Nuzman concentra poder e sofre fritura parecida com a de Ricardo Teixeira

Bruno Droro, Gustavo Franceschini e Ricardo Perrone

Do UOL, em São Paulo

  • Olivier Morin/AFP

    Mesmo reeleito, Carlos Arthur Nuzman vive momento delicado por conta da pressão política

    Mesmo reeleito, Carlos Arthur Nuzman vive momento delicado por conta da pressão política

Carlos Arthur Nuzman está garantido no comando do esporte olímpico brasileiro e da organização dos Jogos de 2016, mas vive o momento político mais delicado da sua carreira. Centralizador, o cartola viu a pressão sobre os seus atos crescer na mesma medida que seu ex-colega de profissão, Ricardo Teixeira, que sofreu processo de fritura parecido antes de cair do comando da CBF (Confederação Brasileira de Futebol) e da organização da Copa de 2014.

O homem mais importante do esporte olímpico brasileiro sustentou durante anos a imagem de bom gestor e gastou seu talento como político, mas hoje tem os holofotes sobre si, especialmente depois da queda do próprio Ricardo Teixeira. Última remanescente com poder da linhagem de cartolas que dominou o setor nos últimos 20 anos, ele convive com a desconfiança dos políticos que o cercam e com a pressão pelos escândalos que o envolvem.

Só nos últimos meses, viu seu prestígio ser abalado pelo mau desempenho brasileiro nos Jogos Olímpicos e pelo escândalo de espionagem que envolveu o Comitê Organizador de 2016. O resultado abaixo da meta estabelecida pelo Ministério do Esporte deu forças a Aldo Rebelo, que saiu de Londres com um discurso firme contra o continuísmo dos cartolas, ameaçando até corte de verbas para aqueles que não seguissem a norma.

Já o incidente internacional criou uma mancha sobre equipe que gere o projeto de 2016 e é praticamente a mesma que, há cinco anos, estourou o orçamento dos Jogos Pan-Americanos de 2007. O caso forçou o Governo Federal a reavaliar sua atuação sobre Nuzman.  O compromisso interno é de uma vigilância maior sobre o dirigente, contando até com eventuais cobranças mais duras pela imprensa. O responsável pela missão será justamente Aldo Rebelo.

Só que a mudança de postura do Governo Federal não é a única novidade para Nuzman. Velhos inimigos políticos de Ricardo Teixeiro, como o senador tucano Álvaro Dias (PR), acenam com a possibilidade de pedir uma investigação do Ministério Público e pode ser acompanhado por Eduardo Suplicy (PT-SP). Na Câmara, quem levanta a voz contra ele é Romário (PSB-RJ), que já anunciou que pedirá uma convocação do presidente do COB para uma audiência pública, estágio clássico de um processo de fritura.

Nuzman já dá sinais de que vem sentindo o baque. Em julho, ainda em Londres, foi flagrado perdendo a paciência com uma funcionária do COB, dizendo "estou cansado de fazer m..." nos microfones. Há poucos dias, na coletiva que convocou para tentar sanar as dúvidas sobre o caso de espionagem, seu abatimento era visível. Processo parecido pelo qual passou Ricardo Teixeira até 12 de março deste ano, quando deixou a CBF depois de 23 anos.

O cartola do futebol sofria forte pressão política e da imprensa, ainda maiores depois que ele decidiu, de maneira inédita na história recente do futebol, se manter no comando da entidade brasileira e também do Comitê Organizador. Exatamente como Nuzman, que fez o mesmo em relação às Olimpíadas de 2016.

"Ele [Nuzman] ganha muito mais visibilidade. É um caso único que dirige os dois. Isso nunca tinha acontecido antes. É a concentração de poder. Por que outros não conseguiram? Talvez porque a estrutura do país deles não permitia. Os assuntos do COB são um e os dos Jogos são outros", disse Katia Rubio, psicóloga do esporte que estuda questões ligadas ao olimpismo.

Rubio não concorda inteiramente com a comparação com Ricardo Teixeira. Ela relembra que o cartola do futebol estava mais envolvido com casos de questões de corrupção internacional. Marco Antônio Teixeira, tio do antigo presidente e ex-secretário-geral da CBF, ainda acrescenta outra diferença. "Acho que o que pressionou foi o dia a dia. A questão toda da família que ele estava vivendo", disse o ex-dirigente, referindo-se aos problemas de saúde que fizeram a mulher de Ricardo Teixeira a convencê-lo a mudar-se para Miami, nos EUA.

Marco Antônio entende que o principal erro de seu sobrinho foi posicionar-se contra Joseph Blatter na eleição da Fifa (na ocasião, ele apoiou o qatari Mohammed Bin Hamman contra o atual presidente). Na condição de presidente do Comitê Organizador da próxima Copa do Mundo e de um dos países mais importantes do futebol mundial, ele se sentiu confortável demais no poder.

"Quando você fica muito tempo no poder você perde o chão. Tem a ver com o período. Você perde um pouquinho a visão e o pé na terra. Se sente muito poderoso", disse Marco Antônio, que enxerga a mesma propensão em Nuzman.

O cartola olímpico, no entanto, ainda não tentou nenhuma manobra política ousada como seu antigo colega. O que pesa contra ele, na verdade, é a exposição que seu estilo centralizador ganhou na mídia de todo o mundo. Nos últimos dias, por exemplo, foi revelada a atitude do COB de tentar invadir à força a sede da CBDG (Confederação Brasileira de Desportos de Gelo), comandada por Eric Maleson, seu único opositor declarado no país.

"Hoje a opinião pública acompanha muito mais o que acontece no COB. Quando você tem o esporte olímpico na pauta do cidadão comum é assim. Certamente nos próximos quatro anos os lares vão ser muito mais invadidos por isso do que foram antes. Obviamente os líderes vão ter de lidar com isso", disse Katia Rubio.

Até parceiros antigos de Nuzman enxergam essa alteração na imagem do cartola. José Cocco, especialista em marketing esportivo, participou ao lado de Nuzman das iniciativas que levaram o vôlei ao posto de segundo esporte do Brasil.

"Naquela época, construímos a imagem para que ele fosse olhado como o bom administrador, já pensando no COB. O problema é que essa imagem foi se desgastando. Ao longo dos anos, ele extrapolou um pouco na absorção de poder e acabou sendo ditatorial além da medida. Ditatorial ele sempre foi, mas dentro dos arroubos de "vamos fazer". Mas isso acabou crescendo em uma medida prejudicial para a imagem dele", disse Cocco. 

Carlos Arthur Nuzman
Carlos Arthur Nuzman

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