante ressaltar, já que ele está dando uma pausa na carreira. Eu acho que é uma pausa providencial até para ele não se cansar muito, para não se desgastar tanto e não ficar tão extenuado com excesso de treinamento. Acho, só, que foi um pouco cedo demais. Acredito que ele tenha todas as possibilidade de se dar super bem. Espero que ele seja um dos finalistas, torço muito para que isso aconteça. Assim como torço muito para todos os meninos do atletismo brasileiro".

Robson Caetano, ex-velocista brasileiro e medalhista olímpico.

Fabio Rocha/Globo

E o futuro?

Paulo André só deixará de competir se quiser. Assim como Robson Caetano mencionou, a pausa na carreira não é algo necessariamente maléfico. Antes dos Jogos de Tóquio, por exemplo, PA teve uma lesão que não foi tornada pública, mas o deixou semanas sem correr. Mesmo assim foi semifinalista olímpico, melhor resultado do Brasil na prova desde 2004.

Tanto o atleta quanto sua equipe têm total segurança em seu retorno às pistas em alto rendimento após o BBB. Agora, dependerá do próprio Paulo André saber lidar com os inúmeros compromissos e as regalias que envolvem ser um ex-participante querido pelo público.

Provavelmente, dinheiro não será mais um problema. A paixão pelo esporte seria uma das maiores motivações para fazer Paulo André acordar cedo para se dedicar a dias inteiros de treinamentos, preparação e competições pelo mundo inteiro.

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