Estaduais (r)emendados

Temporada 2021 começa dias depois do Brasileirão entre indefinições, férias e chance para reservas e garotos

Caio Blois, Eder Traskini e Vanderlei Lima Do UOL, no Rio de Janeiro, em São Paulo e Santos (SP) Alexandre Vidal/Flamengo

Enquanto a temporada de 2020 invadiu o ano de 2021, o futebol brasileiro começa, neste fim de semana, sua nova temporada. E esqueça aquilo que você se acostumou a esperar em outros anos quando o futebol ressurgia no calendário. Não teremos times voltando para fazer pré-temporada, a antecipação da torcida por reforços do mercado da bola e a expectativa pela reestreia do seu time. O Brasileirão terminou na última quinta-feira e ontem, menos de dois dias depois, os principais campeonatos estaduais já estavam começando. Coisa de louco, não?

Com uma temporada embolada na outra (não esqueçamos que para dois times, o Palmeiras e o Grêmio, o ano de 2020 só termina no próximo domingo, com o segundo jogo da final da Copa do Brasil —o primeiro é hoje), a ordem é minimizar o desgaste físico dos atletas. Para isso, a maioria dos times da Série A planejam colocar em campo uma enxurrada de reservas e jovens jogadores. É o caso de Flamengo, Internacional, Atlético-MG, São Paulo, Fluminense, Palmeiras e Grêmio, melhores times do campeonato nacional.

Essas equipes também terão de se adequar aos novos regulamentos criados pelas federações, que não gostaram muito dessa decisão. Para evitar que seu produto, o campeonato estadual, perca valor, pressionam pela escalação dos jogadores titulares, ignorando o pouco tempo de folga.

A FPF (Federação Paulista de Futebol), por exemplo, proíbe que os times mantenham em campo mais de sete atletas sub-23 ao mesmo tempo. Já a Ferj (Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro) obriga que a escalação da "equipe considerada principal" a partir da terceira rodada. Quem descumprir a regra poderá perder a cota fixa dos direitos de transmissão, que também terá novidade: a Record volta a televisionar os jogos do estadual do Rio após 23 anos.

Apesar do esforço, os regionais desse ano têm tudo para ficar marcados pelos "remendos" nos principais elencos.

Alexandre Vidal/Flamengo

Consequências físicas

Conceder férias curtas aos jogadores que atuaram na maioria dos jogos da temporada 2020/21 tem sido a saída da maioria dos clubes para minimizar o risco de lesões.

"Tem clubes pegando os jogadores que mais atuaram: 'quem jogou 75% das partidas vai precisar destreinar, descansar'. Estou falando também da parte mental e da parte comportamental que [o excesso de jogos] vai causando nas pessoas. Esses que jogaram mais deveriam ter pelo menos uma semana ou dez dias de folga antes de recomeçar o processo", opinou Carlinhos Neves, preparador físico com passagens por diversos clubes da Série A.

Para Rodrigo Zogaib, que foi coordenador do Departamento Médico do Santos por quase 20 anos, o índice de lesões na temporada 2021 deve aumentar bastante.

"É lógico que tem algumas coisas que você pode fazer para minimizar isso, customizando, diminuindo alguns tipos de treinos. Você vai correr riscos de não atingir o linear máximo dos atletas num período que normalmente isso acontece, que é no terceiro ou quarto mês depois do começo da temporada, quando está começando o Brasileiro, mas talvez seja uma tática para você evitar que aumente o número de lesões nesta temporada".

Você vai conseguir treinar e diminuir o risco de lesões sem perder todas as valências que os atletas precisam para ter uma boa performance diminuindo a carga e escolhendo os treinamentos adequados, por exemplo, sem muita intensidade, mas treinando mais agilidade, movimentos rotacionais, impulsos".

Rodrigo Zogaib, ex-coordenador de Departamento Médico do Santos

Marcelo Cortes / Flamengo Marcelo Cortes / Flamengo
Lucas Merçon/Fluminense FC

Férias e chance para reservas

O uso de reservas nos estaduais é a forma que muitos times encontraram para driblar o calendário apertado das competições. Além de Flamengo e Athletico, que já costumam usar os torneios regionais como laboratório, alongando a pré-temporada dos principais jogadores do elenco, outras equipes farão o mesmo para ter um pouco mais de tempo de preparação em uma temporada que começa sem férias.

