Ela escolheu o Brasil

Tati Weston-Webb poderia defender os Estados Unidos, mas optou por ganhar a prata de verde e amarelo

Bruno Braz e Guilherme Dorini Do UOL, no Rio de Janeiro e em Londres William Lucas/COB

O coração de Tatiana Weston-Webb bateu mais forte quando ela fechou sua participação nos Jogos Olímpicos de 2024. Não apenas por ter colocado uma medalha de prata inédita no peito, mas por ter escolhido o país que representaria ao fazer isso. Brasileira, sim. Por que ela fez questão de ser.

Nascida em Porto Alegre, mas criada nas ondas do Havaí, Tatiana sempre carregou consigo a essência brasileira. Embora tenha se mudado para o arquipélago ainda bebê, foi o amor pelo país natal que a fez, em 2018, deixar os Estados Unidos para trás e competir pelo Brasil.

Após a decepção de uma eliminação precoce em Tóquio 2020, ela se dedicou ainda mais para trazer uma medalha ao Brasil. E foi em Teahupoo, no Taiti, que a redenção finalmente chegou.

Tatiana dominou uma das ondas mais temidas do planeta, solidificou sua posição como uma das melhores surfistas do mundo e reafirmou seu amor e compromisso com o verde e amarelo —e só não voltou com o ouro por 18 centésimos...

William Lucas/COB
William Lucas / COB

A gente sempre veio para o Brasil para visitar a família da minha mãe e passear por aqui. Comecei a namorar com o Jessé [Mendes] também e descobri o amor que sempre tive pelo Brasil. Foi uma coisa bem natural, porque sempre fui brasileira. Mas fiquei cada vez mais apaixonada pelo Brasil
Tatiana Weston-Webb, ao UOL

Sean M. Haffey/Getty Images Sean M. Haffey/Getty Images

A final olímpica mais disputada da história

Tudo bem que, desde que o surfe virou esporte olímpico, foram apenas quatro finais, duas no masculino e duas no feminino. Mas a decisão feminina no Taiti entre Tati e a norte-americana Caroline Marks, campeã mundial ano passado, foi a mais disputada da história. Tanto que o ouro foi decidido por apenas 18 centésimos, em uma decisão anunciada já quando o cronômetro tinha terminado.

O mar não estava dos melhores e, desde o início, era claro que as duas finalistas precisariam escolher bem as (poucas) ondas em que apostariam. Caroline foi melhor no jogo desde o início. Conseguiu um 7,50 logo que as ondulações apareceram e segurou a vantagem até o fnal.

Quando faltavam menos de dois minutos, Tati precisave de 4,68 para a virada e pegou a última onda da bateria. Conseguiu três manobras e, quando o cronômetro zerou, ninguém sabia quem tinha vencido. A brasileira, porém, recebeu um 4,5. Placar final: Caroline Marks 10,50 x 10,33 Tati Weston-Webb.

Antes, o placar mais próximo de uma final olímpica no surfe era da decisão feminina de Tóquio, em que Carissa Morre (EUA) venceu Bianca Buitendag (RSA) por 14,93 contra 8,46.

'Quase deu ouro'

Cometi uns erros na bateria, poderia pegar umas ondas maiores ou melhores. Comecei indo para o tubo e vi que eram só manobras. São coisas pequenas que realmente fazem a diferença e dessa vez não deu para mim. Mas a prata é um sucesso gigante, estou muito orgulhosa. Quase deu ouro, deu prata, mas é isso aí, estou muito feliz

Tatiana Weston-Webb

Muito obrigada a todo mundo que ficou acordado, realmente foi uma experiência incrível. Queria só deixar um recadinho para todo mundo aí: amor é tudo, então, espalhe amor, galera!

Tatiana Weston-Webb

Ben Thouard / POOL / AFP Ben Thouard / POOL / AFP

Derrota e revanche sobre nº 1

A trajetória de Tatiana Weston-Webb, no Taiti, iniciou com uma derrota para a nº 1 do ranking mundial, a norte-americana Caitlin Simmers. Na primeira rodada, ficou em segundo lugar na bateria que contava também com a australiana Molly Picklum, o que a fez cair para a repescagem.

Na segunda chance de avançar, passou com tranquilidade sobre a nicaraguense Candelaria Resano, o que a fez se classificar para as oitavas de final.

A revanche diante da nº 1 do mundo aconteceu de maneira apoteótica. Tati atropelou Caitlin Simmers, que não se encontrou no mar e sofreu uma "goleada" da brasileira de 12,34 a 1,93.

Nas quartas, Weston-Webb se deparou com uma maré mais baixa, com ondas que não são as que mais gosta. Porém, ela utilizou-se da experiência e, num duelo equilibrado, venceu a espanhola Nadia Erostarbe por 8,10 a 6,34.

A semifinal foi um duelo contra a costa-riquenha Brisa Hennessy, que é treinada pelo brasileiro Leandro Dora, o Grilo, pai do surfista Yago Dora. Focada, Tati escolheu bem as ondas e ainda foi beneficiada por uma interferência de Hennessy, que entrou em sua onda quando a brasileira tinha a prioridade (é a foto aí em cima), algo que gerou uma punição à costa-riquenha e facilitou o caminho para a final olímpica.

Ben Thouard / AFP Ben Thouard / AFP

Tóquio-2020 foi a 1ª Olimpíada do surfe. Veja os medalhistas

  • Italo Ferreira (BRA)

    O brasileiro Italo Ferreira obteve o primeiro ouro olímpico da história do surfe no masculino. O japonês Kanoa Igarashi foi prata e o australiano Owen Wright ficou com o bronze.

    Imagem: Marcelo Maragni
  • Carissa Moore (EUA)

    A norte-americana Carissa Moore levou o ouro em Tóquio na competição feminina. Bianca Buitendag, da África do Sul, ficou com a prata; e Amuro Tsuzuki, do Japão, obteve o bronze.

    Imagem: ISA / Jimenez
Reprodução/Instagram/Brent Bielmann

1º tubo na barriga da mãe

Ao conhecer um pouco sobre a mãe de Tatiana, fica mais fácil entender de onde vem toda a coragem da surfista brasileira. Tanira Guimarães era uma bodyboarder profissional, e conheceu Douglas Weston-Webb em uma viagem ao Havaí, onde ela havia ganhado competições em Pipeline - os dois se apaixonaram em uma sessão de fotos na ilha de Kauai e decidiram ficar juntos.

"Minha mãe é destemida e competitiva, e eu definitivamente herdei essas características dela. Uma vez, ela surfou de bodyboard em Pipeline enquanto estava grávida de seis meses. Coragem está no sangue da nossa família".

Seria o primeiro tubo de Tati Weston-Webb, definitivamente não o último - como pudemos acompanhar nas Olimpíadas, em Teahupoo.

Reprodução / Instagram @tatiwest

De Porto Alegre a Kauai

E a coragem de sua mãe não parou apenas nos tubos enquanto grávida. Ainda segundo Tatiana, ela só nasceu no Brasil porque seus pais gostariam que ela tivesse dupla cidadania - e aí que entra mais um 'feito' de Tanira.

"Na verdade, eu nasci no Brasil porque meus pais queriam que eu tivesse direito a dupla cidadania, embora ela estivesse com a gravidez avançada demais para ser permitida a voar na época. Ela quebrou mais essa regra."

Tati, então, nasceu em Porto Alegre, mas se mudou com apenas dois meses para Kauai, no Havaí. O período no Rio Grande do Sul foi tão curto, que sequer deu tempo de sair 'brasileira'. Oficialmente, ela era apenas cidadã norte-americana.

Ed Sloane/via REUTERS Ed Sloane/via REUTERS
Arquivo pessoal

Um sentimento adormecido

Até 2018, Tatiana participava dos campeonatos representando o Havaí, que possui bandeira própria no surfe profissional - uma coisa natural para alguém que cresceu por lá desde os dois meses de vida.

No entanto, com a entrada do surfe nas Olimpíadas, seguido de um convite sedutor do Comitê Olímpico Brasileiro (COB), ela não pensou duas vezes, matou dois coelhos numa cajadada só: uma grande oportunidade para sua carreira, além da chance de retomar um elo de conexão com seu país natal que estava adormecido.