Atlético-MG, Internacional, Fluminense, Palmeiras, Grêmio e São Paulo são alguns dos times que já deram indícios que vão dar preferência aos reservas, a jogadores voltando de lesão e a jovens —sejam aspirantes ou juniores— nesse início de temporada.

O Fluminense, que depende da definição do campeão da Copa do Brasil para saber se joga a pré-Libertadores ou a fase de grupos do torneio, iniciará o Carioca com uma "seleção de Xerém". Os jovens —do sub-17 ao sub-23— ganharão o reforço de Paulo Henrique Ganso, que volta de uma apendicite. O clube das Laranjeiras torce para que o Palmeiras vença o Grêmio e fique com o título do torneio nacional para entrar direto na fase de grupos, permitindo que o elenco principal tenha mais tempo de pré-temporada.

Divulgação

Carioca vira exceção

Preocupada com a possibilidade de esvaziamento da competição por conta do calendário apertado, a Ferj incluiu no regulamento o polêmico artigo que obriga a escalação do elenco principal a partir da terceira rodada do Campeonato Carioca.

A regra não serve apenas para evitar Flamengo e Fluminense, que disputarão a Libertadores, utilizem times alternativos. A ideia é também vedar que os rebaixados Vasco e Botafogo abandonem a competição ou a utilizem como laboratório para a Série B.

Nova detentora dos direitos de transmissão, a Record, que não quer um campeonato esvaziado, aprovou a mudança. A emissora do bispo Edir Macedo se propôs a pagar R$ 11 milhões em 2021 e outros R$ 15 milhões em 2022 apenas pelos direitos de TV aberta, permitindo que os clubes comercializem suas partidas em um esquema de pay-per-view próprio, usando suas TVs. A Globo, que acenou com R$ 45 milhões, mas queria exclusividade de todos os direitos, foi vencida.

Divulgação/São Paulo FC

Paulista tem limitação

Diferentemente do regulamento do Carioca, o do Paulistão não obriga a escalação do time titular, mas limita a inscrição de jogadores da base para impedir que clubes entrem em campo apenas com jogadores do sub-20, por exemplo. O torneio possui duas categorias para a inscrição de atletas: a lista A, com 26 nomes, e a lista B, ilimitada e voltada para jogadores da base.

Para ser inscrito na lista B, o atleta deve possuir ao menos 16 anos e ter nascido até o ano 2000. Apesar de não possuir limite no número de inscrições, o Paulistão só permite que sete jogadores da lista B atuem ao mesmo tempo em campo. A regra não se aplica ao banco de reservas.

Assim, se uma equipe escalar sete atletas da lista B como titulares e quiser substituir um deles durante a partida terá que escolher um jogador da mesma lista para sair.

Tal dispositivo impede que os times escalem um time só de garotos do sub-20, por exemplo, a não ser que gaste vagas da lista principal para inscrever atletas da base. O problema, porém, é que só são permitidas quatro trocas na lista A ao fim da primeira fase.

Joao Vitor Rezende Borba/AGIF
Carlos Eduardo, que foi "emprestado" ao sub-23 do Athletico no último Camponato Paranaense

Escalação de reservas já é regra em alguns times

Jogar o estadual com uma equipe alternativa permeia as discussões futebolísticas há muito tempo, principalmente devido ao calendário apertado no Brasil e ao pouco tempo para a pré-temporada. Alguns clubes já adotaram tal medida nos últimos anos.

O caso recorrente é do Athletico, que há anos disputa a primeira fase do Campeonato Paranaense com a equipe sub-23. A fórmula tem funcionado, e o Furacão levou o título em quatro dos últimos cinco anos.

No ano passado, o Flamengo iniciou o Carioca com o time sub-20 nas primeiras rodadas, depois chegou a utilizar o time reservas em diversas partidas antes de colocar o principal em campo. Terminou o torneio como campeão em cima do Fluminense —outro que começou o estadual com os reservas em campo.

Nesta temporada, a tendência é que a maioria das equipes inicie os estaduais com times alternativos — reservas ou atletas de base. Os titulares de grande parte dos times ganharam um período de férias antes do início oficial da temporada 2021 e ficam fora dos primeiros jogos.

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