A gente sempre veio para o Brasil para visitar a família da minha mãe e passear por aqui. Comecei a namorar com o Jessé [Mendes] também e descobri o amor que sempre tive pelo Brasil. Foi uma coisa bem natural, porque sempre fui brasileira. Mas fiquei cada vez mais apaixonada pelo Brasil
Tatiana Weston-Webb, ao UOL

Bruno Zanin

Tati inglesa?

O que poucos sabem, é que Tati poderia ter competido por um outro país. Além de Brasil e Estados Unidos, se quisesse, ela poderia ter sido uma atleta do Reino Unido.

Isso porque, seu pai nasceu na Inglaterra, mas, assim como sua filha, acabou não herdando automaticamente a cidadania inglesa, e também nunca foi atrás do documento.

Mas fiquem tranquilos, isso nunca passou pela cabeça de Tati, que sempre se mostrou segura de sua decisão.

Quando eu decidi virar brasileira de verdade, minha vida mudou. Eu estou representando mais do que um país, estou representando pessoas que sonham e lutam para correr atrás dos seus sonhos
Tatiana Weston-Webb, ao UOL

REUTERS/Carlos Barria REUTERS/Carlos Barria

Aprendeu português, desaprendeu e voltou a aprender

Quando pequena, Tatiana aprendeu português com a mãe, mas acabou esquecendo. Ela e o irmão mais velho, Troy, ficavam com o pai, enquanto Tanira trabalhava. No entanto, a comunicação em português complicava as coisas.

"Nós falávamos em português com ele, mas ele não entendia. Por exemplo, pedíamos: 'Pai, quero ir para a praia'. E ele entendia que queríamos 'papaya' (mamão em inglês). Isso não funcionava. Então, ele pediu para minha mãe falar inglês com a gente. Assim, começamos a falar mais inglês e, crescendo nos Estados Unidos, focamos no inglês."

Em 2018, quando decidiu representar o Brasil, Tati estudou muito para dominar a língua. A relação com Jessé, que se tornaria seu marido alguns anos depois, também foi fundamental. Hoje, Tati é fluente, fala um português perfeito.

Oitavas em Tóquio e ouro no Pan

  • Oitavas em Tóquio-2020

    Na primeira Olimpíadas da história do surfe, em Tóquio, Tatiana Weston-Webb foi eliminada nas oitavas de final para a japonesa Amuro Tsuzuki, que posteriormente conquistou o bronze.

    Imagem: LISI NIESNER/REUTERS
  • Ouro no Pan de 2023

    Em 2023, Tati Weston-Webb conquistou o ouro no Pan de Santiago, no Chile. Na final, ela venceu a canadense Sanoa Dempfle-Olin. A costa-riquenha Leilani McGlonagle foi bronze.

    Imagem: William Lucas/COB
William Lucas/COB

De olho no título mundial

Após a medalha de prata, Tatiana já volta suas atenção para outro sonho: ser a primeira brasileira campeã mundial. A surfista já foi vice-campeã do mundo em 2021 - igualando o feito de Silvana Lima.

Hoje, ela ocupa a sétima posição do ranking, sendo que apenas as cinco melhores avançam ao WSL Finals, a grande decisão da temporada. Ainda há uma etapa no calendário em jogo, e é justamente onde Tati apareceu para o cenário internacional pela primeira vez: Cloudbreak, Fiji.

Em 2014, Tatiana Weston-Webb mostrou ao mundo sua abordagem destemida para ondas pesadas - a herança de sua mãe. Na época, ela entrou na competição como substituta por lesão, participando de um evento que acabava de retornar ao calendário feminino.

Tatiana, então relativamente desconhecida, se destacou ao enfrentar seções ocas e faces íngremes sem mostrar medo. Apesar de ter sido eliminada por Carissa Moore, ela terminou em um respeitável nono lugar, marcando o início de sua trajetória na elite do surfe.

Os medalhistas brasileiros

  • Larissa Pimenta (bronze)

    A chave é acreditar: Larissa é bronze no judô depois de muita gente (até uma rival) insistir que ela era capaz.

    Imagem: Wander Roberto/COB
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  • Willian Lima (prata)

    Dom e a medalha de prata: Willian sonhava em ganhar a medalha olímpica, e com seu filho na arquibancada. Ele conseguiu.

    Imagem: Wander Roberto/COB
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  • Rayssa Leal (bronze)

    Tchau, Fadinha. Oi, Rayssa: Três anos depois da prata em Tóquio, brasileira volta ao pódio em Paris e consolida rito de passagem.

    Imagem: Kirill KUDRYAVTSEV / AFP
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  • Equipe de ginástica (bronze)

    Sangue, suor e olho roxo: Pela primeira vez na história, o Brasil ganha medalha por equipes na ginástica artística. E foi difícil...

    Imagem: Ricardo Bufolin/CBG
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  • Caio Bonfim (prata)

    Buzina para o medalhista: Caio conquista prata inédita na marcha atlética, construída com legado familiar e impulso de motoristas.

    Imagem: Alexandre Loureiro/COB
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  • Rebeca Andrade (prata)

    'Paro no auge': Rebeca leva 2ª prata, entra no Olimpo ao lado de Biles, Comaneci e Latynina, e se aposenta do individual geral.

    Imagem: Rodolfo Buhrer/Rodolfo Buhrer/AGIF
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  • Beatriz Souza (ouro)

    Netflix e Ouro: Bia conquista primeiro ouro do Brasil em Paris após destruir favoritas e ver TV.

    Imagem: Alexandre Loureiro/COB
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  • Rebeca Andrade (prata)

    Ninguém acima dela: Rebeca ganha sua quinta medalha olímpica, a prata no solo, e já é recordista em pódios pelo Brasil.

    Imagem: Stephen McCarthy/Sportsfile via Getty Images
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  • Equipe de judô (bronze)

    O peso da redenção: Brasil é bronze por equipes no judô graças aos 57kg de Rafaela Silva.

    Imagem: Miriam Jeske/COB
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  • Bia Ferreira (bronze)

    A décima: Bia Ferreira cai para a mesma algoz de Tóquio, mas fica com o bronze e soma a décima medalha para o Brasil.

    Imagem: Richard Pelham/Getty Images
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  • Rebeca Andrade (ouro)

    O mundo aos seus pés: Rebeca Andrade bate Simone Biles no solo, é ouro e se torna maior atleta olímpica brasileira da história.

    Imagem: Elsa/Getty Images
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  • Gabriel Medina (bronze)

    Bronze para um novo Medina: Renovado após problemas pessoais e travado por mar sem onda, Medina se recupera para conquistar pódio olímpico.

    Imagem: Ben Thouard / POOL / AFP
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  • Tatiana Weston-Webb (prata)

    Ela poderia defender os Estados Unidos, mas fez questão de ser brasileira e ganhou a prata de verde e amarelo

    Imagem: William Lucas/COB
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  • Augusto Akio (bronze)

    Com jeito calmo, dedicação e acupuntura, Augusto Akio chegou ao bronze. Mas não se engane: ele é brasileiro

    Imagem: Luiza Moraes/COB
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  • Edival Pontes (bronze)

    Bronze sub-zero: Edival Pontes, o Netinho, conheceu o taekwondo quando ia jogar videogame; hoje, é bronze na 'categoria ninja'

    Imagem: Albert Gea/REUTERS
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  • Isaquias Queiroz (prata)

    Esporte de um homem só - Isaquias Queiroz segue soberano na canoagem e se torna 2º maior medalhista brasileiro da história olímpica.

    Imagem: Alexandre Loureiro/COB
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  • Alison dos Santos (bronze)

    Piu supera tropeços em Paris, mostra que estava, sim, em forma e conquista seu segundo bronze olímpico.

    Imagem: Michael Kappeler/picture alliance via Getty Images
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  • Duda e Ana Patrícia (ouro)

    Dez anos depois do título nos Jogos Olímpicos da Juventude, Duda e Ana Patrícia são coroadas em Paris

    Imagem: CARL DE SOUZA/AFP
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  • Futebol feminino (prata)

    Prata da esperança - Vice-campeã olímpica, seleção feminina descobre como voltar a ganhar e mostra que o futuro pode ser brilhante.

    Imagem: Alexandre Loureiro/COB
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  • Vôlei feminino (bronze)

    Evidências - Programada para o ouro, seleção de vôlei conquista um bronze que ficou pequeno para o que o time fez em Paris.

    Imagem: REUTERS/Annegret Hilse
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